Pouco antes de ser mãe de Wandinha (a dos anos 1990), Anjelica Huston teve outro filho "problemático", o trambiqueiro interpretado por John Cusack. O filme, "Os Imorais", dirigido por Stephen Frears, deixa os Addams no chinelo em termos de horripilâncias.
É daquelas histórias em que ninguém se salva, um caráter pior que o outro, com a atmosfera carregada de um trágico tom edipiano (quase compreensível, tendo uma progenitora como La Huston.)
Com toda sua sensualidade funérea, Mortícia ao menos carregava um sorriso de Mona Lisa no rosto, sinal claro de alegria na alcova. A Lilly Dillon de "Os Imorais" nem isso. Sua peruca loira é mais dark que as vestes de vampira da Sra. Addams. Dura, sofrida, Dillon esconde um turbilhão de emoções sob uma frieza tumular.
Títere de gângsteres, ela passeia sua elegância pelos hipódromos do país e aposta nos cavalos certos, garantindo o êxito da manipulação das corridas. Seu filho Roy, a quem havia abandonado, segue paralelamente o mesmo caminho dos pequenos golpes.
O reencontro com a mamma fatale vira um duelo de cinismo, apimentado pela terceira ponta do triângulo, Myra Langtry (Annette Bening), amante de Roy, sexy de um jeito espalhafatoso. É o diabo vestindo… nada. Tudo muito de acordo com o romance de Jim Thompson, no qual o filme é baseado. Deixai aqui toda esperança, vós que vireis a primeira página.
O fato é que tanto filme quanto livro dedicam um momento à coquetelaria. É quando Myra senta-se num bar para apaziguar impulsos homicidas. O garçom, velho conhecido, pergunta se ela quer um martini. "Mmm, não. Acho que quero algo com mais personalidade. Um sidecar, por exemplo, com bourbon em vez de conhaque. Ah, Allen, sem triple sec, por favor."
"Aqui sempre usamos Cointreau no sidecar", retruca o garçom, orgulhoso. "Gostaria de açúcar na borda ou sem?" Myra ajusta o vestido justo e decotado e responde, com a expertise de um mixologista: "Sem. 45 ml de bourbon, 30 ml de Cointreau e um twist de casca de limão, em vez de limão siciliano. Ah, numa taça gelada de champanhe, por favor".
As especificações são curiosas. Tudo indica que o sidecar foi criado em Paris, durante a Primeira Guerra Mundial. O conhaque é, portanto, natural no coquetel. A maioria dos bartenders indica Cointreau em vez de triple sec, por ser de melhor qualidade, em geral. A borda açucarada é herança do brandy crusta, pai do sidecar, que ainda vinha com uma grande casca de laranja enroscada na curvatura da taça.
O nome, para variar, gera controvérsias. Há quem jure de pés juntos que se refere a um oficial que frequentava o Harry's Bar na capital francesa. Ele ia de moto, naquele antigo assento lateral —o sidecar. Essa versão sustenta que ele teria até, um dia, entrado com moto e tudo pela vitrine do lugar, depois de uma manobra desastrada de seu motorista.
Dale DeGroff, um dos grandes divulgadores da coquetelaria dos anos 1980 para cá, tem um palpite mais prosaico. Para ele, o sidecar vem da sobra dos coquetéis que alguns bares oferecem aos clientes num copinho de shot. Ora, esse chorinho é chamado, justamente, de sidecar, porque trafega ao lado do veículo principal, a taça.
Seja como for, "não se torture, Gómez. Esse é meu trabalho".
SIDECAR
45 ml de conhaque
22 ml de licor de laranja
12,5 ml de suco de limão siciliano
5 ml de xarope de açúcar demerara
Bater os ingredientes com gelo e coar para uma taça coupe gelada. Finalizar com um twist de laranja.
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