Ilona Szabó de Carvalho

Presidente do Instituto Igarapé, membro do Conselho de Alto Nível sobre Multilateralismo Eficaz, do Secretário-Geral. da ONU, e mestre em estudos internacionais pela Universidade de Uppsala (Suécia)

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Ilona Szabó de Carvalho
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Proteger a democracia

É urgente construir um arcabouço jurídico que defenda o espaço cívico

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Quando a eleição presidencial de 2018 foi confirmada, defini com minha equipe três prioridades temáticas antevendo o que aconteceria quando as promessas de campanha começassem a virar realidade. A partir do nosso limitado papel enquanto organização da sociedade civil, faríamos o que estivesse a nosso alcance para salvar a legislação de controle de armas, garantir o papel constitucional das polícias e combater o crime ambiental na Amazônia.

E, como Bolsonaro sempre deixou claro que lideranças cívicas e organizações como a nossa seriam atacadas de múltiplas formas, incluímos uma prioridade condicionante para todas as outras: proteger o espaço cívico, a esfera pública onde cidadãos se organizam, debatem e agem para influenciar a opinião e as políticas públicas. Portanto, não fomos pegos de surpresa.

Ao contrário, monitoramos a escalada na perseguição a críticos do governo federal dos últimos meses. Alertamos que o espaço cívico estava se fechando muito antes de ver instrumentos legais como a Lei de Segurança Nacional (LSN) serem usados de forma ilegítima por autoridades que envergonham nossa democracia. Tentamos chamar a atenção das instituições da República de que este governo mina a democracia por dentro e que as pessoas e organizações que atuam na esfera pública precisavam de sua proteção.

Creio que não restem mais dúvidas: um arcabouço jurídico de proteção da democracia e do espaço cívico é urgente. O Congresso e o Supremo Tribunal Federal têm nas mãos a chance de aprovar esse novo marco legal e assegurar a proteção contra artigos abusivos da LSN.

Três episódios recentes ilustram o uso enviesado de dispositivos da LSN que ameaçam a liberdade de expressão e dão margem para o uso do aparato policial do Estado para perseguir e calar críticos ao governo: a intimação de Felipe Neto, a detenção de manifestantes na praça dos Três Poderes, e a investigação de sociólogo que usou outdoors para criticar o presidente.

Nos primeiros dois anos do governo Bolsonaro, a Polícia Federal abriu 77 inquéritos com base na LSN, mais que o dobro das investigações iniciadas de 2015 a 2018, de acordo com a Folha. O advogado Marcelo Feller, os jornalistas Ruy Castro e Hélio Schwartsman e professores, como Pedro Hallal e Eraldo dos Santos Pinheiro da UFPel também foram alvos. As investigações (ainda) não prosperam no Judiciário, mas alimentam uma milícia de ódio nas redes e afetam a vida profissional e pessoal de seus alvos.

Nos últimos três meses de 2020, o Instituto Igarapé identificou 114 ameaças ao espaço cívico, quase uma por dia. Desse total, 31 se referem a intimidação, assédio e censura. Como nos mostra o GPS do Espaço Cívico, a sociedade civil está sendo atacada inclusive por instituições que deveriam protegê-la. A próxima edição trará dados ainda mais preocupantes.

Tramita no Congresso o projeto de lei 3.864 que revoga inteiramente a LSN e avança na tipificação de crime contra o Estado democrático de Direito. Sua aprovação é urgente. Ao mesmo tempo, há ações no STF pedindo a revogação ou a atualização da legislação. A ADPF 799, de iniciativa do PSB, pede que a Corte declare a inconstitucionalidade de alguns pontos centrais da lei. O Supremo deveria acelerar o seu julgamento e limitar o uso da LSN enquanto o Legislativo não aprova o novo arcabouço legal de proteção democrática.

O Brasil tem muitos silenciamentos forçados em sua história. Está nas mãos do STF, e do Congresso --que pode e deve unir as forças democráticas da esquerda à direita-- garantir a voz e a participação de grupos opositores que são mais uma vez perseguidos no debate público, e para além dele.

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