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Julio Wiziack é editor do Painel S.A. e está na Folha desde 2007, cobrindo bastidores de economia e negócios. Foi repórter especial e venceu os prêmios Esso e Embratel, em 2012

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Descrição de chapéu Folhajus

Após acordo entre Brasil e Paraguai, advogados cobram R$ 30 milhões em honorários de Itaipu

Valores decorrem de processo feito enquanto Brasil discutia com o Paraguai a nova tarifa da hidrelétrica

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São Paulo e Brasília

Dois advogados que lideravam o departamento jurídico da ENBPar (Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e Binacional) movem uma ação contra a hidrelétrica de Itaipu Binacional em que cobram R$ 30 milhões em honorários em uma causa de cerca de R$ 265 milhões.

O caso decorre de uma situação ocorrida durante a negociação do novo acordo entre Brasil e Paraguai. Para evitar qualquer tipo de problema com o fornecimento da energia gerada pela hidrelétrica binacional, a ENBPar decidiu depositar os valores da tarifa em juízo.

Região de Foz do Iguaçu, onde está instalada a usina hidrelétrica de Itaipu
Região de Foz do Iguaçu, onde está instalada a usina hidrelétrica de Itaipu - José Fernando Ogura/ANPr

O contrato entre os dois países venceu no fim de 2023 e um novo acordo só foi anunciado no início de maio.

Nesse período, a ENBPar depositou R$ 2,2 bilhões referentes a três meses de pagamento pela energia de Itaipu. A medida foi adotada como forma de blindar a estatal brasileira de possíveis questionamentos, especialmente pelo TCU (Tribunal de Contas da União).

As cerca de 30 distribuidoras mantiveram os repasses das faturas pagas pelos consumidores brasileiros pela utilização da energia à ENBPar e o dinheiro foi depositado em juízo para dar segurança à transação.

Essa solução foi discutida pela diretoria e pelo conselho de Itaipu e da ENBPar, bem como pelos representantes dos ministérios de Minas e Energia e das Relações Exteriores.

No entanto, Itaipu não validou a proposta e pediu que o caso fosse tratado fora da Justiça (entre as partes) ou que o lado brasileiro fizesse um depósito simples, espécie de caução.

Via Justiça, o dinheiro foi repassado em 11 depósitos entre março e maio. Com o anúncio do acordo entre os países, não foi mais necessário seguir com os repasses.

Itaipu recebeu os R$ 2,2 bilhões no começo deste mês.

A sentença, no entanto, ainda não foi proferida, o que deve acontecer nos próximos dias.

Litígio

No entanto, Fábio Amorim da Rocha e Vladimir Belmino de Almeida, ex-chefe jurídico e ex-assessor jurídico da ENBPar, respectivamente, afirmam que Itaipu se recusou a pagar seus honorários, calculados entre 10% a 20% do valor da causa e que são quitados por quem perde a ação.

Os advogados afirmam que, como o valor da ação era de R$ 295,8 milhões, teriam direito a aproximadamente R$ 30 milhões.

A AGU, no processo, informa que o entendimento da União sobre o valor pleiteado pelos advogados é o de que pleiteiam entre R$ 110 milhões e R$ 220 milhões —10% a 20%, respectivamente, do valor do acordo, que foi de R$ 2,2 bilhões.

No entanto, Itaipu não quis resolver o acerto de contas por vias judiciais e os dois advogados foram instruídos a assinar um acordo em que abririam mão dos honorários. Ambos recusaram.

Desde então, Itaipu tenta, na 2ª Vara Federal de Curitiba, derrubar a tese dos dois advogados, que cobram a conta.

A companhia alega que ambos agem de má-fé e desejam se "enriquecer às custas da Itaipu e dos consumidores brasileiros".

A hidrelétrica também tenta transferir o ônus para a ENBPar e afirma que não é responsável pelo pagamento. Diz, inclusive, que os impactos dos pagamentos dos honorários seriam repassados aos consumidores.

Os advogados afirmam que a defesa de Itaipu distorce os fatos e demonstra desconhecimento sobre como funciona o setor elétrico, já que honorários do tipo não são repassados aos consumidores.

Afirmam ainda que os direitos sobre os honorários de sucumbência estão firmados pelo Código de Processo Civil, foram confirmados pelo estatuto da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Pressão

Ao Painel S.A. Fábio Amorim da Rocha disse que houve pressão interna para que ele e Vladimir desistissem dos honorários e abrissem mão de seus direitos.

Segundo ele, uma advogada da companhia, que na época atuava como consultora jurídica com eles, assinou o acordo de cessão de direitos. Segundo Fábio, ela foi contratada em dezembro e não atuou oficialmente no processo.

Rocha diz que se a empresa tivesse contratado um escritório externo, seriam cobrados, no mínimo, R$ 2 milhões somente para a "propositura da ação".

"Mas como foram dois advogados internos, de um jurídico extremamente pequeno, que deram a solução e resolveram o problema, na hora que viram o valor dos honorários, todo mundo cresceu o olho. E aí fica fácil chamar a gente de mercenário", diz o advogado.

Fábio afirma que o conselho da ENBPar os tratou como heróis por criarem uma tese que respaldou os administradores da empresa, mas agora eles são apontados como vilões.

Nas tratativas para evitar o calote em seus honorários, os advogados ainda propuseram que 80% do valor devido por Itaipu fosse revertido para vítimas das chuvas no Sul.

O juiz definiria uma entidade filantrópica que receberia esse valor, mas a proposta foi rejeitada.

"O que a gente quis foi tentar fazer um acordo dentro do próprio acordo. Nós não fizemos nada diferente de qualquer advogado. Estou muito tranquilo em relação à legalidade, à postura, à ética", disse Rocha.

No fim de maio, Fábio e Vladimir pediram exoneração da ENBPar.

Governo pede reforço

A consultoria jurídica do Ministério de Minas e Energia pediu a atuação da AGU (Advocacia-Geral da União) para intervir na ação e evitar o pagamento do valor milionário de honorários.

Em nota, a ENBPar disse que não fará comentários sobre o processo, pois ele tramita sob sigilo judicial.

"Os profissionais citados não fazem mais parte dos quadros da empresa", disse o órgão.

Procurada, Itaipu disse que foi contra a ação desde o início, por isso contestou nos autos a "desnecessidade do processo e a impossibilidade de condenação em honorários de sucumbência", da qual afirma ser uma "imoral perseguição" da parte dos advogados. A companhia diz que o pedido dos ex-advogados da ENBPar está desalinhada com princípios constitucionais que orientam o trabalho de agentes públicos.

"A Itaipu, entretanto, confia que o Poder Judiciário brasileiro não dará guarida a pretensões que violem o princípio da moralidade administrativa e configurem tentativa de lesão ao patrimônio público."

Com Diego Felix

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