Mathias Alencastro

Pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento, ensina relações internacionais na UFABC

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Bolsonaristas travam guerra contra debates à imagem de republicanos nos EUA

Para seguidores do atual presidente, maior pecado nos embates políticos é excesso de civilidade

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É normal políticos escolherem os seus palcos, mas há algo espantoso na decisão de Tarcísio de Freitas (Republicanos) de cancelar de uma só vez todas as suas participações em debates e sabatinas, incluindo o Roda Viva desta segunda-feira (17). Afinal, o programa da TV Cultura, que há décadas faz e desfaz carreiras, é um patrimônio cultural do estado de São Paulo.

Nada é coincidência no bolsonarismo, e a posição de Tarcísio segue a estratégia de cancelamento de embates públicos adotada por candidatos trumpistas nos Estados Unidos durante a campanha para as eleições de meio de mandato, em novembro.

Presidente Jair Bolsonaro ao lado de Tarcísio de Freitas, candidato ao governo de São Paulo, durante missa no Santuário Nacional de Aparecida - Eduardo Knapp - 12.out.22/Folhapress

O Partido Republicano deu o mote em abril, quando formalizou a sua retirada do comitê bipartidário que organiza debates presidenciais. A pressão veio do próprio Donald Trump, que se diz vítima de uma armação. Por conta das restrições sanitárias de 2020, ele foi incapaz de repetir com Joe Biden a receita de intimidação física e moral, com direito a ameaça de prisão, usada contra Hillary Clinton em 2016.

Acompanhando o precedente presidencial, candidatos republicanos estão se recusando a encontrar os seus adversários. O ex-jogador de futebol americano Herschel Walker, quintessência do político trumpista, evitou o enfrentamento contra o reverendo Raphael Warnock na corrida pelo Senado na Geórgia, e o governador de Ohio, Mike DeWine, candidato à reeleição, anulou todos os debates. Tudo está a postos para o candidato republicano criar um modelo inteiramente novo no pleito presidencial de 2024.

A relação entre candidatos das novas direitas e os debates está longe de ser estática. Vinte anos atrás os teóricos da liberdade de expressão ainda discutiam a pertinência de abrir o espaço público para as suas lideranças. Em 2002, Jacques Chirac se recusou a debater com Jean-Marie Le Pen no segundo turno em nome do cordão sanitário que isolava a extrema direita do resto da classe política e, em particular, da direita moderada.

Em 2022, sua filha Marine Le Pen foi tratada como uma política normal por Emmanuel Macron no debate presidencial. Um mês depois, o seu partido elegeu a maior bancada de deputados da sua história na Assembleia Nacional. Com a rara exceção de Portugal e Espanha, onde Vox e Chega! continuam sendo pontualmente excluídos da paisagem institucional e midiática, os partidos de extrema direita dominam emissoras de televisão e rádio na Itália, na França e na Alemanha.

Apesar do blefe constante sobre uma possível moderação de Jair Bolsonaro (PL), os seus aliados sempre se recusaram a seguir os modelos europeus e embarcar na normalização. Bolsonaristas continuam se inspirando em Donald Trump e se impondo pela agressão, recusando apertos de mão, atacando jornalistas e tentando todo tipo de provocação para desviar a atenção

Confiantes na supremacia das novas tecnologias sobre os meios de comunicação tradicionais, eles usam os debates como superestúdios para criar imagens que serão manipuladas e disseminadas nas redes sociais. Ironicamente, Tarcísio decidiu sair do Roda Viva porque, no seu único encontro com Fernando Haddad (PT) no segundo turno, ele cometeu o maior pecado da ética bolsonarista: o excesso de civilidade.

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