O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, despontou como uma alternativa política, dando um toque de civilização à polaridade que envenena a vida nacional. Em poucos dias, com guinadas surpreendentes, ele entrou num caminho que se parece com o rumo paleolítico do ex-governador do Rio Wilson Witzel.
A Polícia Militar barbarizou em Guarujá e, numa medida da confusão, na segunda-feira, enquanto a Ouvidoria falava em 10 mortos, o governador falava em 8, defendendo a operação. Passados os dias, a conta chegou a 16, com as habituais denúncias de execuções.
A truculência policial é coisa velha. Tarcísio já foi contra as câmeras individuais para os PMs, mudou de opinião, mas não consegue que elas funcionem em operações como a de Guarujá.
Enquanto o Governo de São Paulo oferecia uma chacina em nome da segurança pública, o secretário de Educação, Renato Feder, trouxe uma novidade, a truculência pedagógica, na embalagem de luxo das ferramentas digitais.
Com uma canetada, o Governo de São Paulo recusou 10 milhões de volumes impressos que receberia do Ministério da Educação por intermédio do Programa Nacional do Livro Didático, o PNLD. Feder anuncia que esse acessório secular será substituído por ferramentas digitais.
Em tese, é o progresso que chega. Na prática, virá a balbúrdia. O governo federal é o maior comprador de livros do Brasil. O PNLD distribui mais de 200 milhões de exemplares, num negócio perto de R$ 2 bilhões.
Livros impressos são um tipo de negócio. Livros digitais têm custos e preços diversos. Pelo mundo afora, as editoras não gostam dos digitais, que são mais baratos e muito mais versáteis, sobretudo para estudantes. Assim, Feder está com um pé no progresso.
Eis que o doutor rebarba os livros do PNLD e diz que "a secretaria avaliou que perderam conteúdo, profundidade, estão superficiais". Cadê a avaliação? Quem a assina? Com que justificativas? Truculência.
Nenhum país foi para a pedagogia digital com uma canetada. Mesmo a Estônia, exemplo mundial de modernidade nesse campo, avançou aos poucos, com muita conversa. A Estônia tem cerca de 170 mil estudantes. São Paulo tem 3,5 milhões.
Com a internet e livros didáticos eletrônicos, o mundo da educação será outro. Mas fica a pergunta: e a criança que não tem acesso à rede ou a um computador na escola e/ou em casa? Segundo Feder, as escolas podem imprimir o material para quem não tiver equipamentos em casa. Conta outra, doutor. Onde estão as impressoras de qualidade e a disponibilidade dos equipamentos?
Se o governo pensa num investimento para suprir essa lacuna, chega-se a um absurdo. Dispensam-se livros impressos para gastar dinheiro com equipamentos eletrônicos. Fecha-se um cartório e abre-se outro. Feder promete distribuir 20 mil celulares que foram apreendidos pela Receita Federal. A ver, com a palavra a Receita, que os leiloava.
Já houve um tempo em que o PNLD abrigava espertalhões. Mais recentemente, viu-se que o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, o FNDE, tentou fazer uma compra de 30 mil laptops para uma escola de 255 alunos. O poeta Cacaso já ensinou que no Brasil fica moderno o milagre, a água já não vira vinho, vira direto vinagre.
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