Paul Krugman

Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

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Paul Krugman

Por que os republicanos se tornaram tão radicais?

Extremismo parece ser alimentado pelo ressentimento contra as mesmas coisas que tornam os EUA grandes

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Muitos analistas políticos passaram anos alertando que o Partido Republicano estava se tornando um partido radical e antidemocrático.

Muito antes de os republicanos nomearem Donald Trump candidato a presidente, e ainda muito antes de Trump se recusar a reconhecer sua derrota eleitoral, os estudiosos do Congresso Thomas Mann e Norman Ornstein declararam que o partido havia se tornado "um forasteiro rebelde" que rejeitava "fatos, evidências e ciência" e não aceitava a legitimidade da oposição política.

Em 2019, uma pesquisa internacional de especialistas avaliou partidos do mundo todo em seu compromisso com os princípios democráticos básicos e os direitos das minorias. O Partido Republicano, afinal, não se parece em nada com os partidos de centro-direita de outros países ocidentais. Em vez disso, ele se assemelha a partidos autoritários como o Fidesz da Hungria ou o AKP da Turquia.

Manifestantes invadem prédio do Congresso americano em Washington - Win McNamee/Getty Images/AFP

Tais análises têm sido frequentemente criticadas como exageradas e alarmistas. Mesmo agora, com os republicanos expressando franca admiração pelo regime de partido único de Viktor Orbán, encontro pessoas que insistem que o Partido Republicano não é comparável ao Fidesz. (Por que não? Os republicanos têm manipulado as legislaturas estaduais para manter o controle, não importa o quanto eles percam no voto popular, o que vem diretamente da cartilha de Orbán.) No entanto, como apontou recentemente Edward Luce, do Financial Times, "em toda conjuntura nos últimos 20 anos os 'alarmistas' americanos tiveram razão".

E nos últimos dias recebemos ainda mais lembretes de como os republicanos se tornaram radicais. As audiências sobre o 6 de janeiro estabeleceram, em detalhes contundentes, que o ataque ao Capitólio fez parte de um esquema maior para derrubar a eleição, dirigido de cima. Uma Suprema Corte repleta de republicanos vem proferindo decisões abertamente partidárias sobre aborto e controle de armas. E poderá haver mais choques –fiquem de olho no que o tribunal provavelmente fará com a capacidade do governo de proteger o meio ambiente.

A questão que tem me incomodado –além da dúvida sobre se a democracia americana sobreviverá– é por quê. De onde vem esse extremismo?

Comparações com a ascensão do fascismo na Europa entre as guerras são inevitáveis, mas não tão úteis. Por um lado, por pior que fosse, Trump não era outro Hitler ou mesmo outro Mussolini. É verdade que republicanos como Marco Rubio costumam chamar os democratas –que são basicamente social-democratas padrão– de marxistas, e é tentador corresponder à sua hipérbole. A realidade, no entanto, é ruim o suficiente para não precisar de exageros.

E há outro problema nas comparações com a ascensão do fascismo. A extrema direita na Europa do entreguerras surgiu dos escombros de catástrofes nacionais: derrota na Primeira Guerra Mundial –ou, no caso da Itália, uma vitória que parecia derrota; hiperinflação; depressão.

Nada disso aconteceu aqui. Sim, tivemos uma grave crise financeira em 2008, seguida de uma lenta recuperação. Sim, temos visto divergências econômicas regionais, com algumas consequências feias –desemprego, decadência social, até suicídios e vícios– nas regiões abandonadas. Mas os Estados Unidos passaram por coisas muito piores no passado, sem ver um de seus principais partidos virar as costas à democracia.

Além disso, a virada republicana para o extremismo começou na década de 1990. Muitas pessoas, acredito, esqueceram a loucura política dos anos Clinton –a caça às bruxas e teorias da conspiração malucas (Hillary assassinou Vince Foster!), as tentativas de chantagear Bill Clinton a fazer concessões políticas bloqueando o governo e muito mais. E tudo isso aconteceu durante o que foi amplamente considerado como anos bons, com a maioria dos americanos acreditando que o país estava no caminho certo.

É um quebra-cabeça. Ultimamente, tenho passado muito tempo procurando precursores históricos –casos em que o radicalismo de direita surgiu mesmo diante da paz e da prosperidade. E acho que encontrei um: a ascensão da Ku Klux Klan na década de 1920.

É importante perceber que, embora essa organização tenha o nome do grupo pós-Guerra Civil, na verdade era um novo movimento –um movimento nacionalista branco com certeza, mas muito mais amplamente aceito e menos uma organização terrorista pura. E atingiu o auge de seu poder –controlou efetivamente vários estados– em meio à paz e ao crescimento econômico.

De que se tratava esse novo KKK? Estou lendo "The Second Coming of the KKK: The Ku Klux Klan of the 1920s and the American Political Tradition", de Linda Gordon, que pinta uma "política de ressentimento" impulsionada pela reação dos americanos brancos, rurais e de cidades pequenas contra uma nação em mudança. O KKK odiava os imigrantes e as "elites urbanas"; caracterizava-se pela "desconfiança da ciência" e "um anti-intelectualismo mais amplo". Parece conhecido?

Está bem, o Partido Republicano moderno não é tão ruim quanto o segundo KKK. Mas o extremismo republicano claramente extrai grande parte de sua energia das mesmas fontes.

E como o extremismo do Partido Republicano é alimentado pelo ressentimento contra as mesmas coisas que, a meu ver, realmente tornam os EUA grandes –nossa diversidade, nossa tolerância à diferença– não pode ser tratado com condescendência ou compromissos. Só pode ser derrotado.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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