Martin Wolf

Comentarista-chefe de economia no Financial Times, doutor em economia pela London School of Economics.

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Líderes ocidentais fazem uma aposta sensata na Índia

Estima-se que sua população e economia cresçam rapidamente nas próximas décadas, oferecendo um contrapeso à China

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Financial Times

O inimigo do meu inimigo é meu amigo. Com base nisso, as relações mais estreitas do Ocidente com a Índia fazem sentido. O abraço caloroso de Joe Biden ao ex-banido Narendra Modi, agora seu primeiro-ministro politicamente dominante, em Washington, e o abraço igualmente caloroso de Emmanuel Macron ao líder indiano em Paris visam estabelecer um relacionamento próximo com um país que se espera seja um contrapeso poderoso à China.

Esta é uma boa aposta para as potências ocidentais? Sim. É provável que a Índia seja uma grande potência em ascensão. Os interesses também se alinham. Mas até que ponto os valores são compartilhados é uma questão mais aberta.

Onde está a Índia agora e para onde ela pode ir econômica e politicamente?

O presidente americano, Joe Biden, brinda com o premiê indiano, Narendra Modi, durante visita de Estado - Stefani Reynolds - 22.jun.23/AFP

Hoje, a Índia tem a quinta maior economia do mundo a preços de mercado e a terceira maior em poder de compra. Sua população é de 1,43 bilhão, quase a mesma da China. Em 2050, no entanto, a população da Índia está prevista pela ONU para chegar a 1,67 bilhão, contra 1,31 bilhão na China.

O PIB per capita da Índia (em poder de compra) está próximo de 40% dos níveis da China, de acordo com o FMI. Em 1990, a Índia e a China eram quase igualmente pobres, com o PIB per capita, medido pelo poder de compra, estimado em 4,6% e 4,1% dos níveis dos Estados Unidos, respectivamente.

Com um desempenho econômico que é certamente o mais notável da história mundial, o PIB per capita da China atingiu 28% dos níveis dos EUA no ano passado, contra 11% da Índia. No entanto, enquanto o desempenho relativo da China foi incomparavelmente melhor, a Índia ficou em segundo lugar entre as sete maiores economias emergentes.

A China foi um exemplo extremo da estratégia de desenvolvimento mais bem-sucedida da era moderna –alto investimento, rápida industrialização e atualização progressiva das exportações de manufaturados. Esse também foi o caminho do Japão. A Índia seguiu um caminho muito diferente.

Entre 2014 e 2023, sua taxa média de investimento foi de apenas 31% do PIB, contra 44% da China, e sua taxa de poupança nacional foi de 30%, contra 45% da China. Mais surpreendentemente, a participação da manufatura no PIB da Índia vem caindo, não aumentando, como seria de se esperar neste estágio de seu desenvolvimento. Essa participação foi de 13% do PIB em 2022, contra 28% da China. Embora as proporções do comércio em relação ao PIB (a preços de mercado) tenham se tornado aproximadamente iguais, a China é agora um exportador muito maior para os mercados mundiais.

O que então pode estar por vir?

Comecemos pelos fundamentos. A taxa de poupança bruta da Índia, embora não tão alta quanto a da China, é alta o suficiente, especialmente dada a possibilidade de importar capital, para financiar uma taxa de crescimento de pelo menos 5-6%.

A Índia também tem razoável estabilidade macroeconômica. O empreendedorismo é abundante e a infraestrutura está melhorando. A Índia definitivamente não sofrerá escassez de mão de obra, pelo contrário. Como o professor Ashoka Mody observa em "India Is Broken" [a Índia está falida], a incapacidade de gerar bons empregos suficientes é um grande fracasso. Outro é a incapacidade de educar a população de acordo com um padrão elevado: o capital humano provavelmente se mostrará uma restrição muito mais dura do que o capital físico.

A Índia é um local óbvio para empresas que seguem a estratégia "China mais um". Ela também tem a vantagem sobre os concorrentes óbvios de um grande mercado doméstico. No entanto, falhou repetidamente em explorar as oportunidades de rápido crescimento das exportações de manufaturados nos últimos 75 anos. A desconfiança do livre comércio sempre atrapalha.

Como aconteceu com muitos outros países, a Índia sofreu com o excesso de dívidas inadimplentes desde a crise financeira global, em 2008. Esse "problema de balanço patrimonial duplo" foi uma restrição significativa ao crescimento. Mas, argumenta a Pesquisa Econômica deste ano, "no curso da última década, a dívida não financeira do setor privado indiano e a dívida corporativa não financeira como parcela do PIB caíram quase 30 pontos percentuais". Os balanços bancários também foram corrigidos. Ao todo, o mecanismo de crédito está mais uma vez em boa forma.

O FMI prevê um crescimento econômico anual de pouco mais de 6% de 2023 a 2028, com o PIB per capita crescendo cerca de um ponto percentual mais lentamente. Tal crescimento seria bastante próximo das médias das últimas três décadas. Desde que o país não seja abalado por grandes choques globais ou domésticos, isso parece perfeitamente viável, até bastante plausível. Mas e em longo prazo?

Lembre-se de que a Índia ainda tem muito espaço para recuperar o atraso. É também um país jovem, com uma força de trabalho extremamente subempregada, potencial para melhorar a qualidade dessa força de trabalho, uma taxa de poupança razoavelmente alta e esperanças cada vez mais generalizadas de maior prosperidade. Uma grande adaptação será necessária para enfrentar o desafio da mudança climática, dado o fracasso em reduzir as emissões globais. Mas a transição energética também oferece grandes oportunidades para a Índia. Em suma, julgo que o país deve ser capaz de sustentar o crescimento do PIB per capita em 5% ao ano, ou mais, até 2050. Com melhores políticas, o crescimento pode até ser um pouco maior, embora também possa ser menor.

Assim, suponhamos que o PIB per capita da Índia continue crescendo 5% ao ano, enquanto o dos Estados Unidos cresce 1,4%, mais ou menos, como nas últimas três décadas. Então, em 2050, o PIB per capita da Índia (em poder de compra) alcançaria cerca de 30% dos níveis dos Estados Unidos, aproximadamente onde está o da China hoje. De acordo com as previsões medianas da ONU, a população da Índia também seria 4,4 vezes maior que a dos Estados Unidos. Portanto, sua economia seria cerca de 30% maior que a dos Estados Unidos.

Em suma, é bastante razoável supor que a Índia se tornará uma grande potência. Não é tão difícil imaginar que sua economia terá um tamanho semelhante à dos EUA em 2050. Assim, os líderes ocidentais estão fazendo uma aposta sensata numa aliança de conveniência com a Índia. Mas a Índia também será uma democracia liberal? Vou discutir essa questão na próxima semana.

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