A ciclopassarela projetada para transpor o rio Pinheiros e conectar os bairros Pinheiros e Butantã, na zona oeste da cidade de São Paulo, deve, enfim, sair do papel. Foram necessários 28 anos de espera para que a prefeitura publicasse na terça-feira (11), o edital de licitação para contratação da obra.
Orçada em R$ 49,6 milhões, a ciclopassarela é mais que uma conexão cicloviária entre dois bairros, é o elo que falta para conectar de forma rápida e segura as malhas cicloviárias das zonas oeste e sul à malha cicloviária do centro da cidade.
De acordo com especialistas, a obra permitirá uma mudança modal em diversos bairros, possibilitando importante redução nas emissões de CO2, além de também contribuir para o desenvolvimento social e econômico de diversas regiões da cidade.
O projeto, tocado pela SPObras (empresa municipal vinculada à Secretaria de Infraestrutura), foi discutido e teve seu valor ajustado pelo grupo gestor da Operação Urbana Consorciada Faria Lima —programa criado por lei municipal para gerir taxas da ocupação imobiliária e aplicar o dinheiro no desenvolvimento urbano, social e ambiental de parte da zona oeste.
O mesmo grupo gestor, que conta com representantes do poder público e da sociedade civil, também aprovou, em 7 de dezembro de 2021, a renomeação do projeto. De "Ciclopassarela Bernardo Goldfarb" (nome adotado originalmente por ser contíguo ao viaduto Bernardo Goldfarb), o projeto passou a ser chamado de "Ciclopassarela Jornalista Erika Sallum".
A decisão pela troca foi tomada de forma unânime, em votação aberta, cerca de 3 meses após a morte de Sallum, que além de jornalista era também cicloativista e forte defensora das causas de populações periféricas.
Depois de pronta, a obra vai conectar as ciclovias do rio Pinheiros (que liga os bairros Jaguaré, na zona oeste, e Jurubatuba, na zona sul), da avenida Eliseu de Almeida (que liga o Butantã à cidade de Taboão da Serra) e da avenida Rebouças (que liga Pinheiros ao centro e a outras ciclovias que levam a diversas regiões da cidade).
Sob pressão de cicloativistas, a ideia da transposição do rio Pinheiros surgiu em 1994, e, um ano depois tornou-se oficialmente um projeto municipal, com dimensões e objetivos protegidos por lei. Mesmo assim o projeto se arrastou por 9 gestões municipais, tempo que a cidade viu sua população saltar de 9 para 12 milhões de habitantes, e o trânsito ficar cada vez mais estrangulado pelo excesso de automóveis.
Ao publicar o edital, a SPObras deixou de usar o nome de Erika Sallum, e adotou o nome presente nos antigos documentos, "Projeto Ciclopassarela Bernardo Bernardo Goldfarb". A prefeitura prevê de 60 a 90 dias para a conclusão do processo licitatório e mais 12 meses para a entrega da obra, o que possibilitará sua entrega pela atual gestão.
Para a cicloativista e vereadora suplente Renata Falzoni, "os benefícios para a mobilidade, para a conexão e o aquecimento dos negócios da região com a ciclopassarela Jornalista Erika Sallum serão tão grandes que, de fato, essa infraestrutura será um marco para as regiões oeste e sul da cidade".
Contudo, a cicloativista lembrou que a prefeitura ainda tem grande dívida com a cidade. "As obras já licitadas e em andamento estão sendo constantemente adiadas. Não tem zeladoria e o trabalho de recapeamento das ruas vem sistematicamente retirando trechos de ciclovias". Falzoni completou dizendo que "essa ciclopassarela pode ser a única obra positiva para a mobilidade em todo o mandato deste prefeito".
O prefeito Ricardo Nunes (MDB) tem recebido duras críticas de quem usa a bicicleta para trabalho ou lazer, especialmente por estar atrasado no cumprimento do Plano Cicloviário.
Com informações semelhantes às que a Folha já havia noticiado no blog Ciclocosmo, a TV Globo publicou na quinta-feira (13) uma reportagem sobre o abandono da malha cicloviária e os atrasos nas entregas de novas ciclovias pela gestão Ricardo Nunes.
No conteúdo de quase 9 minutos, a TV trouxe críticas da população e destacou que a atual gestão construiu apenas 108,6 Km dos 673 Km de estruturas cicloviárias previstas pelo Plano Cicloviário para seu período de governo.
O geólogo Sasha Hart, membro do coletivo Bike Zona Oeste, defende a implantação da obra desde 2006, quando começou no cicloativismo. "Esse processo evidencia a importância da participação e pressão da sociedade pela busca de melhorias, mesmo que elas venham só para as futuras gerações. Parece que agora vão atender as conexões dos eixos [cicloviários], e isso deve ser continuado para conectar todas as regiões da cidade".
Hart diz lamentar o recuo da prefeitura em usar o novo nome do projeto no edital de licitação. "Ciclistas de toda a cidade, de todos os tipos, se mobilizaram pedindo para que a ciclopassarela fosse nomeada como Jornalista Erika Sallum, que com seu trabalho e personalidade conseguiu construir vários tipos de pontes. Uma ciclista, uma mulher, paulistana, que admiramos muito e que todos devem conhecer e lembrar".
Falzoni também comentou a ausência do nome de Sallum na licitação. "É mais um deslize que esperamos que seja rapidamente corrigido, para que não fique aquela eterna impressão que as demandas legítimas dos ciclistas sempre ficam em segundo plano", disse.
Por nota a prefeitura disse que "conforme foi esclarecido nas reuniões do Grupo Gestor da Operação Urbana Consorciada Faria Lima (GG-OUCFL), a definição de nomes de logradouros na cidade de São Paulo ocorre por meio de aprovação de lei pela Câmara de São Paulo, sempre após a implantação, conclusão e início da operação do logradouro. O GG-OUCFL não tem competência para definir o nome de um logradouro, em especial de um que ainda não executado".
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