Que imposto é esse

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Que imposto é esse - Eduardo Cucolo
Eduardo Cucolo
Descrição de chapéu
Nelson Machado, Eurico Marcos Diniz de Santi e Bento Antunes de Andrade Maia

CCiF fala sobre 8 pontos sensíveis ao agronegócio na reforma tributária

Entidade diz que pequenos produtores rurais podem optar por ficar de fora do novo imposto

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Nelson Machado

Diretor do CCiF (Centro de Cidadania Fiscal), ex-ministro da Previdência Social e consultor e professor na Escola de Economia de São Paulo da FGV

Eurico Marcos Diniz de Santi

Diretor do CCiF (Centro de Cidadania Fiscal), professor e coordenador do Núcleo de Estudos Fiscais (NEF) da FGV Direito-SP. Prêmio Jabuti de Melhor Livro de Direito em 2008

Bento Antunes de Andrade Maia

Pesquisador do CCiF (Centro de Cidadania Fiscal). Doutor em economia pela Unicamp e mestre pela UFRJ

O setor do agronegócio, por meio da FPA (Frente Parlamentar do Agronegócio) e da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), elencou oito pontos em que o setor é contrário na proposta de Reforma Tributária. A seguir serão analisados cada um dos pontos mencionados.

Será demonstrado que, em grande medida, o posicionamento reticente do setor com relação à reforma se deve pelo receio que o novo sistema tributário herde os vícios do atual. Para superar essa visão é preciso compreender que se trata de um novo modelo de tributação baseado nas melhores práticas internacionais e adaptados ao sistema federativo brasileiro.

Importante destacar que a reforma tem um impacto positivo estimado sobre a economia em mais de 20% ao longo de 15 anos e que as estimativas de crescimento do valor adicionado do agronegócio com a reforma são de 18,59%.

Milho sai de colheitadeira para carroceria de caminhão no norte do Paraná - Mauro Zafalon-21.jul.2016/Folhapress

Esclarecimento ponto a ponto

1) Abrangência do conceito de contribuinte

O setor alega que não é contribuinte direto dos tributos a serem substituídos.

Esclarecimento
No IBS (imposto sobre bens e serviços previsto na reforma) o contribuinte é o consumidor final. As empresas e os produtores são sujeitos passivos que recolhem o imposto ao longo da cadeia.

No IBS, as pequenas empresas e os pequenos produtores rurais podem optar por entrar no regime normal do imposto de débito e crédito ou por ficar de fora. Caso optem por ficar de fora, suas vendas serão isentas do tributo, portanto, não haverá recolhimento e nem geração de crédito para o adquirente no caso de operações B2B.

Desse modo, o pequeno produtor que vender diretamente ao consumidor final (B2C) tem incentivo para não entrar no modelo do IBS. Já o pequeno produtor que está no meio da cadeia, ou seja, não vende diretamente ao consumidor final, mas a uma média ou grande empresa, possui incentivo para recolher o IBS, pois todo o imposto recolhido na sua venda entrará como crédito para o adquirente, o que significa que na prática a operação seria equivalente a uma alíquota zero.

Como é a experiência internacional?
Os IVAs mais recentes adotam o regime normal de tributação, isto é, tanto os produtores rurais, quanto as empresas de agro processamento e os comerciantes de alimento, ou seja, toda a cadeia produtiva do agronegócio, está sujeita a alíquota vigente do IBS se o seu faturamento for superior ao limite de isenção aos pequenos negócios (threshold). Dessa forma, a apuração do tributo a recolher ao longo da cadeia produtiva é feita pela confrontação entre débitos e créditos do tributo.

É sempre facultado aos pequenos agricultores aderir ao sistema do IBS podendo neste caso aproveitar os créditos de suas aquisições de insumos e repassar crédito para seus compradores (quando contribuintes).

2) Crédito Presumido

O setor quer manter esse tratamento tributário no IBS ao adquirente da produção agrícola.

Esclarecimento
O objetivo do crédito presumido é eliminar a cumulatividade dos tributos na cadeia produtiva, no entanto, faz isso de um modo ineficiente. Com a tecnologia existente hoje que facilita o sistema de débito e crédito é possível eliminar completamente a cumulatividade das cadeias produtivas.

O crédito presumido traz complexidade ao modelo. Esse instrumento é comum nos IVAs antigos, mas não nos modernos. Ele habilita as empresas que agregam valor aos alimentos in natura a ter créditos do IVA das etapas anteriores a uma taxa pré-fixada que é uma média estimada da incidência do imposto ao longo de cada cadeia produtiva. Por isso, deve ser diferenciado por categorias, de acordo com as atividades produtivas (pecuária, agricultura, piscicultura etc.) porque cada segmento utiliza diferentes insumos e em diferentes quantidades.

A fixação do crédito presumido acaba sendo arbitrária além de originar elevado custo de compliance e estimular o litígio, porque as diversas cadeias produtivas passam a ter taxas diferentes de crédito presumido. Segundo Cnossen (2018), o crédito presumido fez sentido no passado, quando não havia um sistema informatizado de tributação, mas, atualmente, corresponde a uma forma arbitrária de compensação.

3) Não incidência tributária sobre insumos agropecuários

O setor defende essa tributação diferenciada para garantir a competitividade internacional.

Esclarecimento
O modelo do IBS garante a não cumulatividade do tributo e sua rápida devolução dos créditos acumulados. Além disso, o imposto segue o princípio de destino, tributando normalmente as importações e desonerando as exportações. Na realidade, a competitividade do agro nacional seria ampliada, pois seriam eliminados toda a cumulatividade tributária ao longo da cadeia, com devolução dos créditos referentes a todos os insumos consumidos, energia elétrica, investimentos em máquinas e equipamentos, serviços de consultoria etc., independentemente de terem sido incorporados diretamente no produto.

Entendemos que o setor possui desconfiança que os créditos acumulados serão devolvidos rapidamente, pois no modelo atual isso não ocorre. É justamente pelas distorções do modelo vigente que precisamos fazer a Reforma Tributária implementando um novo sistema que não possua esses vícios.

No IBS, a arrecadação do tributo será centralizada/compartilhada pelo Conselho Federativo do IBS (CF-IBS) e só destinará os recursos aos entes federativos se a operação for ao consumidor final. Os valores dos créditos das empresas estarão no caixa do CF-IBS prontos para serem devolvidos para as empresas quando requisitados. Ou seja, não entrarão no orçamento de nenhum ente ou concorrerão com outra prioridade alocativa.

4) Oneração da cesta básica

O setor é contra a oneração da cesta básica.

Esclarecimento
A alíquota uniforme engendra várias vantagens ao sistema tributário, uma vez que é a mais simples, com menos litígios, menor custo de compliance e mais transparente ao consumidor. Por isso, a grande maioria dos IVAs modernos (implementados desde a década de 1980) possuem uma única alíquota positiva.

A seletividade dos produtos da cesta básica era, antigamente, a forma possível de compensar as famílias de baixa renda pela regressividade do imposto sobre o consumo. Sua razão de existir seria induzir a diminuição do preço dos alimentos que, em termos relativos, oneram mais as famílias de baixa renda.

Contudo, a diminuição da tributação sobre os alimentos não costuma ser repassada integralmente para os preços ao consumidor, sendo incorporadas como maiores margens de lucro aos distribuidores e revendedores que possuem maior poder de mercado. Além disso, a desoneração da cesta básica traz distorções e complexidade ao sistema tributário.

Adicionalmente, é um benefício muito custoso ao erário público, que deixa de arrecadar uma significativa receita e que precisa compensar elevando a alíquota média do tributo. Por fim, é um benefício mal focalizado, uma vez que as famílias mais ricas consomem mais alimentos (e itens mais caros) em termos absolutos.

A melhor solução, que só se tornou possível graças ao avanço tecnológico, é desonerar as famílias de baixa renda. Nesse sistema, as famílias pertencentes ao Cadastro Único dos benefícios sociais, ou até uma parcela maior da população, receberiam via transferência financeira o retorno do imposto incidente sobre suas aquisições, limitado a um valor para não estimular fraudes. Seria uma espécie de cashback tributário. É importante destacar que como as famílias mais pobres possuem elevada participação de seus gastos em alimentos, uma elevação em sua renda (devido ao cashback) teria um impacto positivo sobre a demanda dos bens da cesta básica.

5) Ressarcimento rápido e eficaz dos créditos

O setor quer garantir com a reforma o ressarcimento rápido e eficiente dos créditos tributários em todas as apurações.

Esclarecimento
Estamos de acordo completamente com esse posicionamento. E o modelo de administração tributária desenvolvido no relatório da PEC 110 tem um desenho institucional que garante essa devolução.

Dois homens de camisa social branca em frente a um painel com frases sobre o CCiF
Eurico Marcos Diniz de Santi (à esquerda) e Nelson Machado, diretores do CCiF (Centro de Cidadania Fiscal) - Divulgação

6) Adequado tratamento ao cooperativismo

Esclarecimento
Como já mencionado, o IBS será um tributo que onera apenas o consumidor final. Seu objetivo é ser neutro, de modo a incentivar a organização do setor produtivo como se fosse organizada na ausência de qualquer tributo.

7) Não incidência do IS (Imposto Seletivo, também criado pela reforma) sobre a cadeia produtiva de alimentos

O setor não quer que o imposto seletivo incida sobre alimentos.

Esclarecimento
O imposto seletivo deve incidir sobre itens que se deseja desestimular, ou seja, com impacto negativo à saúde e ao meio ambiente. Em princípio incidirá sobre o fumo, combustíveis fósseis e bebidas alcoolicas.

8) Adequada tributação dos biocombustíveis

O setor defende que a tributação deve incentivar o uso de biocombustíveis.

Esclarecimento
Os biocombustíveis terão um tratamento normal no IBS, gerando créditos para o adquirente quando devido e onerando o consumidor final. Os combustíveis fósseis terão o mesmo tratamento, no entanto, deve incidir também o imposto seletivo de forma a desestimular o seu consumo, estimulando, de modo indireto, os biocombustíveis.

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