Gabriel Kanner

Presidente do Instituto Brasil 200, é formado em relações internacionais na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).

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A curiosa aliança da esquerda com o extremismo islâmico

Por que a palavra islamofobia foi absorvida pelo vocabulário da esquerda identitária ao lado de machismo e homofobia

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É interessante observar como a política muitas vezes coloca lado a lado correntes de pensamento aparentemente antagônicas, e, da mesma forma, provoca conflitos entre ideologias aparentemente similares.

Um exemplo histórico foi o acordo de não-agressão firmado entre Hitler e Stalin em 1939. Como se sabe, em 1941 esse pacto foi rompido, e a União Soviética acabou tendo um papel decisivo na derrota alemã. Porém, a curta aliança entre os dois rivais só foi possível graças a um objetivo em comum: o desejo de expansão de seus respectivos territórios.

Um objetivo em comum tem o poder de aproximar grupos políticos que, em outras condições, seriam inimigos. É o caso da esquerda identitária com o extremismo islâmico.

A sugestão de que existe um objetivo em comum entre esses dois grupos poderá levantar muitas dúvidas e questionamentos. Afinal, o que defende a esquerda identitária? O que a aproxima do islamismo radical? Qual pauta comum os dois defendem? Vou buscar responder a essas questões abaixo.

Comecemos entendendo o que é a esquerda identitária. Após a retumbante derrota do marxismo clássico para o capitalismo no século 20 (representada pelo colapso da União Soviética e o fim da Guerra Fria), uma nova onda de pensamento marxista foi ganhando cada vez mais força.

Após a derrota na batalha econômica, os marxistas logo perceberam que a “luta de classes” entre burguesia e proletariado precisaria ser repaginada para continuar engajando as novas gerações. Afinal de contas, ao contrário do que imaginavam os intelectuais, o proletariado estava interessado cada vez mais em trabalhar e sustentar sua família, e não em fazer revolução. Foi dessa repaginação que surgiu a nova esquerda identitária.

Muitas vezes chamada de “progressismo”, essa ideologia foi muito influenciada por pós-modernistas como Michel Foucault e pelos pensadores da Escola de Frankfurt. A esquerda identitária, ou progressista, busca representar o pensamento coletivo de grupos identitários, sendo os principais deles mulheres, negros, homossexuais e, mais recentemente, transgêneros. Na esquerda identitária, o indivíduo não tem muita relevância; o que vem primeiro é o grupo ao qual ele pertence.

Após os marxistas gradualmente abandonarem a luta de classes tradicional, surgiram as novas divisões da esquerda moderna, dessa vez por gênero, etnia e sexualidade. Palavras como racismo, machismo, homofobia, transfobia e gordofobia, entre outras, passaram a ser repetidas incansavelmente por todos os lados, com a mesma lógica do marxismo clássico: toda relação humana pode ser observada como uma relação entre um opressor e um oprimido.

Nesse processo, a “islamofobia” também passou a fazer parte do vocabulário da esquerda identitária, seguindo o mesmo raciocínio: qualquer atitude que possa ser considerada preconceituosa contra algum grupo específico deve ser classificada como nociva e deve ser combatida. Aqui vale pontuar que nem todos os grupos estão aptos a receber o apoio dos progressistas. Cristãos, por exemplo, jamais entrarão nessa lista. Abaixo entenderemos a razão por trás disso.

No caso do Islã, há uma aparente contradição entre as pautas defendidas pela esquerda identitária e as atitudes concretas de grupos extremistas islâmicos. Os dois exemplos mais óbvios são o machismo e a homofobia. Segundo um estudo de 2013 do Pew Research Center, com 38.000 muçulmanos em 39 países, mais da metade deles, na média, são favoráveis à adoção da Lei de Sharia em seus países.

Segundo a lei islâmica, ou Lei de Sharia, a homossexualidade é ilegal e pode ser punida com execução. Os direitos das mulheres também são praticamente inexistentes. Até 2001, no Afeganistão, o Talibã promovia o apedrejamento de mulheres acusadas de adultério. Elas também eram proibidas de estudar ou trabalhar.

Levando tudo isso em consideração, como é possível que a esquerda identitária trabalhe ferozmente para combater o machismo e a homofobia e, ao mesmo tempo, seja complacente com os regimes que mais promovem esse tipo de opressão no mundo?

Os exemplos deste “apoio” são inúmeros. Apenas para citar alguns: em uma famosa entrevista de 2014, o ator americano Ben Affleck, conhecido por ser de esquerda e apoiar o Partido Democrata, confrontou o apresentador Bill Maher após o mesmo fazer críticas ao Islã. Affleck chamou Maher de “islamofóbico” e disse que suas opiniões eram “nojentas”.

Em 2019, a revista de extrema-esquerda Carta Capital publicou uma notícia com o título “Islamofobia sufoca e aterroriza muçulmanos em todo o mundo”. E, nesta semana, o Partido da Causa Operária (PCO) considerou a tomada de poder pelo Talibã no Afeganistão uma “enorme vitória”.

Agora chegamos ao ponto principal. Afinal, o que há por trás desta aliança aparentemente contraditória entre o progressismo e o extremismo islâmico? Qual o principal objetivo que os une? A resposta aparece quando deixamos de olhar para as estratégias adotadas por cada um e focamos no resultado que querem atingir.

A esquerda progressista acredita que o mundo Ocidental, representado principalmente pelos EUA, deu errado. Ela acredita que é um mundo opressor, machista, racista, e homofóbico. Ela acredita que os valores judaico-cristãos sobre os quais foram construídos boa parte dos países ocidentais são retrógrados e limitantes e estão dificultando o “progresso” da humanidade. Ela acredita que tudo que foi construído até aqui deve ser combatido para que um novo Ocidente possa surgir.

Os exemplos deste ódio dos progressistas ao Ocidente também são abundantes, como quando ateiam fogo em bandeiras ou derrubam e queimam estátuas, prática recém-importada pela esquerda tupiniquim. Outro exemplo recente que teve repercussão mundial foi do time de futebol feminino dos EUA, que se ajoelhou antes dos jogos nas Olimpíadas de Tóquio para protestar contra os EUA, o país que deveriam estar defendendo.

Do outro lado, os extremistas islâmicos também acreditam que o Ocidente deu errado e precisa ser combatido. O principal exemplo até hoje do ódio do extremismo islâmico ao Ocidente foi o ataque do dia 11 de setembro de 2001, prestes a completar 20 anos.

Para o fundamentalismo islâmico, a sociedade moderna Ocidental representa o que há de mais degradante e sórdido no mundo. Liberdade sexual irrestrita, pornografia, sexualização de crianças e ideologia de gênero representam o principal mal a ser combatido no mundo. Paradoxalmente, são todas pautas que fazem parte da agenda progressista.

A esquerda identitária e o extremismo islâmico têm visões diametralmente opostas de mundo. No entanto, estão cada vez mais unidos pelo ódio ao Ocidente e pelo desejo de destruir, ou no mínimo reformular, os países que têm apreço pela democracia e que se sustentam na tradição judaico-cristã.

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