Meu algoritmo me odeia. Chamo de "meu algoritmo" a inteligência artificial que fica de butuca em minhas interações virtuais e faz uma curadoria perversa dos conteúdos que chegam até mim.
Não sei o que fiz de errado para ser perseguida e torturada por um robô fofoqueiro e manipulador. Talvez meu interesse por assuntos aleatórios tenha causado uma pane em seu sistema e agora ele almeja fazer o mesmo comigo, me levando à loucura.
É uma batalha injusta, já que o bot conhece todos os meus "guilty pleasures", aquele tipo de conteúdo que parece um acidente de carro. Você não quer olhar, mas vai diminuir a velocidade, vai olhar e vai se arrepender de ter olhado.
Um exemplo. O algoritmo sabe que sou feminista, fato conhecido até pelo porteiro do prédio da minha avó. Imagino o bug do milênio experimentado por esse robô quando comecei a consumir o que há de mais retrógrado e constrangedor disponível na internet: vídeos de coaching de relacionamentos para mulheres. Sim, homens usando seu lugar de fala para adestrar mulheres cujo objetivo é agradar a eles.
Calma, eu posso explicar. Esse tipo de conteúdo é como uma droga que me arrasta da euforia ao desespero em poucos minutos. Do riso indomável à percepção lacerante de que falhamos como humanidade. Fora a nostalgia de reviver o pesadelo cor-de-rosa de uma pré-adolescência nos anos 1990, regada a reportagens similares na revista Capricho. "Thierry Figueira conta o que gosta —e o que não suporta!— em uma garota."
Aliás, por onde anda Thierry Figueira? Em uma pesquisa rápida descobri que, no dia 6 de setembro de 2020, ele fez um passeio no parque com suas filhas gêmeas, que se divertiram no pula-pula. Em mais uma pesquisa, descobri que uma cama elástica custa cerca de R$ 1.000 e não cabe no meu orçamento assim como não caberia na minha sala (isso é só uma amostra do que meu algoritmo precisa encarar todos os dias).
Enquanto tudo é capaz de me distrair, nada desvia o bot de sua missão: vigiar e punir. Não importa para onde eu olhe, haverá um acidente de carro conhecido como macho palestrinha, intercalado por camas elásticas e perucas para gatos. Entre tantos itens desnecessários, nada supera os workshops para enlouquecer um homem. Definitivamente, não preciso de mais uma relação tóxica.
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