Sons da Perifa

Sons da Perifa - Jairo Malta
Jairo Malta
Descrição de chapéu

Seria o funk criado hoje na zona sul paulistana uma ressurreição do nu metal?

Como o estilo 'bruxaria' tem invadido os bailes com sonoridade sombria, misturando riffs de guitarra e beats distorcidos

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Jairo Malta Mateus Fernandes
São Paulo

Sonoridade sombria e ritmo pesado, elementos da música pop misturados a riffs agudos de guitarra e à estética de filme de terror são descrições que poderiam ser do nu metal, subgênero do heavy metal, ou do funk bruxaria —ou mandelão—, estilo mais ouvido nos bailes da zona sul de São Paulo, especialmente na DZ7 em Paraisópolis e no Baile do Helipa em Heliópolis.

O que também aproxima os dois ritmos, naturalmente distantes em sua essência, é o estilo experimental de produção musical sem amarras com seu estilo original.

Assim como a "bruxaria", o nu metal se destaca por sua ousadia em quebrar as barreiras tradicionais do heavy metal. Surgido nas décadas de 1990 e 2000, o nu metal incorpora influências do rap, do rock alternativo e do funk americano, criando uma fusão sonora única. Letras muitas vezes abordam temas introspectivos e sociais, combinando agressividade com elementos mais melódicos.

DJ Arana em cena do clipe "Capitulo 1 - Purgatório: A Internação do Mago" do álbum "Carreira Solo"
O DJ Arana em cena do clipe 'Capítulo 1 - Purgatório: A Internação do Mago', do álbum 'Carreira Solo' - Reprodução

A estética do filme de terror, presente em ambos os estilos, contribui para um clima sombrio que permeia as performances e a imagem dos artistas. É comum ver figurinos e maquiagens que remetem a personagens de terror, e a iconografia do gênero muitas vezes se faz presente nas capas de álbuns e videoclipes. Bandas como Slipknot, Korn e Limp Bizkit são algumas das que popularizaram esse estilo.

O funk bruxaria surge nos paredões com batidas distorcidas de guitarra e sons distorcidos a um ritmo de 130 BPM, batidas por minuto, ou 140 BPM, deixando o ambiente com uma aura de mistério e ocultismo. A bruxaria carrega uma sonoridade mais eletrônica e foge do tradicional tamborzão —mais comuns em funks cariocas.

Esses ares apocalípticos já estão há um tempo no movimento nos bailes de São Paulo. O MC Kauan, conhecido como Koringa, por exemplo, começou sua trajetória no funk em 2006 forjando seu próprio universo sombrio com palhaços, vilões, fantasmas e criaturas monstruosas –elementos também vistos em alguns grupos de rap.

Vale lembrar que os clipes também representam um ponto de convergência entre os dois ritmos. A estética vista nos clipes de grupos como Korn, System of a Down, Limp Bizkit e Slipknot, com monstros, hospícios e sangue, encontra eco nos clipes dos DJs Arana e K e de Koringa.

Um dos pioneiros desse "movimento bruxaria", Kaique, conhecido nas músicas como DJ K, popularizou a vinheta presente em suas faixas "DJ K não tá mais produzindo, tá fazendo bruxaria". Seu mais recente álbum, "Pânico no Submundo", lançado em julho, conquistou a crítica internacional por utilizar batidas de guitarra com elementos mais distorcidos da música eletrônica.

O álbum recebeu resenhas positivas, inclusive da renomada revista americana Pitchfork, alcançando uma pontuação superior à do álbum "Yellow Submarine" dos Beatles, bem como a de álbuns de bandas Nu Metal como Slipknot e Korn.

Outro exemplo desse paralelo são as músicas do DJ Arana comparadas as do grupo Slipknot. O EP "Carreira Solo", do DJ, lembra músicas como "Pulse of the Maggots", "Spit It Out" e a intro "74261700027" do Slipknot. Suas introduções com sons de um rádio falhando, sirenes e pessoas gritando ao fundo introduzem os ouvintes à atmosfera do horror.

O "bruxaria" captura a energia dos bailes de rua, e suas criações artísticas incorporam influências de gêneros musicais como o metal. Além do som notavelmente distorcido nas batidas, explorado como técnica de produção, os agudos, apelidados de "tuins," retratam o zumbido auditivo resultante da inalação de lança-perfume. Essa combinação de elementos não convencionais está moldando uma nova abordagem na produção de funk.

Se o funk de São Paulo se tornará o novo nu metal, ainda não sabemos, mas quando se trata de música eletrônica experimental nas favelas como expoente de novos ritmos, podemos esperar mudanças significativas no cenário musical. A habilidade de quebrar barreiras e fundir influências diversas é uma característica intrínseca à evolução da música, e o funk bruxaria é um exemplo dessa capacidade.

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