Normalitas

Espanholices, maravilhas do ordinário, brotos de brócolis

Normalitas - Susana Bragatto
Susana Bragatto
Descrição de chapéu LGBTQIA+

Por dentro do primeiro clube de masturbação masculino da Espanha

Inspiração vem dos 'jack off clubs' americanos, em atividade desde os anos 1980

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"Jax"* era um moleque de subúrbio da Filadélfia nos anos 1980 quando começou a pegar o trem para ir à faculdade e descobriu o Mundo Paralelo do banheiro masculino da estação.

"Quase sempre", conta ele em entrevista ao site Hornet, dedicado à comunidade queer, "havia uns homens 'friendly' 'playing' [pô, que difícil traduzir isso] com seus paus. E eu era um pirralho de 16 anos com tesão, então adorei. Foi meio que por causa dessa circunstância que acabei gostando de me masturbar com outros homens".

Logo depois, lembra, veio a AIDS. E, de repente, 'brincar' já não era tão divertido --ou seguro. "Quando eu fundei o clube [em 1993], não havia tratamentos efetivos para a AIDS, e criar um lugar onde homens pudessem se reunir e ser sexuais juntos de maneira totalmente segura era realmente vital".

Hoje, quase 30 anos depois, cada reunião semanal do Philly Jacks reúne algumas dezenas de homens para, fraternalmente, cascar uma juntos. Entre as exigências (e são muitas, como já veremos), só são admitidas pessoas "fully vaccinated" contra a Covid-19. Máscaras, embora não sejam obrigatórias, são recomendadas.

Segundo o site especializado Bator’s Blog (bator, de mastur-bator, sacô), Philly Jacks é um dos 18 clubes de masturbação ou "jack off clubs" em atividade hoje nos Estados Unidos. O pioneiro, New York Jacks, segue em atividade desde 1980. No mundo, são cerca de 30, além de um número desconhecido e provavelmente muy profuso de grupos informais.

***

Enquanto os "yankis" lideram o ranking mundial de tais venues, a Europa acaba de ganhar seu segundo clube --e o primeiro da Espanha --em Madri, uma das cidades mais gay-friendly do universo conhecido.

(o primeiro do continente nasceu em Londres)

Com o franco nome de "Pajas entre colegas" ("punheta entre colegas"), começou como uma reunião itinerante em 2015, e desde final de março deste ano passou a ter endereço fixo num antigo bar no bairro de Alcorcón, na discreta zona sul da cidade, bastante longe do burburinho de famosíssimos redutos LGBT-friendly como Chueca.

Vou pular aqui a parte de que masturbação coletiva é mais véia que vaso ático da Antiga Grécia com cenas homogoxtosas. Etc. A forma moderna e, digamos, institucionalizada dos clubes ainda é considerada ‘nova’ aqui nazoropa. Tanto que, como podem imaginar, a notícia da criação do clube de Madri vem repercutindo localmente y alhures de mil maneiras entre mil gentes e tons de masturbência mental etc. Que así camina la humanidad (cojeando, claro).

Autodenominado "um clube de masturbação tradicional", isto é, "uma comunidade fantasticamente misturada de homens autênticos que se conectam em torno do terreno comum da masturbação social", o Pajas Entre Colegas é uma corporação sem fins lucrativos, "uma organização social 100% voluntária".

A motivação principal é proporcionar "um ambiente único onde qualquer homem possa compartilhar a masturbação com homens com ideias afins", eliminando os "inconvenientes reais" dos eventos grupais sexuais --aka doenças sexualmente transmissíveis, interações indesejáveis ou extra-exposição.

GRAFITE, JAZZ Y LUBRIFICANTE

Ao entrar, a luz é tênue. Há um local para deixar os pertences --e a roupa, já que a ideia é todomundonu (sempre com sapatos e, se quiser, alguma peça mais, como cueca ou uma camiseta).

No local de 100 m2, com espaço para cerca de 70 pessoas, há grafite nas paredes, jazz ambiente soando nas caixas, vídeos de homens se masturbando nonstop, poltronas confortáveis. Várias mesas com lencinhos, lubrificantes e talz everywhere.

Orgia de sátiros representada em vaso de vinho grego de cerca de 500-470 a.C.. - Reprodução

Em geral, os encontros duram de 2 a 3 horas. Não há drugs, nada de álcool (só em gel, pra higiene), nada de poppers, nada de brinquedinhos penetrantes e, por cierto, nada de penetração.

Em cada evento, pulseiras de uso opcional sinalizam o grau de interação permitido: amarelo é 'não me toque'; branco, 'pode gozar ni mim!'; e verde, 'pode tocar, mas pergunte primeiro'. Qualquer avançada indevida pode ser punida com expulsão.

Virar sócio pode ir de 25 euros (R$ 130) por um encontro a 200 (R$ 1.038) por ano pra ganhar acesso VIP como Punheteiro (‘pajillero’) de Honra :). A grana arrecadada serve para garantir a continuidade do clube e financiar os materiais: pulseiras, lubrificantes, toalhinhas higiênicas etc.

'NADA DENTRO DE NADA DE NINGUÉM'

As regras são claras.

Primeiro: sim, só são admitidos homens. Algumas agremiações mais antigas, como a de NY e Los Angeles, chegaram a organizar eventos mistos, sem muito sucesso. "Eles observaram que não havia um interesse sustentável de suficientes mulheres para que se transformasse em um projeto a longo prazo", segundo FAQ do Philly’s.

(pô, Todo Um Outro Tema aqui, mas, enfim)

Como outros clubes, tipo o de Seattle, que realiza pesquisas periódicas entre os sócios, estima-se que a maioria de frequentadores é gay, mas há também em torno de 10% de heteros e uns 20 a 25% de bis ou curiosos. "Não julgamos e acolhemos todos os homens do nosso grupo", diz o texto de apresentação.

O lema "nada dentro de nada de ninguém", extraído dos top mandamentos dos clubes americanos, diferencia os jack offs de outros contextos sociais onde flanders flonders mais, hmm, interativos são permitidos.

O que pode: masturbação solo ou mútua, sempre consentida; toques, "frottage" (corpo a corpo, sem penetração), C2C ("masturbação paralela de pênis a pênis") e contato oral acima da cintura.

Não pode: meter nada-dentro-de-nada, como dito anteriormente, inclusive de si mesmo; contato anal; lábios abaixo da cintura; e tocar outras pessoas sem consentimento.

***

Em entrevista super repercutida ao jornal espanhol El País, o fundador do clube, Nacho G., 43, autodeclarado heterossexual, diz:

"Cada um é livre de pensar o que quiser (...) Muitos homens de nossa idade se lembrarão de quando se masturbavam com seus colegas [na adolescência]. A masturbação em grupo é uma forma de conexão masculina".

"Antes, encontrar pornô era muito difícil, (...) e uma revista ou vídeo era algo tão especial que não se podia deixar de compartilhar com os amigos da escola", lembra. "Agora, [os adolescentes] aprendem sobre sexo só através da internet".

"Para alguns [e, aqui, já prevejo uns leitores tiques miques com tabus feridos ficando com raivinha do texto, de mim e da ideia dos clubes, cheios de ódio pra dar, ô, paaaaja sin leche, que seáis felices, que corra el aire!], a ideia de que os homens se masturbem em grupo pode parecer ‘de homossexuais’ ou um fetiche sexual bizarro", diz.

"A maioria das pessoas vê a masturbação como sexo falido, como [coisa de] 'trolls' solitários. [Mas] Não tem nada a ver com sexo; somos uns caras nos divertindo, e é assim que a minha parceira vê a coisa, como colegas que compartilham momentos de ócio. No fim das contas, todos nos masturbamos, e o mesmo gesto, mas em companhia, é uma forma de conectar com pessoas com ideias afins".

"Você pode desfrutar qualquer ato sexual quando conhece suas próprias referências e limites", finaliza. "Do contrário, terá muitos momentos amargos entre os lençóis". E além deles, e além deles.

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