No filme "Humoresque", de 1946, aqui traduzido para "Acordes do Coração", há uma cena em que a personagem de Joan Crawford, dama da alta sociedade, está mortalmente entediada em sua própria festa. Homens a cercam, prontos a submeter-se ao seu mais ínfimo desejo. Em vão. Só o Tom Collins parece confortá-la, e ela o bebe com elegante estoicismo diante da futilidade da vida.
Eis que um violinista começa a tocar magnificamente. Ela comenta, ainda indiferente: "Está na cara que esse aí vai acabar na cadeia. Tenho a sensação de que todas as pessoas talentosas vão para a cadeia."
Fosse na época do macartismo, que assombraria a cena cultural americana quatro anos depois, o comentário faria sentido. Um de seus admiradores ri obedientemente, ao que ela diz: "Minha frase foi estúpida. Se você riu é estúpido também." E completa: "Sou constituída de uma total falta de entusiasmo por tudo".
Mas então o violinista (John Garfield) avança num solo extraordinário e quebra sua indiferença. O olhar opaco se acende e ela, sempre levando a boca sensual ao copo, se aproxima do músico em silêncio, seguida de seu séquito masculino. Sente-se a tensão sexual e sua respiração contida. A baforada do cigarro em direção ao virtuose é um evidente convite erótico.
THE FOCKERS
O clássico Tom Collins, criado por volta de 1870 (há uma disputa entre americanos e ingleses pelo local de origem), aparece em outro filme, com menos solenidade, digamos. "Um passarinho me contou que nosso convidado é fã do Tom Colliiiinssss" diz um saltitante Dustin Hoffmann trazendo uma bandeja com seis drinques enfeitados.
O convidado é o sisudo sogro de Gaylord Focker (Ben Stiller), um ex-agente da CIA, interpretado por Robert De Niro. "Meet the Fockers", ou "Entrando Numa Fria Maior Ainda" (2004), ainda tem Barbra Streisand como a mãe sexóloga que deixa o filho constrangido, usando-o de exemplo em comentários para lá de inconvenientes.
O filme, de chorar de rir, é pastelão puro, cheio de piadas sobre puns, trocadilhos bobos e situações grotescas. A graça é essa, ver atores de alto calibre fazendo humor de quinta série. Na cena dos drinques, De Niro conta como havia moldado um seio de látex na forma do seio de sua filha, para que pudesse amamentar o neto sem que ele estranhasse o mamilo. Ouch! Pois é.
Hoffmann parece nunca ter se divertido tanto num papel. Faz um brinde à filha que nunca teve, o que alfineta a insegurança de Gaylord, um enfermeiro constantemente zoado. Termina contando que passou a tarde espremendo suco dos limões para os coquetéis. E que espremeu também os peitos da mulher, rindo com inocência prazerosa ao fazer o gesto correspondente com as mãos. Sem freios, resolve contar da vasectomia que fez, mas é logo interrompido, para alívio geral.
Leve e refrescante, o filme é como o próprio Tom Collins, que ainda pode ser visto em "O Pecado Mora ao Lado", comédia com Marylin Monroe de 1955, e na casa dos Drapers, na série "Mad Men".
TOM COLLINS
Ingredientes
- 60 ml de gim
- 30 ml de suco de limão-siciliano
- 10 ml de xarope de açúcar (um de açúcar para um de água)
- 60 ml de água com gás
Passo a passo
Bata os três primeiros ingredientes com gelo numa coqueteleira. Coe para um copo Collins e complete com água com gás. Enfeite com uma fatia de limão-siciliano e uma cereja marrasquino.
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