Mauricio Stycer

Jornalista e crítico de TV, autor de "Topa Tudo por Dinheiro". É mestre em sociologia pela USP.

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Novelas feitas como 'obras fechadas' somam recordes negativos de audiência

Nesse experimento que não aceita mudanças de trajeto, programas perdem chance de ouvir público e melhorar índices

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O capítulo final de "Nos Tempos do Imperador", que a Globo exibe nesta sexta, encerra a primeira etapa de uma experiência ousada: a exibição de novelas quase inteiramente escritas antes de serem gravadas e levadas ao ar já com metade ou mais dos seus capítulos prontos.

Trata-se de uma inflexão radical em um modo de produção estabelecido ao longo de décadas e que se convencionou chamar de "obra aberta". Normalmente escrita à medida que vai sendo exibida, a novela sempre permitiu que os autores alterassem o rumo de suas tramas em função da recepção do público.

As outras duas novelas inéditas da Globo atualmente no ar, "Quanto Mais Vida Melhor", na faixa das 19h, e "Um Lugar ao Sol", às 21h, também seguiram esse novo modo de produção. Transformadas em "obras fechadas", as três são cobaias da experiência de seguir produzindo conteúdo original em meio ao caos da pandemia.

O show tem que continuar, diz o mantra da indústria do entretenimento. Lançada em agosto de 2021, "Nos Tempos do Imperador" foi a primeira novela inédita da emissora em mais de um ano. Escrita por Thereza Falcão e Alessandro Marson, começou a ser produzida ainda em 2019, mas teve o seu cronograma revisto inúmeras vezes em consequência das dificuldades impostas pela pandemia.

Entre as medidas tomadas para reagir às restrições impostas pela crise sanitária, a produção sofreu um corte no número de figurantes, o que afetou o impacto de muitas cenas, e teve menos cenas românticas do que o tema e o horário permitiriam.

Mais difícil de contornar, creio, foi a impossibilidade de fazer ajustes na trama, investir mais ou menos em certos personagens, corrigir o tom da interpretação de alguns atores, e até mesmo acrescentar situações não previstas originalmente para dar dinamismo à história.

No livro "Novela: Obra Aberta e Seus Problemas", lançado em 2016, o pesquisador Fábio Costa fez um excelente levantamento sobre os diferentes tipos de intervenção realizados em novela ao longo de cinco décadas. O estudo mostra como emissoras e autores reagiram a situações inesperadas e alteraram, com sucesso, aspectos significativos de tramas no meio do caminho.

Nunca saberemos qual seria o resultado de "Nos Tempos do Imperador" em uma situação normal, como "obra aberta", mas o fato é que a audiência média da novela é a mais baixa já registrada nessa faixa horária. O mesmo recorde negativo ameaça as outras duas tramas inéditas no ar.

Como mostrou Cristina Padiglione no final de dezembro do ano passado, a perda de audiência das novelas não é um dado ligado exclusivamente à pandemia ou a essa experiência de lançar histórias previamente já escritas e gravadas.

A Globo perdeu mais da metade de seu público de novelas de 2000 para cá, segundo a medição do Kantar Ibope. Levantamento obtido pela jornalista mostrou que a emissora segue líder em audiência com folga no mercado nacional e na Grande São Paulo, mas os seus índices despencaram.

A explicação para a fuga de público, anota Padiglione, pode ser encontrada no crescimento do consumo de outras telas, com ênfase no streaming, nicho que mais cresceu no bolo de sinais medidos pelo Kantar Ibope.

Não deixa de ser irônico que essa migração de público tenha como resultado o consumo de... novelas.

Três folhetins infantis do SBT frequentemente estão entre os conteúdos mais vistos pelo brasileiro na Netflix. O Globoplay, além de oferecer dezenas de títulos antigos do seu catálogo, vem adquirindo os direitos de exibição de novelas mexicanas, turcas e portuguesas, entre outras. E a HBO Max anunciou planos de produzir tramas curtas para a sua plataforma.

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