Voltaire de Souza

Crônicas da vida louca

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Tenho meus direitos, majestade

Telenovelas tentam se renovar, mas o passado também mostra firmeza

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Voltaire de Souza

História. Ensinamento. Tradição.

Aproxima-se o aniversário da cidade de São Paulo.

Dona Orvália se orgulhava.

--Nós é que fizemos o Brasil.

Lavoura. Bandeirantes. Jesuítas.

--Quinhentos anos tentando ensinar esse povo.

Ela suspirava.

--Mas é difícil.

Aos oitenta e sete anos, dona Orvália já não saía mais de casa.

--Só para fazer exames. De sangue e de imagem.

A Rede Polidor oferecia confiáveis serviços de diagnóstico.

--E mesmo aqui tem fila.

Na parede, a TV de tela plana oferecia imagens sem som.

--Quem é esse de barba aí? Rapaz bonito.

A acompanhante Rosaura conhecia a novela histórica.

--É o Dom Pedro Segundo.

--Mas ele está vivo?

--Não, dona Orvália.

--Porque se estivesse, as coisas andariam melhor por aqui.

--Verdade, dona Orvália.

A anciã se irritou.

--Verdade? Verdade? O que você conhece de história?

--Hã... bom...

--Você ia estar na sua oca em vez de ficar sentadinha aí nessa sala de espera.

--Mas, dona Orvália.

--Silêncio. Deixa eu ver essa novela.

A perspectiva do roteiro é inovadora.

Cenas humanas. Complexas. Ambíguas.

No seu gabinete, o imperador chora de tristeza.

--Onde já se viu? Isso é uma desmoralização.

A enfermeira Arlete apareceu.

--Precisamos do seu consentimento para dar uma espetadinha... hihi.

A ficha caiu subitamente na mente da quatrocentona.

--Estão querendo é me vacinar. Essa que é a verdade.

Ela deu ordens claras para a acompanhante.

--Vai você, Rosaura. Mostra o braço para a injeção.

O exame de sangue deu resultados saudáveis.

Na TV, Dom Pedro parecia dar um recado em particular.

--Orvália... eu também choro por ti.

--Tenho meus direitos, Majestade.

--Mas uma vacinazinha...

Ela já fez reclamação junto à Rede Polidor.

--Essa novela. É pura fake news.

Novelas tentam se atualizar.

Mas o passado, por vezes, não se abala nem um pouco.

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