Michael França

Ciclista, doutor em teoria econômica pela Universidade de São Paulo; foi pesquisador visitante na Universidade Columbia e é pesquisador do Insper.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Michael França
Descrição de chapéu machismo

Reservas de cadeiras no parlamento para grupos desfavorecidos?

A política é mais um espaço onde a elite faz valer suas preferências

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

O debate em torno da representação política dos grupos desfavorecidos está ganhando força em vários países do mundo. Nesse contexto, a criação de reservas de cadeiras no parlamento representa uma das possibilidades para acelerar o processo de inclusão das minorias.

Porém, surge uma questão: representatividade política realmente importa? Apesar da relevância desta pergunta, parcela considerável da população, até a mais escolarizada, pode apresentar dificuldades para desenvolver uma linha argumentativa clara e objetiva quando confrontada com tal indagação.

Plenário do Senado Federal durante sessão solene do Congresso Nacional - Leopoldo Silva - 7.mai.2020/Agência Senado

Devido a isso, meu intuito aqui será procurar apresentar alguns resultados, baseados na literatura cientifica, que ajudam a reforçar a importância da inclusão política. Deste modo, prezados leitores, sintam-se à vontade para enviar comentários dizendo se, no final, os argumentos apresentados na coluna foram convincentes ou não.

De início, deve-se pontuar que a inclusão das minorias nos espaços de poder apresenta o potencial de afetar a distribuição de bens públicos e a forma de fazer política. Empiricamente, sabe-se que as prioridades de cada grupo social tendem a serem distintas para uma série de decisões que afetam a sociedade.

Mulheres, homens, negros, brancos, pobres, ricos e suas intersecções podem apresentar preferências específicas em relação às escolhas públicas. No contexto da Covid-19, por exemplo, os pesquisadores Raphael Bruce, Alexsandros Cavgias, Luis Meloni e Mário Remígio encontraram que houve uma diferença significativa na condução da pandemia nas prefeituras lideradas por mulheres.

O desempenho delas foi superior ao dos homens quando se leva em consideração a redução do número de mortes, hospitalizações e o aumento da fiscalização das intervenções não farmacêuticas (Under pressure: Women’s leadership during the COVID-19 crisis, 2022).

A alocação de bens públicos também pode ser afetada de acordo com o perfil populacional de cada localidade. Nos Estados Unidos, em um estudo publicado no prestigiado The Quartely Jornal of Economics, os pesquisadores Alberto Alesina, Reza Baqir e Welliam Easterly encontraram que as cidades americanas que apresentavam maior diversidade étnica possuíam menor oferta de educação, estradas, esgotos e coleta de lixo (Public Goods and Ethnic Divisions, 1999)

Em parte, isso ocorre porque a boa vontade dos indivíduos para com os outros apresenta dificuldades para ultrapassar as barreiras que separam os mais variados grupos sociais. Tal hipótese foi testada em um interessante experimento realizado pelos pesquisadores Yan Chen e Sherry Li.

O estudo apresentou evidências de que os participantes tendiam a recompensar mais o bom comportamento e punir menos o mau comportamento dos membros do próprio grupo (Group Identity and Social Preferences, 2009). Tal resultado reforça a proposição de que a identidade repercute nas preferências sociais e, assim, influencia o comportamento e a alocação de bens públicos.

No contexto político brasileiro, da esquerda à direita, sabe-se que o parlamento não é uma representação da sociedade, mas sim, um espaço onde setores da elite fazem valer suas preferências e, não raramente, atuam para ampliar suas vantagens.

O leitor atento deve ter percebido que em um dos artigos citados no texto os pesquisadores fizeram uma bela homenagem à banda Queen escolhendo o nome de uma de suas músicas (Under pressure) na composição do título do artigo. Para não perder o costume pensei em terminar essa coluna homenageando-a também. Entretanto, apesar de gostar da canção e depois de refletir sobre a letra, acho que ela não combina muito com a mensagem que gostaria de passar. Então, dessa vez a homenagem vai para a música "No agreement", do pai do Afrobeat, Fela Kuti.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.