Eliane Trindade

Editora do prêmio Empreendedor Social, editou a Revista da Folha. É autora de “As Meninas da Esquina”.

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Eliane Trindade

Cruzada para banir plástico em Bali faz fama de ativista teen

Indonésia de 18 anos co-preside cúpula do Fórum Econômico Mundial e divide holofotes com Greta Thunberg em NY

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Nova York

Aos 18 anos, ela lidera uma organização chamada Youthtopia, junção de juventude e utopia em inglês.

Aos 12 anos, Melati Wijsen fundava com a irmã Isabel, então com 10, sua primeira ONG em Bali, onde nasceram: a Bye, Bye Plastic Bag (Tchau, Tchau Sacolas Plásticas).

Filha de mãe holandesa e pai indonésio, Melati é figura emergente no movimento global de ativismo juvenil que tem na norueguesa Greta Thunberg, 16, sua face mais notória.

Com seu jeito ao mesmo tempo suave e firme, a garota da Indonésia co-presidiu a Conferência de Desenvolvimento Sustentável do Fórum Econômico Mundial, realizado em Nova York, em 22 e 23 de setembro.

Dividiu a responsa com Jesper Brodin, CEO do Grupo Ingka, dono da Ikea; Sebastián Piñera, presidente do Chile; e Mark Rutte, primeiro ministro da Holanda.

Ocupou um lugar de destaque no topo do mundo econômico e político sem titubear. “São encontros de alto nível onde espero assegurar que a voz das novas gerações esteja sempre presente”, disse Melati, em entrevista à Folha, após dividir uma plenária com o dono da Ikea.  

Ela enfatiza a importância estratégica do ativismo juvenil para barrar os efeitos das mudanças climáticas.

“Nosso papel é manter alta a pressão. Não estamos só demandando ações, queremos vê-las implementadas. Tudo isso é para que governos não se esqueçam, corporações não se esqueçam, que não vamos parar até que as mudanças aconteçam.”

E resumiu o sentimento de sua geração ao tomar as ruas em protestos em várias latitudes nos últimos meses: “Nós somos imparáveis”. 

Declaração seguida de aplausos insistentes de uma plateia de mil líderes de governo, empresas e sociedade civil reunida em paralelo à Assembleia Geral das Nações Unidas para debater soluções para desafios em torno das mudanças climáticas, inclusão social e tecnologia.

Naquele mesmo dia, a poucos quarteirões, Greta passava um sabão em líderes mundiais na sede das Nações Unidas, quando fez contundente apelo que reverberou mundo afora.

“Como vocês se atrevem”, indignou-se a adolescente diante de promessas não cumpridas, enquanto o planeta caminha para a destruição.

As duas são “change makers” (agentes de transformação, em tradução livre), gente disposta a colocar a mão na massa para mudar realidades.

ESCOLA VERDE

Melati nasceu como ativista na Green School, escola internacional de Bali, verde até no nome, toda em bambu, sem divisórias entre as classes e onde os sacos de lixo são de tecido.

“Aprendi ali a ser líder”, diz a estudante que se formou no ensino médio e não pretende cursar faculdade.

“Criei quase uma universidade ao experimentar o mundo real, que me dá mais conhecimento do que qualquer curso formal me daria neste momento da minha vida”, explica.

Melati decidiu se dedicar com exclusividade às duas organizações que fundou e planeja criar uma terceira, um hub para conectar jovens como ela em todo o planeta. 

“Vamos aprender uns com os outros as melhores práticas e partilhar recursos, conhecimento, ferramentas e habilidades para entender como promover transformações em nossas comunidades.”

Conexão que já começou com as filmagens do documentário “Bigger than Us” (Maior que Nós, em tradução livre), que a trouxe ao Brasil em agosto.

Produzido pela atriz francesa Marion Cottillard, o filme mostra a partir da experiência de Melati em Bali a jornada de outros empreendedores sociais com o mesmo perfil ao redor do mundo.

“É uma forma de entender as nossas lutas e saber que não estamos sós”, diz a protagonista. “Os adultos e os governos não entendem o que está acontecendo. Vejo jovens se levantando sem espera atenção da mídia nem pedindo permissão a governos para agir.”

É o caso do carioca Rene Silva, 24, fundador do jornal Voz da Comunidade, que foi cicerone de Melati, quando a trupe esteve no Complexo do Alemão. “Não foi uma visita turística”, avisa a indonésia. “Aprendi sobre violência do Estado, sobre ativismo pela floresta tropical.”

Era o momento mais intenso das queimadas na Amazônia e Melati fez um desabafo em sua página no Instagram: “Hoje, caminhando pelas favelas do Rio, meus passos pesaram. Injustiça social na vida cotidiana. Para as pessoas. Para a floresta. Estamos em guerra contra nós mesmos.”

Do Brasil, ela foi para Uganda, em um périplo que incluiu também Grécia, Malawi e Estados Unidos.

AULA DE ATIVISMO

Uma história de ativismo que começou após uma aula sobre Nelson Mandela, Mahatma Gandhi e Lady Di. Melati e a irmã voltaram da escola decididas a se tornarem “pessoas relevantes para a humanidade”. “E não precisamos ser adultas para isso”, concluíram.

Sentadas no sofá naquela noite, conta Melati, as duas elegeram como causa banir o plástico que se acumulava nas praias na paradisíaca Bali.

Qual seria um objetivo realista para ser alcançado por duas crianças? Decidiram declarar as sacolas plásticas como inimigas a serem vencidas na luta para salvar o planeta e as futuras gerações.

Criaram brigadas com colegas de escolas internacionais e locais para recolher o lixo das praias, iniciaram campanhas de conscientização com consumidores e empresários para banir o uso de sacolas, canudos e embalagens de isopor. Um volume 630 m³ de lixo por dia, correspondente a um prédio de 14 andares.

Para sensibilizar as autoridades, se mobilizaram para conseguir 100 mil assinaturas numa petição para tornar Bali livre do lixo plástico. Para chegar lá coletaram adesões entre os 16 milhões de turistas que transitam por ano no aeroporto internacional da ilha.

“Bem-vindos a Bali, alguma sacola plástica a declarar?”, indagavam os jovens ao saudar os passageiros no desembarque com caneta, papel e camiseta da Bye, Bye Plastic Bags.

O passo seguinte era serem recebidas pelo governador da ilha. Inspiradas por Gandhi, as irmãs Wijsen decidiram fazer greve de fome, que durou 24 horas. O fato chamou a atenção e elas conseguiram a audiência. Pouco depois, o governador assinou um termo de compromisso para proibir sacos plásticos e canudos em Bali até o final e 2018.

Conquistas que as levaram a ter a chancela da ONU, quando a ONG balinesa passou a surfar na onda mundial de proteção aos oceanos. A dupla foi incluída na lista das 25 teens mais influentes do mundo da revista Time no ano passado.

“Crianças têm a energia para ser a mudança que o mundo precisa. Somos 25% da população mas 100% do futuro”, diz Isabel, ao encerrar o Ted Talk, em que as irmãs relatam suas estratégias para sair vitoriosas da guerra das sacolas.

Melati não teve oportunidade de se encontrar com Greta em Nova York, onde cada uma chamava atenção em sua trincheira na mesma luta ambiental. 

A indonésia se diz inspirada pela norueguesa dois anos mais nova. “Quando Greta começou esse inacreditável movimento em escala global, as pessoas começaram a conversar à mesa do jantar sobre o que significa estar em meio à crise climática e o que podem fazer diferente.”

E foi assim que ela e a irmã criaram a maior ONG liderada por jovens na ilha e na Indonésia, presente em 15 países. “Outros jovens nos veem nas nossas páginas nas mídias sociais e dizem: nós queremos fazer o mesmo.”

Melati diz que ao longo de seis anos foram aprendendo a lidar com governos e a engajar mais jovens.

“Nós não estamos falando, nós estamos fazendo. Uma das coisas mais poderosas é mostrar como se faz”, diz. “As autoridades parecem não entender o que acontece no mundo real. Precisam sentar com a comunidade e ouvir. Precisam entender o que significa um mundo sustentável.”

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