Paul Krugman

Prêmio Nobel de Economia, colunista do jornal The New York Times.

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Paul Krugman
Descrição de chapéu Partido Republicano

Donald Trump está fraco, mas o Partido Republicano está mais

Integrantes da sigla divergem sobre o bilionário há anos, enquanto parte começa a apoiar Ron DeSantis

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Após o desempenho decepcionante de seu partido nas eleições de meio de mandato, as elites republicanas parecem ter decidido que Donald Trump é seu grande problema. O império de mídia dos Murdoch vem arrasando o ex-presidente. Muitos doadores e cabos eleitorais estão se unindo ao governador da Flórida, Ron DeSantis. Mas Trump, que deve anunciar sua campanha presidencial de 2024 nesta terça-feira (15), não vai ficar quieto.

Ele conseguirá a indicação, apesar das reservas da elite? Se não o fizer, um homem que nunca demonstrou lealdade ao seu partido ou, aliás, a ninguém além de si mesmo, sabotará o Partido Republicano por despeito? Eu não sei mais do que qualquer pessoa que acompanhe o noticiário.

Fotografia colorida mostra Donald Trump com punho erguido; ele é branco, quase laranja, e tem cabelo loiro curto; ele usa  um terno azul marinho e gravata vermelha
Então presidente dos EUA, Donald Trump, deixa a Casa Branca, em Washington, pouco mais de um mês de perder as eleições para Joe Biden - Andrew Caballero-Reynolds -12.dez.20/AFP

Em vez disso, vamos falar sobre como é notável que alguém como Trump tenha conseguido dominar um dos dois principais partidos políticos dos Estados Unidos e certamente mantém uma base substancial.

Não estou falando sobre Trump ter o que considero visões políticas repreensíveis, ou mesmo o fato de ele ter se envolvido em vários atos, incluindo a tentativa de derrubar uma eleição nacional, que podem ser razoavelmente descritos como sediciosos. Claramente, a maior parte do Partido Republicano concorda com tudo isso.

Estou falando, porém, sobre a percepção evidente de muitos republicanos de que Trump é um líder forte, quando na realidade ele é extraordinariamente fraco.

Começando pelo caráter pessoal –não é meu assunto favorito (sinto-me muito mais confortável falando sobre política), mas algo que claramente importa quando você vai escolher um comandante-chefe.

Não acho que seja romantizar o passado dizer que antigamente os políticos que buscavam ser presidentes tinham que parecer, bem, presidenciais. Ou seja, eles tinham que mostrar seriedade e dignidade; qualquer que fosse seu comportamento a portas fechadas, em público eles tinham que parecer maduros e autocontrolados.

Mas Trump, 76, parece alguém de 14 muito malcriado. Ele oscila, às vezes em frases consecutivas, entre gabar-se (que tipo de pessoa se descreve como um gênio estável?) e choramingar, entre pretensão e autopiedade.

Além do afeto pessoal, o que se destaca no mandato de Trump é sua fraqueza, sua incapacidade de fazer as coisas.

Na política interna, ele concorreu em 2016 como um tipo diferente de republicano, que romperia com a ortodoxia antigovernamental e de corte de impostos do partido. Uma vez na Casa Branca, entretanto, ele foi uma massa mole nas mãos de Mitch McConnell. Suas únicas grandes iniciativas de política doméstica foram a tentativa fracassada de revogar o Obamacare e um corte de impostos típico do Partido Republicano para corporações e ricos.

E suas promessas de investir em infraestrutura? Nada saiu delas: "É a Semana da Infraestrutura!" virou piada.

Na política externa, o norte-coreano Kim Jong-un fez de Trump um tolo com garantias vazias sobre a desnuclearização. Xi Jinping da China fez o mesmo sobre o comércio, fazendo com que Trump pausasse seus aumentos de tarifas em troca de uma promessa de comprar produtos dos EUA que se mostrou totalmente vazia.

Em suma, o desempenho de Trump no cargo foi fraco –especialmente em comparação com o de seu sucessor.

O presidente Biden não alcançou tudo o que queria em política interna, mas conseguiu um grande projeto de infraestrutura e, na Lei de Redução da Inflação, gastos sem precedentes para combater as mudanças climáticas e um importante fortalecimento da assistência médica. E o comparecimento inesperadamente forte dos democratas nas eleições intermediárias provavelmente garante que esses êxitos políticos perdurem.

No exterior, Biden montou e manteve uma coalizão em apoio à Ucrânia que permitiu à nação invadida resistir ao ataque da Rússia –um enorme sucesso de política externa que lembra o papel dos Estados Unidos antes de Pearl Harbor como o "arsenal da democracia". E a política de Biden para a China, centrada em restrições à exportação que visam minar as ambições tecnológicas chinesas, é muito mais agressiva do que qualquer coisa feita por Trump, mesmo que a de Biden não tenha recebido tanta atenção da mídia.

No entanto, Biden é frequentemente retratado como fraco e confuso, enquanto Trump era visto por 90% dos republicanos como um "líder forte" no dia em que deixou o cargo, de má vontade. Como isso é possível?

O culto à personalidade de Trump pode ter sido possibilitado em parte por forças que vão além da política. Afinal, costumávamos esperar um comportamento digno dos capitães da indústria e dos políticos. Mas hoje em dia, talvez porque a cultura das celebridades contamine tudo, os líderes empresariais são levados a sério mesmo quando parecem incapazes de evitar exibições extravagantes de ego e insegurança. (Tosse. Elon Musk. Tosse.)

Além disso, as elites republicanas que tentam se distanciar de Trump passaram anos afofando a imagem dele. Até poucos dias atrás, a Fox News, principal fonte de informação política para grande parte da base republicana, deu a Trump o tipo de cobertura hagiográfica que você esperaria da mídia estatal em uma ditadura.

E os políticos republicanos, muitos dos quais sabiam bem como era Trump, passaram anos elogiando-o numa linguagem que lembra os membros do Politburo elogiando o presidente do partido.

Agora, essas mesmas elites querem tirar Trump de cena. Mas se elas podem negar sua indicação provavelmente não conseguirão evitar o alto preço a pagar por sua covardia passada.

Tradução de Luiz Roberto M. Gonçalves

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