João Pereira Coutinho

Escritor, doutor em ciência política pela Universidade Católica Portuguesa.

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Criação do Estado palestino independente é necessidade vital a Israel

Motivos demográficos, políticos e morais dariam suporte para essa solução do conflito

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Assisti a “Oslo”, o filme recente da HBO sobre o processo de paz entre israelenses e palestinos. Ou, melhor dizendo, sobre as conversas secretas (e, pelos vistos, bem nutridas e regadas) entre representantes dos dois lados que permitiram o início desse processo de paz.

É um filme competente, apesar de esquemático, deixando de fora o contexto histórico e político que permitiu a dois “facilitadores” noruegueses —Mona Juul e Terje Rod-Larsen— pensar o impensável.

No filme, Mona confessa que se interessou pelo conflito quando viu nos olhos de jovens árabes e judeus a mesma vontade de terminar com o medo. Não duvido.

Ruth Wilson em "Oslo"
Ruth Wilson como Mona Juul em 'Oslo' - Reprodução

Mas, nos inícios da década de 1990, o mundo tinha literalmente mudado, abrindo a porta estreita que trouxe dois inimigos históricos para a mesma sala.

Por um lado, os palestinos estavam entregues à sua sorte: a União Soviética, aliada da causa árabe, estava reduzida a pó. Para piorar as coisas, a OLP de Arafat, depois de apoiar Saddam Hussein na Guerra do Golfo, tinha alienado o apoio dos países árabes produtores de petróleo.

Por outro lado, Israel assistira em choque à violência da primeira intifada e descobrira, depois de um momento temporário de ingenuidade, que o Hamas não era interlocutor para nada. Melhor retornar para a velha OLP, que em 1988, na sua “Declaração de Independência”, pelo menos aceitara a existência de dois estados na Palestina.

O resto é história —uma trágica história, com o premiê Yitzhak Rabin assassinado por um fanático israelense que não tolerara a partilha do território com os árabes (Sadat, presidente egípcio, tinha conhecido igual destino depois de assinar os acordos de paz com Israel em Camp David) e com a Autoridade Palestina a não conseguir travar o terrorismo crescente do Hamas.

A pergunta que interessa, porém, é outra: será que Oslo foi um erro e uma ilusão?

O primeiro-ministro israelense Yitzhak Rabin (esq.), o presidente americano Bill Clinton (centro) e o líder palestino Yasser Arafat durante a assinatura de acordo - Gary Hershorn - 13.set.1993/Reuters

Ou, apesar dos erros e das ilusões, a ideia que presidiu ao processo —dois Estados, lado a lado, com fronteiras seguras e reconhecidas— é a única alternativa realista para o conflito?

Se o filme é ambíguo na resposta, a revista Economist é brutal: Oslo morreu, o paradigma dos dois Estados deve ser enterrado.

À primeira vista, a Economist tem argumentos fortes. Como falar de dois Estados quando a construção de assentamentos na Cisjordânia inviabiliza um Estado palestino minimamente contíguo?

E como insistir na fórmula quando o Hamas e a Fatah vivem em planetas distintos —não apenas em termos geográficos, mas sobretudo ideológicos, com o primeiro a não tolerar a existência do Estado de Israel?

Sem falar do entusiasmo (diminuto) que a ideia desperta entre judeus israelenses (só 42% apoiam a solução dos dois Estados), árabes israelenses (só 40%) e palestinos (59%; cinco anos atrás, eram 82%).

É hora de pensar num único estado binacional que garanta direitos iguais para os dois povos, conclui a revista.

No fundo, e apesar de a Economist não o referir, é hora de retornar a uma solução que é tão antiga como o conflito e que foi rapidamente abandonada por um motivo óbvio: a incapacidade de judeus e árabes para viverem no mesmo espaço.

Se isso já era válido em 1937, quando os ingleses recomendaram oficialmente a partição da Palestina, que dizer hoje, depois de décadas de violência e ressentimento?

A frustração e o cansaço convidam a atos tresloucados. Mas, na política internacional, não conheço maior loucura do que reunir israelenses, palestinos da Fatah e islamitas do Hamas no mesmo espaço e esperar que a concórdia nasça entre eles por geração espontânea.

Não sei se Israel terá novo governo de coalização. Não sei se um governo de coalização que junta esquerda, centro, direita, ultradireita e árabes sob o mesmo teto será sequer funcional.

Mas sei que a herança de Benjamin Netanyahu não se recomenda. E que um Estado palestino independente e viável não é apenas do interesse dos palestinos razoáveis.

Por motivos demográficos, políticos e morais, é uma necessidade vital para a sobrevivência de um Estado judaico democrático.

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