Helio Beltrão

Engenheiro com especialização em finanças e MBA na universidade Columbia, é presidente do instituto Mises Brasil.

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O street art e a Lei da Cidade Limpa

SP incentiva ruas com expressão cultural e ideológica, mas coíbe a comercial

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As autoridades municipais transformaram São Paulo em uma cidade de certa forma esquizofrênica. Por um lado, é um dos polos de referência mundial de street art, com importantes galerias a céu aberto. Por outro, combate vigorosamente a publicidade, o que chamo de arte corporativa, sob a alegação de fins estéticos. No cerne desse paradoxo está a Lei Cidade Limpa, que acaba de completar 15 anos.

No início deste século, a completa negligência da prefeitura em fiscalizar gerou uma proliferação desenfreada e ilegal de lambe-lambes em postes, faixas em pontes e nas calçadas, bem como cartazes e tabuletas irregulares, inclusive em áreas residenciais. A poluição degradante vinha devorando São Paulo e, como a prefeitura foi incompetente para coibir a ilegalidade, resolveu criar uma bomba.

O idealizador da lei, o então prefeito Kassab, caracterizava a publicidade como poluição visual, o vilão a ser combatido. Beneficiava-se do consenso entre os intelectuais da época de que a publicidade é "inimiga da cultura", um "instrumento neoliberal" para emburrecer as massas, de que as ruas precisavam ser "purificadas do capitalismo malvadão".

Grafites em São Paulo - Eduardo Knapp - 30.set.2020/Folhapress

Mas logo em seguida à aprovação da lei ficou demonstrado que não havia motivação antipublicidade; o inimigo era apenas a publicidade em espaço privado. A ideia foi: primeiro estatizar toda a publicidade e, ato contínuo, privatizar o monopólio com o maior lucro possível. Assim, a prefeitura articulou o banimento da publicidade legal privada (empenas de prédios em certas regiões e outdoors e luminosos em lotes e estacionamentos) para organizar a outorga do seu recém-obtido monopólio, auferindo receita extraordinária.

A publicidade é permitida nos abrigos de ônibus e nos relógios concedidos a duas empresas por um prazo de 25 anos. Idealmente, a publicidade não deve ser intrusiva ou agressiva, deve ser sutil e integrada, porém não banida por completo. Por esse motivo, a padronização resultado da concessão representou avanço, em linha com as melhores práticas mundiais. Mas o modelo está fazendo água.

É óbvio que todos queremos uma cidade bonita, mas quem define o que é belo? A cidade melhorou substancialmente desde então?

A prefeitura continua bastante ineficaz na fiscalização e muitas vezes persegue comerciantes com multas sem notificação prévia. Nossa querida São Paulo é uma selva de pedra acinzentada. Não figura entre as mais belas metrópoles mundiais. Perdeu um pouco de seu colorido e identidade com a lei. E temos uma das maiores taxas de vandalismo por pichadores do mundo.

Por isso é promissor que a arte do grafite venha sendo aceita pelas autoridades, não apenas em espaços públicos mas também em privados. Lamentavelmente, é encharcada de burocracia e regulamentações que tiram espontaneidade e perturbam o caráter efêmero do street art.

Creio que a implicância geral com a publicidade em espaços privados pode ser mitigada com conhecimento.

A concessão de publicidade paga contas. A outorga do mobiliário urbano gerou R$ 242 milhões para o caixa da prefeitura, além da manutenção e do upgrade de centenas de abrigos de ônibus na periferia, bem como de relógios.

As capitais mais bonitas do mundo, como Nova York, Londres, Tóquio e Paris, são repletas de publicidade, inclusive em espaços privados como empenas de prédios, táxis, ônibus, lotes. Em São Paulo vivem grandes nomes do street art e também da publicidade. Basta desse preconceito —retrógrado como todos— contra a arte corporativa.

Deixe cada um cuidar de sua fachada dentro de regras mais benignas, as cores voltarem, os negócios se impulsionarem. A cidade ficará mais pujante, e as pessoas que se incomodarem com empenas e fachadas comerciais com grandes marcas poderão sempre recorrer às telas viciantes de seus celulares. Repletas de publicidade.

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