José Manuel Diogo

Diretor da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Brasileira, é fundador da Associação Portugal Brasil 200 anos.

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Niilismo de Musk no Twitter lembra por que defesa da democracia deve estar na agenda

Magnata representa, ainda que sem eventual dolo, a maior ameaça que paira sobre o sistema democrático

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A cena parece saída de um filme apocalíptico. Em um cenário metade "Metrópolis", metade Frankenstein, o líder genial, criador de todas as coisas, iluminado e lúcido Deus Musk aborda o futuro da humanidade em uma de suas habituais homilias —desta vez na forma de "tweet poll". Sou ou não sou? Fico ou não fico?

Escolho Elon Musk e a sua galáctica popularidade como ponto de partida para a última coluna de 2022 por mais que uma simples coincidência de agenda. O senhor Starlink é a metáfora perfeita para o maior dos desafios que a humanidade tem para responder. A sobrevivência da democracia.

Porque mais importante que trabalhar para os 17 objetivos da Agenda 2030 é defender a democracia. E Musk representa, ainda que sem eventual dolo, a maior ameaça que sobre ela paira.

O empresário Elon Musk discursa em evento da SpaceX no Texas - Jim Watson - 10.fev.22/AFP

A agenda sustentável aborda importantes questões sociais, econômicas e ambientais, mas em nenhuma delas a palavra democracia é referida. Ela promove a paz, a justiça e instituições eficazes e tem como base os progressos dos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, estabelecidos entre 2000 e 2015, mas estes também nunca a referiram.

Esquecimento ou compromisso, a omissão é grave, porque garantir a sobrevivência da democracia em um mundo conectado globalmente —e permanentemente online— é a tarefa primordial de todas a agendas. Incluindo esta. A democracia é sua matriz fundadora e atriz principal. Mas não está nomeada.

Seu desaparecimento da agenda mais importante cria a perigosa ilusão de que ela não é fundamental e —o que é mais grave— a deixa livre para ser usada por outros de forma leviana, como é exemplo a última enquete que o empresário da Tesla fez no Twitter.

Ele se apropriou da democracia quando disse "se votarem para eu sair, eu saio", mas logo a deixou cair: "Só saio quando encontrar alguém melhor que eu". Ele só sai quando ELE decidir. Onde já todos ouvimos isso?

Ao contrário de músicos, jogadores de futebol ou mesmo dos novos "influenciadores", mais ou menos globais —que falam muito, mas não têm palco para além da vontade de seus fãs—, o empresário de Marte chama para sua narrativa os condimentos da política, até agora apenas disponíveis nos sistemas constitucionalmente elencados.

E foi sob a égide dessa constitucionalidade que a democracia e suas instituições se mostraram fortes, resistindo a ataques sofridos. Mais recentemente aqui no Brasil e antes nos Estados Unidos.

Mas onde a democracia não está amparada pela lei isso não acontece: em países como a Rússia e a China e, chegando ao ponto, em ecossistemas contemporâneos e hiperconectados como esse que a genialidade niilista de Musk compra e constrói.

Em mais de 8.000 tuítes desde o princípio de 2021 (mais de dez por dia), o magnata manipulou mercados não regulados de criptomoedas, fez subir e descer o preço de ações de empresas das quais é dono bancando ser Deus e ditador, usando precisamente como argumento totalitário a própria democracia.

Ao contrário do que foi Donald Trump ou ainda é Jair Bolsonaro, Elon Musk é hoje um politico não eleito —e, por isso, muito mais perigoso do que aqueles que a democracia pode derrotar. Também é por isso que a Agenda 2030 é insuficiente; porque se a democracia não for pautada, ela dificilmente vai sobreviver.

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