Cozinha Bruta

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Descrição de chapéu alimentação

Cigarros para crianças e outros absurdos que estão por aí

Cigarrinhos de chocolate, em outros tempos, eram aceitos como ainda são os brindes infantis das redes de fast food

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São Paulo

Surpreende um total de zero pessoas o fracasso do leilão da fábrica de chocolates Pan. Não houve um lance sequer. Não faz muito sucesso uma marca vinculada indelevelmente ao tabagismo infantil.

A Pan chegou a ter uma linha mais ou menos variada de produtos, como as moedas de chocolate (estímulo à ganância e à usura) e as bolinhas de conhaque (porta de entrada para o cachacismo).

Foram, contudo, os cigarrinhos de chocolate que se colaram à imagem da marca. Os palitos, enrolados em papel branco e bege (a parte do filtro), vinham numa caixinha que simulava uma carteira de cigarros.

Imagem da embalagem vermelha dos Cigarrinhos de Chocolate Pan
Embalagem dos cigarrinhos de chocolate Pan - Chocolate Pan

A embalagem tinha a foto de um menino segurando o cigarrinho entre os dedos indicador e médio, pose clássica de fumante. Dependendo do lote do chocolate, o garoto era preto ou branco.

É curioso que nos anos 1970, quando os cigarrinhos de chocolate ainda estavam à venda, ninguém dava a menor pelota para eles. Vou além: era normal crianças em ambientes saturados de fumaça, e socialmente tolerado que elas dessem um pito eventual nos cigarros dos adultos.

Os cigarrinhos de chocolate eram só mais um chocolate de baixa qualidade com uma embalagem engraçadinha, até um pouco fofa.

A fama dos cigarrinhos –ou infâmia, ao gosto do freguês– viria nos anos 2000. A internet se tornava popular, assim como um surto nostálgico dos trintões de então, que resgatavam a cultura pop de sua própria infância.

Protoblogueiros e orkuteiros levaram para o mundo digital as fotos dos garotinhos de cigarro em punho. Já àquela altura da história, imagens de uma situação absurda e ofensiva.

Fico aqui pensando comigo e com meus botões: tem um monte de coisas que hoje são normais, mas em breve serão absurdas.

Coisas que a gente vê e nem pensa a respeito, por costume e inércia. Que já incomodam, que já tocam o alarme, mas baixinho e não para todo mundo.

Só para ficar no assunto alimentação infantil, há produtos e práticas que claramente deveriam ser extintos.

Não tem o menor cabimento associar personagens infantis a biscoitos recheados, macarrão instantâneo e nuggets congelados de frango.

Não deveria ser admissível pegar bombas de açúcar, sódio e gordura para estampar todo o abecedário das vitaminas na embalagem.

Nesse caso, quem cai na pegadinha são os pais –iludidos com uma compra supostamente saudável–, mas o destino da comida-lixo é o corpo das crianças.

É escandalosamente perversa a estratégia de distribuir brinquedos om os combos –sempre acompanha batata e refri– de lanchonetes de fast food. Mais diabólica ainda quando está vinculada a uma campanha de caridade.

Tenho certeza de que, em alguns anos, vamos nos lembrar dessas coisas com espanto e alguma vergonha. Por ora, aguardo os comentários a me chamar de chato, a dizer que o mundo está cada vez mais chato.

É a vida. Vozes semelhantes devem ter reagido quando proibiram professores da pré-escola de fumar no trabalho.

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