Juliano Spyer

Antropólogo, autor de "Povo de Deus" (Geração 2020), criador do Observatório Evangélico e sócio da consultoria Nosotros

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Juliano Spyer

Dois livros sobre maconha baseados em fatos reais

O que chamamos de 'uso recreativo' é uma maneira de se automedicar?

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Na semana passada, mergulhei em dois livros sobre maconha: o recém-lançado "As Flores do Bem", do neurocientista Sidarta Ribeiro, e "A Cannabis e o Cristão" (tradução livre), do teólogo estadunidense Todd Miles. Ambos utilizam extensivamente dados de pesquisas científicas, muitas vezes os mesmos dados, para chegarem a conclusões opostas. Enquanto um destaca os benefícios do uso recreativo, o outro considera as virtudes da planta insuficientes diante dos riscos do consumo.

Antes de prosseguir, esclareço que esta reflexão não abrange as relevantes aplicações do canabidiol para tratamentos médicos. Apenas argumento que o antídoto para anular as estratégias baseadas no medo não reside em retratar a maconha como uma solução universal, mas sim em examinar de forma desapaixonada os riscos do consumo recreativo.

O neurocientista Andrew Huberman, da Escola de Medicina de Stanford, poderia aderir à onda da legalização irrestrita, dada sua formação acadêmica e o contexto tolerante da Califórnia, o estado em que reside. No entanto, sua abordagem é ponderada. Ao contrário do teólogo Todd Miles, Huberman afirma que é relativamente seguro para adultos consumirem cannabis recreativamente, podendo, inclusive, trazer benefícios para aqueles que buscam relaxar.

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Plantação interna de cannabis da Cannasure, empresa israelense de maconha medicinal - Lalo de Almeida -3.mar.20/Folhapress

Entretanto, há riscos associados ao consumo recreativo da maconha, especialmente durante a adolescência, quando a pressão social para transgredir pode ser mais forte. O consumo até os 25 anos aumenta significativamente a probabilidade de surtos psicóticos irreversíveis. "O principal efeito da cannabis é direcionar a atenção e o foco," explica Huberman. "O problema é que ela não atua como um filtro muito eficaz. Dessa forma, as pessoas podem concentrar-se exclusivamente em videogames ou em sua ansiedade, se já estiverem ansiosas." O perigo cresce em razão da potência muitas vezes superior das variedades vendidas atualmente em comparação com a planta encontrada na natureza.

Sidarta argumenta corretamente que a maconha foi demonizada para justificar a repressão a certos grupos da sociedade, especialmente de pretos pobres no Brasil. Contudo, "As Flores do Bem" incorre no mesmo problema de "A Cannabis e o Cristão": estabelecer uma conclusão previamente e dar ênfase às evidências que sustentam seu argumento.

O caminho para ressignificar a maconha não é negar o que foi dito sobre ela, retratando-a como um elixir universal para a felicidade, mas sim apresentar com clareza as possíveis contraindicações para o uso recreativo. E junto com isso, examinar em que medida o "uso recreativo" é uma maneira de se automedicar para tratar a ansiedade.

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