Desigualdades

Editada por Maria Brant, jornalista, mestre em direitos humanos pela LSE e doutora em relações internacionais pela USP, e por Renata Boulos, coordenadora-executiva da rede ABCD (Ação Brasileira de Combate às Desigualdades), a coluna examina as várias desigualdades que afetam o Brasil e as políticas que as fazem persistir

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Desigualdades
Descrição de chapéu Enem Fies

É preciso promover o trabalho decente em plataformas digitais

Remuneração justa e melhores condições de trabalho são pontos cruciais das discussões

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Caio Magri

Diretor-presidente do Instituto Ethos

A pauta do trabalho decente em plataformas digitais tem retornado ao cenário político, tanto pelo compromisso do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva nesse sentido, assumido nas eleições de 2022, quanto pela discussão a respeito de uma possível regulamentação e sobre qual instrumento legal será considerado para isso. Esse contexto demonstra a urgência de definirmos estratégias para sua promoção, em diálogo coletivo e representativo entre os principais setores e atores.

O trabalho é um pilar estratégico e essencial da sociedade. Se "adequadamente remunerado, exercido em condições de liberdade, equidade e segurança, capaz de garantir uma vida digna", conforme definiu a Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 1999, se torna fundamental para a superação da pobreza, da redução das desigualdades sociais, da garantia da governabilidade democrática e do desenvolvimento sustentável. O conceito de trabalho decente também está presente em um dos compromissos e metas globais das quais o Brasil é signatário, a Agenda 2030 - Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, aparecendo como oitavo objetivo.

O oitavo item dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU
O oitavo item dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU - Reprodução

Considerando o avanço das transformações sociais e das dinâmicas de trabalho, temos um evidente crescimento da atuação das plataformas digitais. Segundo o relatório "O trabalho controlado por plataformas digitais no Brasil: dimensões, perfis e direitos", um milhão e meio de pessoas trabalharam em plataformas digitais ao longo do ano de 2021, e a tendência é que esse número cresça de forma exponencial. Entretanto, 80% dessas pessoas exercem suas funções informalmente, sem proteção social ou outros direitos.

Esse cenário exige que se coloque os trabalhadores e trabalhadoras no centro das discussões e das soluções, pautando as responsabilidades das empresas e os caminhos legais para o desenvolvimento de políticas públicas que promovam a dignidade e o trabalho decente.

Remuneração justa e melhores condições de trabalho são pontos cruciais das discussões sobre trabalho decente em plataformas digitais, envolvendo tempo de trabalho (horas trabalhadas) ou tempo destinado à geração de renda e aos períodos de descanso, bem como condições de saúde e segurança no trabalho. O rendimento justo deve garantir integração social, seguridade social e qualidade de vida, além de possibilidades de desenvolvimento pessoal.

Nesse sentido, as políticas públicas a serem desenhadas devem prever a aplicação de parâmetros de geração de renda usando como referência as Convenções da OIT e outros compromissos e metas globais, assim como a Declaração Universal dos Direitos Humanos e a própria Constituição Federal.

Vinicius Pinheiro, chefe da OIT (Organização Internacional do Trabalho) no Brasil - Pedro Ladeira - 23.mar.23/Folhapress

Desde 2021, o Instituto Ethos, organização da sociedade civil que atua com responsabilidade social empresarial, vem contribuindo para esse debate, em especial no engajamento das empresas de plataformas digitais na promoção do trabalho decente. Atuamos pautando o desenvolvimento de diretrizes e compromissos empresariais que traduzam o conceito de trabalho decente para o contexto das plataformas e que garantam direitos e dignidade humana a partir do nosso grupo de trabalho.

Produzimos a "Carta-compromisso pelo trabalho decente em plataformas digitais", a ser lançada em maio, e temos a expectativa de que seja um instrumento com potencial de pautar e incidir na criação de políticas públicas. O documento em questão foi elaborado a partir de consultas e de diálogo com outras organizações da sociedade civil e entidades que atuam no tema, o poder público e a academia, além de ter sido aberto para consulta pública com a sociedade civil por certo período. O objetivo é fornecer diretrizes para a implementação de um modelo de negócio responsável, inclusivo e respeitoso, a partir de cinco pilares essenciais: diálogo social, condições dignas de trabalho e rendimento justo; responsabilidades e transparência; comunicação objetiva; e inclusão social e de diversidades.

A carta-compromisso pretende estimular o debate sobre o que é remuneração justa a partir da referência do salário-mínimo, assim como a respeito de melhores condições de trabalho, acesso à previdência e proteção social, diálogo coletivo, desenvolvimento de políticas que aperfeiçoem os termos e regras de forma clara e transparente, com uma comunicação acessível e democrática e práticas que estejam alinhadas com o combate às desigualdades.

Além disso, é resultado da parceria com as empresas do nosso grupo de trabalho, engajando e incentivando o comprometimento do setor privado na promoção da responsabilidade social empresarial em plataformas digitais. O lançamento da nossa carta é também uma oportunidade de fomentar a urgência do debate na sociedade, ampliando os espaços de diálogo com os atores públicos e privados.

Vivemos um momento de transformações, consumo elevado de produtos e serviços em plataformas digitais, consolidação de grandes marcas, compromissos empresariais pactuados, um novo governo apontando na direção do cumprimento da Agenda 2030 de Desenvolvimento Sustentável da ONU, novas configurações legislativas e trabalhadores buscando se organizar por meio de movimentos e sindicatos.

Não poderíamos ter oportunidade melhor para a formulação da política brasileira para o trabalho decente em todas as diferentes plataformas digitais.

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