Angela Alonso

Professora de sociologia da USP e pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento

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Angela Alonso

As senhoras da política

As urnas chancelaram tipos bem distintos de parlamentares femininas

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Uma coisa é certa: ganhe quem ganhar, a Presidência será ocupada por um homem. A terceira via feminina ficou mesmo em terceiro no páreo presidencial.

Simone Tebet desempenhou bem, no domínio dos temas e de si, enfrentando adversários sem desrespeitá-los. A performance deu gosto à parte civilizada do PIB, mas não adentrou suas cozinhas e garagens. Mesmo sem muito voto na bolsa, a senadora, que a CPI da Covid projetou, virou um oásis no deserto centrista. Centro democrático, frise-se, pois nem todo o centro faz juras de amor à democracia —veja-se Rodrigo Garcia.

A senadora e ex-presidenciável Simone Tebet (MDB) durante discurso em que anunciou apoio a Luiz Inácio Lula da Silva (PT) - Bruno Santos - 5.set.22/Folhapress

Tebet também discrepou do apoio acanhado e desgostoso do quarto colocado ao ex-presidente. Escolheu data certeira para seu anúncio, o aniversário da constituição. Fez discurso de estadista, no qual reivindica a igualdade salarial entre os gêneros. Sua firmeza beneficiou Lula, mas também a catapultou a figura nacional —além de cacifá-la para um ministério.

No circuito de governadorias também teve mulheres bombando. Deu Fátima Bezerra no Rio Grande do Norte, e haverá uma governadora em Pernambuco, seja Raquel Lyra ou Marília Arraes. Mas é só. Os demais estados serão governados por senhores, que também reafirmaram seu controle sobre o parlamento.

Embora crescendo de 77 para 91 cadeiras, a representação feminina seguirá indigente: 17,7% da Câmara. Isso apesar da cota partidária para candidatas. Alagoas, Amazonas, Paraíba e Tocantins só elegeram homens.

As poucas chegando em Brasília não chegam unidas. As urnas chancelaram tipos bem distintos de parlamentares femininas. Uma é a das senhoras tradicionalistas, vistosas e orgulhosas nesses anos Bolsonaro, que lançaram uma campanha "Mulheres com Bolsonaro". São as que aceitam e até celebram a liderança masculina.

Elegeu-se Damares Alves, que comeu o pão que o diabo amassou para garantir candidatura, mas atingiu a benção da cadeira senatorial. Carla Zambelli, a que se casou na igreja e na maçonaria, fez o segundo contingente de votos nas urnas paulistas. Ficou na frente até do 03, que repetiu seu apelido doméstico na colocação entre os mais votados.

À estirpe pertencem a reeleita Bia Kicis, a mais votada no Distrito Federal, como a senhora Moro, apesar de suas impropriedades residencial (estrangeira no estado) e moral (o vídeo do pastel).

O PL, partido do presidente, elegeu 17 ladies desse naipe. Mas o PT tampouco pode se gabar de supremacia: cravou exato mesmo número. Contada a coalizão com o PCdoB melhora, mas não muito, e chega a 21 deputadas.

O contingente à esquerda é clivado. Embora todas se digam preocupadas com tudo, há uma diferenciação geracional. Há as que privilegiam a agenda redistributiva, como Luiza Erundina e Benedita da Silva. Já as deputadas mais jovens, sobretudo as do PSOL, sublinham a agenda identitária.

Este campo, de outro lado, produziu um marco histórico. É por seu ineditismo. Erika Hilton, do PSOL paulistano, e Duda Salabert, do PDT mineiro, serão as primeiras mulheres trans na Câmara dos Deputados.

Ambas são muito articuladas, preparadas para o cargo e não se limitarão a questões de gênero. Mas, independentemente de seu foco e desempenho, farão enorme diferença no parlamento. Seu simples comparecimento ao trabalho será toda uma política da presença. O que indica que a malfadada ideologia de gênero não sairá de pauta, pois as reações preconceituosas, inclusive de mulheres, são líquidas, certas e, não custa lembrar, inconstitucionais.

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