Antonio Prata

Escritor e roteirista, autor de "Por quem as panelas batem"

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Ricos do Brasil: uni-vos!

O poderoso brasileiro acha que tá por cima da carne-seca, mas não entendeu nada

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"É um apoio incondicional ao presidente Bolsonaro", declarou o governador de São Paulo, Rodrigo Garcia. "Apoio incondicional." Pra você ver. Pega a Simone Tebet, os partidos da coligação do Lula ou o PDT. Ela (e eles) condicionam o apoio a compromissos com suas pautas. O nome disso é política. Garcia compra (ou vende-se a?) Jair de porteira fechada. Demolição do Ibama? Rachadinha? O desmonte do ensino público? O flerte com o golpe militar? Dane-se. É o apoio "Andança": "Por onde for, quero ser seu par".

Embora esforçado na lambeção de botas, Garcia não foi o mais emocionado da semana. "É um apoio que vai de coração", disse o governador do DF, Ibaneis Rocha. Ibaneis viu Bolsonaro maldizer vacina, tirar máscara de criança, apoiar milícias e chacina, fazer o Brasil tornar-se um pária internacional e qual o sentimento a amolecer o peito de Rocha? O amor. Ele não apoia Bolsonaro. Ele o AMA.

A ilustração de Adams Carvalho, publicada na Folha de São Paulo no dia 09 de Outubro de 2022, mostra o desenho de um homem usando terno e gravata com a cabeça enrolada por um emaranhado de cordas.
Ilustração Adams Carvalho

Outro pan-apoísta a demonstrar sua gratiluz neofascista foi o governador de Minas Gerais, Romeu Zema. "Colocamos divergências de lado." Não entendo como se colocam de lado quase 700 mil cadáveres, 33 milhões de famintos e a Amazônia em chamas. Mas, fazendo um exercício: se pusesse de lado só os 33 milhões de famintos, imaginando que cada um tem 50 cm de ombro a ombro, seriam 16,5 mil quilômetros. Dava pra chegar na Austrália sem molhar o pé, pisando nas pessoas. (E não dá pra negar que Bolsonaro, Zema, Garcia, Ibaneis e seus asseclas estejam tentando se erguer pisando sobre o sofrimento alheio, dá?)

Além de asco, sinto pena dos puxa-sacos de primeira e última hora. Acham-se espertos, mas são otários. É mais ou menos como se a torre e o bispo se ajoelhassem diante da rainha e combinassem que na próxima partida ela terá sobre o tabuleiro poder "Incondicional", "De coração", "Colocando as divergências de lado". O que estas peças fracas não percebem é que o objetivo da rainha é vencer e o único anteparo entre suas existências e o fim são as regras do jogo. A aposta na democracia é, desde o início, uma aposta egoísta (sem juízo moral) na garantia das regras do jogo.

O Brasil é assim: em tempos democráticos, o Estado mata e tortura pobres e pretos. A cada 30 anos, contudo, vem uma ditadura, "período de exceção" em que o Estado tortura e mata brancos e ricos também. Os políticos, empresários, fazendeiros e faria limers que seguem apoiando o serial killer do Planalto acham que Bolsonaro lhes será fiel quando não precisar mais deles? Na última ditadura o filho do Nelson Rodrigues, um cara de direita e muito bem relacionado, foi pro pau de arara. O diretor de jornalismo da TV Cultura, Herzog, morreu no eletrochoque.

Joice Hasselman, Weintraub, Alexandre Frota, Janaina Paschoal, Soraya Thronicke, uma vez defenestrados do bolsonarismo, receberam toda a fúria do governo e seu exército de ogros on e off-line. Sem mencionar Adriano da Nóbrega, que guardava muitos segredos da família e —não tô insinuando nada, talvez seja só uma coincidência, né?— foi executado pela polícia.

Ditadura é isso aí, meus amigos. O camarada Stálin matava os parceiros e os apagava das fotos –bem antes do Photoshop. Se em vez de fortalecer as regras do tabuleiro você as detona e apoia o mais forte do jogo, é questão de tempo até ser um peão descartado. Mas o poderoso brasileiro acha que tá por cima da carne-seca, que o presidente da República é seu caseiro, sempre a seu serviço. Não entendeu nada.

Ricos do Brasil: uni-vos! Já sabemos que não contamos com vossa solidariedade. Contaremos ao menos com vosso instinto de sobrevivência?

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