Uma das figuras mais mal interpretadas pelo feminismo é a talarica. Talarica é a mulher que pratica conjunção carnal com o boy de uma amiga dela.
As redes sociais estão repletas de indiretas, piadas e ameaças sobre tesourar os cabelos de uma talarica. Segundo o folclore popular, a pena para tal atrocidade seria cortar, à força, as madeixas da infratora.
É curioso que a perseguição parta muitas vezes de mulheres que se autodenominam feministas. Ainda que tenham se comprometido a combater a hipervalorização do masculino e a rivalidade feminina, elas agem como se o bem mais valioso de uma mulher fosse o seu interesse romântico.
Elas dividem com as amigas até a sua lâmina de depilar, mas, quando o assunto é macho, a coisa muda de figura.
Outro termo associado à talarica é "fura-olho". Mas ela não cega outra mulher, e sim abre seus olhos para a sordidez de um parceiro capaz de traí-la com uma amiga dela.
Infelizmente, a corda sempre estoura do lado mais fraco, e a talarica é a mais criticada dentre os envolvidos, apesar de ter libertado sua mana de uma relação heteronormativa com um grande babaca.
A talarica não hesita, mesmo sabendo que corre o risco de perder a amiga, a carteirinha de feminista, talvez até os cabelos. Assim como os monges raspam a cabeça para expressar sua renúncia à vaidade pessoal, a talarica também está disposta a sacrificar sua imagem e se tornar uma pária, tudo por um bem maior.
Em certos casos, a talarica chega a engatar um relacionamento com o ex-namorado da amiga. Sabe que sua amiga é trouxa o suficiente para perdoá-lo. Por isso, precisa ir até o fim e terminar o que começou.
Ela assume um compromisso com um homem que comprovadamente não é confiável, protegendo, assim, sua amiga dela mesma. Ninguém ameaçaria cortar os cabelos de uma catadora de lixo, mas a talarica não tem a mesma sorte.
Algumas leitoras devem estar pensando que existem outros jeitos melhores de ajudar suas amigas, como conversar com elas, por exemplo.
Mas a talarica prefere a prática à teoria, sabe que o campo da ação é o mais efetivo. É uma mártir que se entrega de corpo e alma à causa, quebra tabus e incita debates profícuos dentro do movimento feminista. Ela não deveria ser estigmatizada, e sim enaltecida por sua coragem e seu dedo podre em relação aos homens.
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