Cecilia Machado

Economista-chefe do Banco BoCom BBM, é doutora em economia pela Universidade Columbia

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Descrição de chapéu PIB

Investimentos em capital humano poderão ter de voltar à pauta do dia

Ganhos de produtividade durante a pandemia estão se revertendo

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A produtividade do trabalho —a quantidade de produto gerada por unidade de trabalho— é um importante indicador de performance da economia que captura o quão eficiente é o uso desse insumo na produção de bens e serviços.

Um ganho de produtividade significa que o mesmo bem ou serviço pode ser produzido com menos trabalho ou que mais bens e serviços podem ser produzidos com com a mesma quantidade de trabalho.

Por exemplo, os ganhos na produtividade da economia americana de 1947 em diante permitiram multiplicar a produção de bens e serviços pelo fator 9, ao passo que o número total de horas trabalhadas aumentou apenas modestamente, multiplicado por um fator 2.

Para as empresas, ganhos de produtividade se materializam em oportunidades de investimento e maiores retornos. Para os trabalhadores, o aumento da produtividade permite ganhos salariais ou possibilidades de melhorias nas condições de trabalho. Para os indivíduos em geral, ele representa a expansão das possibilidades de consumo.

Na pandemia, a adoção de novas tecnologias, o trabalho remoto e a reconfiguração dos setores e atividades para atender novas demandas dos consumidores representaram uma grande mudança no funcionamento do mercado de trabalho, trazendo perspectivas reais de ganhos. Nesse período, a produtividade de fato aumentou. Mas dados recentes mostram que esses ganhos estão se revertendo.

Nos Estados Unidos, a produtividade do trabalho, que cresceu 4,4% em 2020 e 2,2% em 2021, encolheu 1,7% em 2022, jogando a média de crescimento da produtividade no período (1,6%) para um número mais próximo da média que se observou na década anterior (1,1% entre 2010 e 2019).

Linha de produção de chuveiros elétricos da Lorenzetti, na Mooca, zona leste de São Paulo - Karime Xavier - 30.set.22/Folhapress

No Brasil, a produtividade do trabalho, que também cresceu durante a pandemia, encontra-se em torno do mesmo patamar de 2019 e todos os ganhos observados em 2020 foram devolvidos. Mas seria um tanto quanto surpreendente que esses ganhos de produtividade, calcados em tecnologia e inovação de processos, fossem apenas temporários.

Parte da reversão decorre de um efeito mecânico da recomposição do emprego nos setores menos produtivos que foram mais impactados pelas políticas de distanciamento social, como é o caso dos segmentos de hospitalidade, transportes e serviços prestados às famílias. Durante a pandemia, o emprego nesses segmentos se reduziu drasticamente, ao passo que a reorientação do consumo de serviços para bens e a resiliência da economia justamente em seus setores mais produtivos sustentaram os ganhos agregados.

As variações de emprego entre os setores de diferentes produtividades durante a pandemia foram as grandes responsáveis pelo aumento da produtividade no período. E esse efeito de composição se desfaz à medida que os demais setores se recuperam.

Adicionalmente, a forte demanda por trabalho —seja nos Estados Unidos, onde há quase o dobro do número de vagas em aberto por trabalhador procurando emprego, seja no Brasil, onde o desemprego alcançou níveis próximos de 2015 e se encontra, possivelmente, abaixo da nossa taxa natural de desemprego— torna plausível que indivíduos de menor qualificação, que não encontrariam emprego se a conjuntura fosse outra, ingressem no mercado de trabalho, comprimindo a produtividade do trabalho por esse outro canal.

Ainda é cedo para saber se os ganhos de produtividade decorrentes do uso de novas tecnologias e de mudanças nos arranjos de trabalho durante a pandemia têm efeitos permanentes que estão sendo ofuscados pelos efeitos de composição setorial e de um mercado de trabalhado artificialmente estimulado, mas a atual redução da produtividade do trabalho traz implicações importantes para a dinâmica de valorização dos salários.

Ganhos de produtividade são fundamentais para sustentar aumentos salariais sem pressão de custos, já que o custo do trabalho por unidade de produto aumenta de acordo com o salário, mas diminui com ganhos de produtividade de trabalho.

Se os ganhos de produtividade do trabalho conquistados na pandemia forem mesmo datados, os investimentos em capital humano e qualificação profissional, que são outras formas através das quais a produtividade do trabalho aumenta, precisarão voltar rapidamente à pauta do dia.

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