Voltaire de Souza

Crônicas da vida louca

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Triste indecisão

Família bolsonarista nem sempre está preparada para surpresas no segundo turno

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Fé. Esperança. Mobilização.

A família Gonzaga de Magalhães estava unida no dia do pleito.

—Bolsonaro para sempre.

A matriarca se chamava Adelina.

—Todo mundo com a bandeira do Brasil?

—Claro, mamãe.

—Então vamos.

—Espera. Cadê o papai?

O dr. Iberê ainda estava no quarto.

—Cadê meu sapato?

—Ué. Não deixou debaixo da cama?

—Ah, é.

—Coitado... ele anda tão nervoso com essa eleição.

A verdade é que o dr. Itiberê não mostrava o mesmo entusiasmo da família.

—Lembra quando ele foi entrevistado numa pesquisa?

O diálogo tinha sido insatisfatório.

—Instituto Prospekta. O senhor sabe em quem vai votar?

—Hã... sei... mas na verdade...

—Qual o nome de sua preferência?

—Olha... melhor esperar um pouquinho para ver...

—Indeciso então?

—Ahn, ahn?

Adelina suspirou.

—Ele nunca foi assim.

O dr. Itiberê saiu do quarto enrolado na bandeira brasileira.

—Pelo Brasil. Pela Pátria. É isso aí.

Adelina deixou o marido no local de votação.

—Te espero aqui em baixo. Que meu voto é no térreo no mesmo.

O dr. Itiberê subiu as escadas com passo firme e marcial.

Adelina aproveitou o tempo livre para suas orações.

—Padre Nosso... que estais no céu...

A tarde avançou serena pelas alamedas dos Jardins.

—Ele está demorando tanto...

Adelina subiu até o terceiro andar.

Uma voz conhecida se ouvia do banheiro masculino.

—Fraude. Fraude, pô.

—Itiberê? O que está acontecendo?

—Eu aperto o botão... e o meu candidato não aparece.

Adelina raciocinou com rapidez.

—Você está apertando a descarga, querido. Não é a cabine de votação.

O idoso saiu do reservado com um olhar perdido.

—Vim votar no Carvalho Pinto... e parece que ninguém me ajuda.

Nasceram lágrimas nos olhos da dedicada esposa.

—Alzheimer. Justo numa hora dessas.

O dr. Itiberê contesta.

—Estou absolutamente lúcido, ora essa.

O médico da família pede exames minuciosos antes de chegar a uma decisão final.

O primeiro voto nunca se esquece.

Já o último, por vezes, é melhor não lembrar.

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