Leandro Narloch

Leandro Narloch é jornalista e autor do Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil, entre outros.

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Descrição de chapéu Eleições 2022

A deliciosa sensação de desistir do Brasil

Parar de se importar com o país é tão difícil quanto sair de um relacionamento abusivo

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É deliciosa a sensação de desistir do Brasil. É como sair de um relacionamento abusivo: triste no começo, pois você gostava dele e queria que tivesse dado certo, mas logo em seguida uma sensação de liberdade e alívio impera. Você não precisa mais ter esperança com o Brasil, aturar o mal que as discussões do Brasil fazem. Tem pela frente toda uma vida com novos interesses.

Inspirado pela decisão de Diogo Mainardi, desisti do Brasil semanas atrás. Passei bons dias lendo sobre as ruas da capital da Taiwan (Taipei é uma espécie de Tóquio mais verde e tropical, segundo um jornalista), o potencial de Ruanda como a Cingapura da África, a onda de arquitetura biofílica do Vietnã.

Com tantos outros países exóticos e tropicais por aí, por que perdi tanto tempo com o Brasil?

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Ato em apoio ao presidente Jair Bolsonaro durante as comemorações de 7 de Setembro deste ano, na avenida Paulista, em São Paulo - Bruno Santos - 7.set.2022/Folhapress

Desisti do Brasil não só porque o ladrão deve voltar à cena do crime ou porque 91% dos eleitores aderiram ao "rouba-mas-faz" no primeiro turno.

Desisti porque o Brasil é vulnerável demais à pressão de grupos de interesse. Nem Lula nem Bolsonaro nem o Congresso conseguiram ou conseguirão lidar com as minorias organizadas em busca de privilégios.

Com tanta pressão por benefícios fiscais, barreiras alfandegárias, regulamentações que excluem concorrentes, leis de incentivo, supersalários, piso salarial e muitas coisas grátis, o país dificilmente fará um corte relevante de gastos e impostos nem terá grandes aumentos de produtividade.

Pode ter voos de galinha, mas não crescimento de longo prazo acima da média de outros países. Será um país de velhos pobres, enquanto países que já foram mais pobres que nós enriquecerão mais que europeus ou americanos.

Se por razões familiares não posso sair do país com os pés, posso pelo menos desistir dele financeiramente, mandando para fora o resto do cascalho que ainda está por aqui. E intelectualmente, parando de perder tempo com debates do século passado que assombram este lugar.

Então me prometi: esquecer o Brasil, concentrar-se em temas universais, filtrar no Twitter qualquer publicação que contenha as palavras "Lula", "Bolsonaro", "política", "ministro" ou "eleições". Abandonar logo essa língua que ninguém importante no mundo fala.

Mas o Brasil se intromete. Abro o WhatsApp e os grupos estão em convulsão por causa do mais recente golpe do STF, o tipo penal que Alexandre de Moraes acabou de inventar, a nova estupidez que o candidato a presidente falou.

Quando vejo já estou de novo escrevendo sobre as polêmicas da República das Bananas, sendo acusado de torcer contra as enfermeiras por acreditar que pisos salariais muito acima do mercado causam desemprego, tentando defender que não deveria soar polêmico o que está no capítulo 1 dos livros didáticos de microeconomia.

Cumprir a meta de se alienar do Brasil é tão difícil quanto sair de um relacionamento abusivo. Mas eu não vou desistir dela.

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