Macacos ficam mais amigáveis depois de passagem de furacão no Caribe

Necessidade de um lugar na sombra levou espécie que vive em ilha a se dar bem

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Rachel Nuwer
The New York Times

O furacão Maria causou devastação generalizada no Caribe, não apenas para as pessoas mas também para a vida selvagem. Cinco anos após a tempestade, alguns dos efeitos ainda persistem.

Cayo Santiago, uma pequena ilha na costa sudeste de Porto Rico, é um exemplo. Quase da noite para o dia, deixou de ser um oásis de selva exuberante para se transformar em um banco de areia desértico com árvores, em sua maioria, esqueléticas.

Isso representou um grande problema para macacos que vivem na ilha. Eles dependem de sombra para se manterem frescos no calor tropical diurno. Porém, ao derrubar as árvores, a tempestade tornou esse recurso muito escasso.

Macacos sobre vegetação destruída
Macacos Rhesus descansando nos restos de uma floresta que foi destruída quando o furacão Maria atingiu a ilha de Cayo Santiago e Porto Rico em setembro de 2017 - Noah Snyder-Mackler/PNAS

Os macacos Rhesus são conhecidos por serem alguns dos primatas mais briguentos do planeta, com estritas hierarquias sociais mantidas por meio de agressão e competição. Portanto, seria de se esperar que uma batalha simiesca estourasse sobre os poucos remanescentes de sombra da ilha.

No entanto, isso não foi o que aconteceu. Em vez disso, fizeram algo aparentemente inexplicável: começaram a se dar bem.

"Isso realmente não era o que esperávamos", disse Camille Testard, ecologista comportamental e neurocientista da Universidade Harvard. "Em vez de se tornarem mais competitivos, os indivíduos ampliaram suas redes sociais e se tornaram menos agressivos."

Um estudo de Testard e seus colegas, publicado no último dia 20 na revista Science, oferece uma explicação para esse desenvolvimento inesperado. Os macacos que aprenderam a compartilhar a sombra após a tempestade, descobriram os pesquisadores, tinham uma melhor chance de sobrevivência do que aqueles que continuaram briguentos.

Cientistas documentaram inúmeros casos de espécies respondendo à pressão ambiental com adaptações fisiológicas ou morfológicas. Mas o novo estudo é um dos primeiros a sugerir que os animais também podem responder com mudanças persistentes em seu comportamento social, disse Testard.

Ela e seus colegas utilizaram cerca de 12 anos de dados coletados na Estação de Campo de Cayo Santiago, o local de pesquisa em primatologia mais antigo do mundo. Pesquisadores introduziram macacos Rhesus na ilha de 15 hectares (em torno de 15 campos de futebol) em 1938 e têm estudado esses animais desde então.

Os aproximadamente mil macacos da ilha ficam livres, mas são alimentados pelos membros da equipe da estação de campo. "O acesso à comida não é o principal ponto de contenda", disse Testard. "A sombra para evitar o estresse térmico é."

As temperaturas diurnas em Cayo Santiago frequentemente ultrapassam os 38ºC, o que pode ser mortal para os macacos presos ao sol.

Após o furacão Maria derrubar a maioria das árvores da ilha, Testard e seus colegas esperavam que os macacos investissem mais na construção de alianças próximas para que pudessem se unir e, assim, garantir um espaço na sombra. Mas o "completo oposto" aconteceu, disse ela. Os macacos investiram em parcerias mais soltas com um número maior de animais e se tornaram mais tolerantes uns com os outros no geral.

Testard disse que suspeitava que isso se devia ao fato de que lutar é uma atividade intensiva em energia que gera mais calor corporal e representa mais perigo para os indivíduos do que "simplesmente não se importar se outro macaco está ao meu lado ou não".

Casas destruídas pelo Furacão Maria na comunidade Caonillas em Utuado, região central de Porto Rico
Casas destruídas pelo furacão Maria na comunidade Caonillas em Utuado, região central de Porto Rico - Lalo de Almeida - 30.nov.17/Folhapress

Durante as horas mais sufocantes da tarde, os pesquisadores observaram macacos aglomerados em faixas finas de sombra. Mas, mesmo quando as temperaturas eram menos sufocantes, os animais se reuniam em grupos maiores em comparação com seus hábitos antes da tempestade, disse Testard.

Nem todos os macacos aderiram ao pacto da paz, contudo aqueles que se mantiveram agressivos tinham mais probabilidade de pagar um preço alto. A taxa de mortalidade geral da população não mudou após o furacão. Mas os macacos com relações mais amigáveis experimentaram uma diminuição de 42% em suas chances de mortalidade porque eram menos propensos a sofrer estresse térmico.

"Quem morre e por qual motivo é o que mudou", disse Testard.

Noa Pinter-Wollman, ecologista comportamental da UCLA, que não esteve envolvida na pesquisa, disse que as descobertas "fascinantes" são "um exemplo maravilhoso de como ser social pode amortecer os efeitos negativos da mudança ambiental."

Julia Fischer, bióloga comportamental do Centro Alemão de Primatologia em Göttingen, que também não esteve envolvida no trabalho, acrescentou que o "estudo extremamente bem-feito" destacou a importância da plasticidade comportamental em ajudar os animais a sobreviver quando seu habitat é perturbado. "À luz das mudanças climáticas, isso é extremamente importante."

Se outros animais também podem responder à perturbação ambiental ajustando suas normas sociais, vai depender muito da espécie e do contexto, na avaliação de Testard.

Provavelmente os humanos se enquadram nessa categoria. As pessoas frequentemente se unem, por exemplo, após desastres naturais ou causados por humanos.

No entanto, Testard acrescentou, há limites. Caso os recursos se tornem escassos, então os humanos poderiam mergulhar em uma distopia violenta semelhante a "Mad Max".

"Há esperança de que nos uniríamos para fazer as coisas funcionarem em vez de lutar", disse ela. "Mas isso é uma grande especulação."

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