José Manuel Diogo

Diretor da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Brasileira, é fundador da Associação Portugal Brasil 200 anos.

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Encenação de feto no Senado é manipulação emocional que enfraquece a democracia

Legisladores deveriam preservar e defender a verdade, não minar a confiança nas instituições com encenações

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Imagine a cena: uma senhora grita dramaticamente no Parlamento, encenando a morte de um feto. Mas esse não é um teatro qualquer. A performance é realizada em pleno Senado Federal, transmitida ao vivo para todo o mundo pela TV Senado, um canal financiado pelo dinheiro dos contribuintes.

Senadores e senadoras, eleitos e eleitas pelo povo para representar seus interesses e legislar com base na verdade, assistem ao espetáculo. Mas a encenação não passa de uma tentativa de transformar uma falsa narrativa em uma suposta verdade.

Nyedja Gennari é uma mulher branca e loira que expressa intensa dor enquanto segura um microfone, com o fundo azul sólido do Senado
Nyedja Gennari grita e simula o desespero do feto em performance no Senado Federal, em Brasília - 17.jun.24/Reprodução/TV Senado

Essa cena surreal, que aconteceu mesmo, levanta um novo limiar sobre a integridade das instituições democráticas. Quando os próprios legisladores recorrem a artifícios emocionais para manipular a opinião pública, como podem ter a autoridade moral para aconselhar a população sobre os perigos da desinformação? Isso não só mina a confiança pública nas instituições, como também enfraquece a própria essência da democracia.

A proliferação de notícias falsas é um dos grandes desafios do nosso tempo, e é imperativo que as instituições democráticas se mantenham acima de qualquer suspeita.

Atos como o promovido pelo senador Eduardo Girão (Novo-CE), que contratou uma contadora de histórias para uma encenação no Senado, colocam em xeque a seriedade e a integridade do espaço legislativo. Aquela manipulação emocional, disfarçada de protesto legítimo, distorce a realidade e engana a população.

Se permitirmos que o Parlamento seja palco de tais espetáculos, em breve outras pautas igualmente importantes serão tratadas com o mesmo desrespeito. A reforma da Previdência, a legislação ambiental e os direitos das minorias e até a arrecadação de impostos serão distorcidas e manipuladas, se transformando em meros instrumentos de jogo político e desinformação. A democracia corre o risco de ser contaminada indiscriminadamente por mentiras e manipulações, em vez de baseada em decisões informadas e ponderadas.

E como deve se comportar a democracia para evitar contaminação? Fortalecimento da ética legislativa é fundamental. Os legisladores devem manter um compromisso firme com a verdade e a transparência, estabelecendo códigos de conduta que proíbam a manipulação emocional e a disseminação de desinformação nas casas legislativas. A educação midiática deve ser promovida, ensinando a população a identificar e resistir à desinformação. Um público bem informado é menos suscetível a manipulações.

É necessário desenvolver políticas que responsabilizem as plataformas de mídia social e também tradicional pela disseminação de notícias falsas, criando mecanismos eficazes para identificar e remover conteúdo enganoso.

Ao desenvolver e adotar essas medidas, podemos proteger nossas instituições democráticas e assegurar que elas continuem a servir ao interesse público de maneira justa e honesta.

A verdade deve ser preservada e defendida, por todos especialmente por aqueles que ocupam cargos de poder e influência. Soluções consensuais incluem a implementação de códigos de conduta claros e rigorosos para homens públicos, campanhas de alfabetização midiática abrangentes, regulação adequada das plataformas digitais, e o fomento de uma cultura de debate baseada em evidências e transparência.

Se nada for feito a guerra pelo poder vai degradar a democracia até o fim da decência. Depois disso vem a guerra de verdade.

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