Paul Krugman

Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

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Descrição de chapéu clima mudança climática

Mais um passo na direção do apocalipse climático

A Suprema Corte faz sua parte para tornar a Terra inabitável

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Paul Krugman

Estamos tendo uma onda de calor, uma onda de calor tropical. Também uma onda de calor temperada e uma onda de calor ártica, com as temperaturas alcançando mais de 30 graus no norte da Noruega.

A megasseca no oeste dos Estados Unidos reduziu o lago Mead a uma pequena fração de seu antigo tamanho, e agora ele ameaça se tornar um "lago seco", incapaz de fornecer água para as grandes cidades.

A mudança climática já está causando danos imensos, e é provavelmente apenas questão de tempo para que experimentemos enormes catástrofes que custarão milhares de vidas.

E a maioria republicana na Suprema Corte acaba de votar pela limitação da capacidade do governo Biden de fazer qualquer coisa a esse respeito.

Trator carregando contêiner com água em área atingida por incêndio florestal próxima a Artesa de Segre, na Espanha
Trator carregando contêiner com água em área atingida por incêndio florestal próxima a Artesa de Segre, na Espanha - Albert Gea - 18.jun.22/Reuters

Diz algo sobre a situação da política nos Estados Unidos o fato de que vários especialistas ambientais que sigo ficaram aliviados com a decisão, que foi menos abrangente do que eles temiam e ainda deixou ao governo alguns possíveis caminhos para a ação climática. Diante de nossa situação, acho que objetivamente as más decisões devem ser graduadas em uma curva.

E nesse sentido suspeito que pelo menos alguns dos juízes republicanos entenderam a enormidade do que estavam fazendo e tentaram fazer o mínimo possível enquanto mantinham a fidelidade partidária.
É a fidelidade partidária que está em jogo, é claro.

Qualquer um que acredite que a série recente de decisões da justiça reflete alguma teoria jurídica coerente está sendo voluntariamente ingênuo: claramente, o modo como esse tribunal interpreta a lei é quase totalmente determinado pelo que serve aos interesses republicanos.

Se os estados querem proibir o aborto, ora, é prerrogativa deles. Se Nova York tem uma lei que restringe o porte de armas de fogo escondidas, ora, é inconstitucional.

E o partidarismo é o problema central da política climática. Sim, Joe Manchin está atrapalhando o avanço da agenda climática de Biden. Mas, se houvesse alguns senadores republicanos dispostos a apoiar a ação climática, Manchin não teria importância, nem a Suprema Corte.

Uma simples legislação poderia estabelecer regulamentos limitando as emissões de gases do efeito estufa, fornecer subsídios e talvez até aplicar impostos para encorajar a transição para uma economia verde. Então, em última instância, nossa paralisia diante do que parece cada vez mais um apocalipse iminente se resume à oposição decidida do Partido Republicano a qualquer tipo de ação.

A pergunta é: como deixar o planeta queimar se tornou um dogma republicano?

Nem sempre foi assim. A Agência de Proteção Ambiental, cujo âmbito de ação o tribunal acaba de limitar, foi criada por ninguém menos que Richard Nixon. Até 2008, John McCain, o nomeado republicano para presidente, fazia campanha com a promessa de impor um sistema de limites às emissões de gases do efeito estufa.

A posição republicana sobre o meio ambiente também é completamente diferente da de partidos conservadores da corrente dominante em outros países ocidentais. Um estudo –de alguns anos atrás, mas acho que os fundamentos não mudaram– descobriu que a maioria dos partidos conservadores apoia a ação climática e que o Partido Republicano "é uma anomalia ao negar a mudança climática antropogênica".

E sim, o Partido Republicano continua na negação climática; às vezes pode admitir que a mudança é real, enquanto insiste que não se pode fazer nada a respeito; mas volta à negação toda vez que há uma frente fria.

Então o que explica a diferença do Partido Republicano? Uma resposta natural é "siga o dinheiro": no ciclo eleitoral de 2020, a indústria de gás e petróleo deu 84% de suas contribuições políticas aos republicanos; na mineração de carvão, foram 96%.

Mas eu desconfio que o dinheiro seja apenas parte da história; na verdade, em certa medida, a causalidade pode seguir no outro sentido, com o setor de combustíveis fósseis apoiando os republicanos porque eles são contra o meio ambiente, e não o contrário.

Meu ceticismo sobre uma história de simplesmente seguir o dinheiro vem de algumas observações. Uma delas é que os republicanos assumiram posições anticiência em outras questões, como a vacinação contra a Covid, em que considerações monetárias são muito menos óbvias. Até onde sei, o coronavírus não é uma grande fonte de contribuições de campanha.

Também, enquanto a posição republicana sobre o clima é fora da curva, comparada com a de partidos conservadores "normais", é na verdade típica dos partidos populistas de extrema direita. (Nota: detesto usar a palavra "populista" aqui, porque os republicanos não demonstram inclinação para políticas que realmente ajudariam os trabalhadores. Mas acho que estamos presos a ela.)

Em outras palavras, a política das políticas climáticas parece muito com a política de governos autoritários e os direitos das minorias: o Partido Republicano parece mais o Fidesz da Hungria ou o Lei e Justiça da Polônia do que os partidos de centro-direita que outros países chamam de conservadores.

Por que, exatamente, os partidos autoritários de direita são contra o meio ambiente? Essa é uma discussão para outro dia. O que importa agora é que os Estados Unidos são o único grande país em que um partido autoritário de direita –que perdeu o voto popular em sete das últimas oito eleições presidenciais, mas controla a Suprema Corte– tem a capacidade de bloquear ações que poderiam impedir a catástrofe climática.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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