Reinaldo Azevedo

Jornalista, autor de “Máximas de um País Mínimo”

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Reinaldo Azevedo

Em 7 meses, Lula vai da ingovernabilidade à possível decolagem

Lembram-se da frase 'É a economia, estúpido!'? Então... É a política!

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Quando se divulgaram os dados do primeiro turno das eleições do ano passado, que anunciavam a composição do Congresso, não conheço uma só alma, e eu mesmo estava entre elas, que não tenha se deixado tomar pelo pessimismo. Dado que Lula era o favorito no segundo turno, antevia-se o cenário de um presidente "progressista" —para empregar um termo mais abrangente— com o Congresso mais reacionário da história em tempos democráticos. E efetivamente o é. O temor era óbvio: a paralisia ou a ingovernabilidade. E, no entanto, o país se move.

"É a economia, estúpido!", sentenciou em 1992 James Carville, assessor do então candidato democrata à Presidência dos EUA, Bill Clinton, ao definir a frente principal de combate ao adversário republicano, George Bush, o pai, candidato à reeleição. É uma dessas divisas que, parafraseando o filósofo bigodudo, já "nascem póstumas". Ela ganhou tal força que praticamente amarrou a ciência política a uma espécie de determinismo: se a economia vai bem, o governismo vence eleições; se vai mal, perde.

O presidente Lula (PT) em café da manhã com correspondentes internacionais no Palácio do Planalto, em Brasília
O presidente Lula (PT) em café da manhã com correspondentes internacionais no Palácio do Planalto, em Brasília - Ueslei Marcelino - 2.ago.23/Reuters

Pois é... Com alguma frequência, parece-me que se deve considerar: "É a política, estúpido!". É claro que uma economia esfrangalhada não ajuda ninguém a vencer uma disputa ou a governar um país, mas ignorar o peso que têm as escolhas políticas nas disputas pelo poder será sempre um erro. Foi a fricção puramente ideológica, em tempos de redes sociais e num ambiente devastado pela Lava Jato, que levou Jair —um falso Messias e um verdadeiro Bolsonaro— à Presidência. E foram suas decisões nessa área, mesmo beneficiado pelas facilidades inconstitucionais que conseguiu arrancar do Congresso e do Supremo na boca da urna, que acabaram decidindo a sua derrota, ainda que por margem estreita.

Tenho andado —e não estou só— numa certa contramão dos que asseguram a primazia da economia sobre a política quando se trata de analisar, com algum grau de antevisão, a sorte do governo Lula. Lá onde se previu, por exemplo, o compromisso com a catástrofe, ainda em novembro do ano passado, quando se articulava a PEC da Transição, eu vi uma solução. E é evidente que a percepção, quase solitária no meu meio, deixou-me um tanto apreensivo. Sabe como é... Sempre devemos tomar cuidado para não ficar trocando ideias com espectros... O resultado não costuma ser muito bom, como constatou aquele príncipe da Dinamarca...

Mas acho que eu estava certo. A PEC era um primeiro ensaio para constituir o núcleo da futura base de apoio, cuja ampliação está em processo. Com ela, foi possível saldar as contas deixadas no vermelho pelo golpista fujão e hoje rei do Pix —ainda vestirá roupa de couro, de chicotinho na mão, como Tatá Werneck em "Terra e Paixão", mas sem talento e graça—; reestruturar os programas sociais destruídos pela razia fascistoide e dar o passo inicial para pôr fim ao teto de gastos e caminhar para o novo arcabouço fiscal.

Os catastrofistas do, lá vai um neologismo, "economismo" —evito "economicismo" porque este supõe "economicidade"...— estão sendo, felizmente, vencidos pelos fatos. Não vai aqui disposição para a polêmica, embora dela não fuja se preciso, mas o fato é que aqueles bravos cobravam de Lula um corte de gastos, como pressuposto de qualquer ajuste, que jamais passaria pelo crivo de um Congresso poderoso como jamais e, em princípio, hostil.

O marco fiscal depende agora da chancela final da Câmara, e está em curso a reforma tributária. Há pouco mais de quatro meses, a ata do Copom ameaçava com uma elevação da já pornográfica taxa de juros; nesta quarta, Roberto Campos Neto compôs a maioria em favor de corte de 0,5 ponto da Selic. Pequeno, sim, mas parece ser o fim da catatonia reacionária. A Economist aponta que os investidores internacionais veem com bons olhos o Brasil e registra a habilidade de Fernando Haddad, ministro da Fazenda. E pergunta sobre o país: "Decolagem?"

Pode-se sustentar que tudo o que tem acontecido de positivo se dá apesar de Lula. É um jeito de ver as coisas. E não é o meu. Enquanto isso, a extrema direita produz indignidades na CPI do MST e na CPMI do golpe, tem de prestar contas à Polícia e brada: "Pix, manda Pix!". É a política, estúpido. O país se move.

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