Antonia Pellegrino e Manoela Miklos

Antonia é escritora e roteirista. Manoela é assistente especial do Programa para a América Latina da Open Society Foundations. Feministas, editam o blog #AgoraÉQueSãoElas.

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Seguindo a cartilha

Líderes autoritários pelo mundo querem impedir a nossa imaginação

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As Filipinas governadas pelo presidente Rodrigo Duterte. A Turquia sob o jugo do presidente Erdoğan. A Hungria hoje comandada pelo primeiro-ministro Viktor Orbán. A Polônia nas mãos do infame partido Lei e Justiça. A Itália dividida diante do discurso alarmante de Matteo Salvini e seus correligionários. Os Estados Unidos de Donald Trump. A ascensão de uma extrema direita autoritária, nacionalista e ultraconservadora não é privilégio do Brasil.

O que há de comum em cada um desses contextos, consideradas obviamente as devidas especificidades de cada conjuntura? 

Todas essas lideranças chegaram ao poder reivindicando para si a ideia de ordem e segurança. O passado, na narrativa articulada por esses autodesignados próceres, aparece sempre identificado com as ideias de desordem, impunidade, insegurança.

Uma vez empossados, esses líderes adotaram posturas também bastante parecidas. Definem tudo que a mídia reporta que lhes desagrada de fake news. Declaram guerra ao jornalismo investigativo.

Utilizam as redes sociais para se comunicar diretamente com a sua base, dispensando intermediários. Nas redes, causam alvoroço ao anunciar decisões polêmicas para, em seguida, voltar atrás sem prejuízo para suas imagens varonis. A volatilidade de suas declarações não os prejudica, é espantosamente vista com simpatia por seus eleitores, uma vez que é entendida como autenticidade, espontaneidade, franqueza.

Os paralelos infelizes não param por aí. Em todos os casos citados, as novas lideranças ultraconservadoras são avessas à sociedade civil organizada. Movimentos sociais e ativistas são reiteradas vezes pintados de maneira negativa em suas cartilhas. O engajamento cidadão os preocupa. A mobilização os desagrada. A luta por direitos os aborrece. Em todos esses cenários similares, foram tomadas medidas cujo objetivo é controlar ONGs, erodindo a liberdade de associação e afrontando o direito ao protesto pacífico.

Mais uma semelhança: cada um desses líderes articula estratégias que permitam maior controle das cortes supremas de seus Estados. Frequentemente maldizem a última instância do Poder Judiciário de seus países e censuram o que batizam de ideologização, dogmatismo e arrivismo. Flertam com planos de aumentar ou diminuir o quorum desses tribunais, dentre outras várias ameaças de ingerência.

Muitas outras correspondências poderiam ser apontadas, mas uma nos interessa em especial. Todos os líderes mencionados, inclusive o nosso atual presidente da República, manifestam hostilidade diante do movimento de mulheres. Não escondem sua antipatia quando o assunto é feminismo. A manutenção do status quo, do velho normal, do machismo e da cultura do estupro é elemento constitutivo de seus projetos de poder.

Projetos, cabe ressaltar, engendrados tendo como pedra fundamental a noção da refundação da sociedade calcada em valores tradicionais que estariam em risco. Mulheres que lutam por seus direitos têm, para todas essas lideranças, a pecha de histéricas, mal-amadas. O feminismo é designado bravata. O empoderamento é julgado insubordinação. E a insubordinação, para esses próceres paladinos da ordem, é absolutamente inaceitável.

O que jornalismo investigativo, as ONGs, as cortes supremas e as feministas têm de comum, afinal? São, no mínimo, inconvenientes. No máximo, assombram porque podem abrir fissuras no projeto ultraconservador. Podem abrir avenidas para que imaginemos novas ordens alternativas, diferente da que estes senhores advogam. São os espectros que rondam os Bolsonaros do mundo.

Devemos, paradoxalmente, nos orgulhar da cruzada antifeminista e contra a “ideologia de gênero” desses líderes. Ela dissimula o reconhecimento da potência do feminismo.

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