"Você pode me chamar de 'Italiano'. Enquanto aquele demônio russo estiver vivo, prefiro que as pessoas não me chamem pelo meu nome."
O ucraniano Vladimir Karpenko, 37, vive há dez anos na cidade de Nápoles, na Itália, onde trabalha como pintor. Certo de que a Rússia invadiria seu país, ele e sua esposa formaram há duas semanas um grupo online para pedir doações de roupas, mantimentos não perecíveis, medicamentos e produtos de higiene que ele pessoalmente levou até a Ucrânia.
Uma vez lá, não pôde e também não quis voltar —o governo ucraniano proibiu que homens entre 18 e 60 anos deixem o país. Todos em idade e condições de combater são necessários neste momento.
Antes de se unir às forças de mobilização popular, unidades formadas por civis e reservistas, Vladimir foi ao hospital central de Lviv, no oeste da Ucrânia, para doar sangue. "Meu sangue ficará com o povo ucraniano, de um jeito ou de outro."
Há o risco de que os invasores russos detonem bombas termobáricas durante o conflito, armamento conhecido como "o pai de todas as bombas".
Essas bombas não usam munição convencional —são preenchidas com explosivos de alta temperatura e pressão, sugando o oxigênio do ar ao redor para gerar uma explosão poderosa e uma imensa onda de pressão que pode destruir os órgãos do corpo.
Sob a possibilidade de uma invasão em larga escala, o prefeito de Kiev, Vitali Klitschko, declarou que a capital está cercada, mas reforça que a população e o Exército ucraniano estão prontos para resistir.
Na linha de frente deste conflito, a população ucraniana se une para combater com armas caseiras, como garrafas cheias de gasolina e farelo de isopor, além de coquetéis molotov.
Antes que se tornem vítimas do Exército, centenas de milhares de civis (mulheres, crianças, idosos, pessoas com deficiências físicas e alguns poucos jovens apavorados demais para se colocarem na linha de frente contra uma poderosa força militar) tentam deixar a Ucrânia em direção a algum dos países vizinhos, principalmente a Polônia.
Uma fila de mais de 50 km se estende da cidade de Lviv à fronteira polonesa. Muitos abandonam os carros ou ônibus em que viajam e começam a caminhar sem saber onde poderão comer, descansar ou buscar abrigo do frio e da neve durante a noite.
Na estação de trem, outras milhares de pessoas se empurram sem saber quando o próximo trem deixando o país chegará. Falta comida e água, e os banheiros estão imundos. Neste momento, Lviv é o cordão umbilical entre a Ucrânia e o resto do mundo.
Até agora, o Exército ucraniano conseguiu impedir que forças russas avancem até esta região. A chegada de misseis doados ao Exército ucraniano por países europeus e pelos Estados Unidos limitam a possibilidade de ataques aéreos, mas as sirenes da cidade soam repetidamente alertas para que a população procure abrigos subterrâneos, frequentemente nos porões de casas e prédios da cidade.
Nas ruas, o que prevalece não é o medo, mas o patriotismo dos ucranianos, expresso na admiração pelo Exército nacional. A relação de confiança entre população e forças militares é espelhada principalmente pelo presidente Volodimir Zelenski, que mantém o papel de defensor da "ucranização" da sociedade, fenômeno que Putin acusa ser o início de um fenômeno ultranacionalista.
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