Renata Mendonça

Jornalista, comenta na Globo e é cofundadora do Dibradoras, canal sobre mulheres no esporte.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Renata Mendonça
Descrição de chapéu machismo

Mulheres conquistam espaço no futebol porque merecem, não porque são mulheres

Fifa escolheu árbitra Edina Alves e assistente Neuza Back para Mundial pela competência delas

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Ainda sem entrar em campo, o Brasil já fez história no Mundial de Clubes da Fifa de 2020 (que começa em 2021, mais precisamente na quinta-feira (4). A presença da árbitra Edina Alves Batista e da assistente Neuza Back no quadro de arbitragem do torneio já representam um feito inédito para as mulheres no futebol. É a primeira vez que elas estarão representadas dentro das quatro linhas em um Mundial masculino organizado pela Fifa.

Aliás, se considerarmos o histórico todo do torneio, incluindo também as edições em que ele não teve a chancela da Fifa, são mais de 60 anos até que finalmente uma mulher (no caso, duas) tivesse a oportunidade de participar dele na arbitragem. E depois de todo esse tempo, Edina e Neuza ainda carregam nas costas o peso de saber que qualquer erro delas pode custar a chance da próxima candidata ao feito.

Edina Alves durante semifinal do Mundial feminino, em 2019, entre Inglaterra e Estados Unidos
Edina Alves durante semifinal do Mundial feminino, em 2019, entre Inglaterra e Estados Unidos - Denis Balibouse - 2.jul.2019/Reuters

Como disse a própria árbitra à Folha: "Se você vai mal, cai tudo por terra. Todo mundo vai dizer 'mulher não tem capacidade'".

Desde a década de 1960, algumas dezenas de árbitros já apitaram o Mundial, todos homens. É possível e até provável que alguns deles tenham cometido erros importantes. Mas, daí, ninguém tirou a conclusão que "homens não são capazes de apitar". Se uma mulher erra, todas pagam o preço.

A história de Edina está tendo um final feliz e, aos 41 anos, ela está prestes a realizar mais um sonho, apitando uma competição importante da Fifa. Mas até hoje deve ouvir de colegas: "Está conseguindo isso porque é mulher".

Essa frase está na moda. E quanto mais mulheres ocupam espaços no futebol, um meio ainda tão fechado para elas, o primeiro comentário dos homens é sempre esse. Não passa na cabeça deles que, se a mulher em questão fosse um homem, ela provavelmente já teria conseguido esse espaço há muito mais tempo. Afinal, assim eram todos os que vieram antes dela.

Também costumam dizer: "não tem que ser mulher ou homem, tem que ser competente". Fico impressionada que esse é o tipo de comentário que só aparece quando a pessoa contratada (ou, no caso, escalada para apitar um Mundial) é mulher, e/ou negro, e/ou gay. Quando um homem branco heterossexual é anunciado em qualquer cargo, ninguém diz: "olha, mas não pode ser só porque é homem, branco, heterossexual, tá? Tem que ser competente!".

E ser competente em qualquer carreira não é (ou deveria ser) premissa básica para uma pessoa conseguir qualquer cargo? A Fifa não escalou Edina e Neuza porque elas são mulheres. A escolha foi justamente pela competência, pela precisão nos lances e pela firmeza nos jogos.

A mesma lógica acontece para criticar as narradoras e comentaristas que começam a conquistar um espaço nas transmissões de futebol. São centenas, milhares de homens exercendo essa função há décadas, e pouquíssimas mulheres que conseguiram furar essa bolha nos últimos tempos.

Vale aqui repetir o óbvio: ser exceção é muito mais difícil do que ser a regra. Para ser mulher e estar nesse espaço, a cobrança é dobrada, não dá pra disfarçar competência.

Mas é fato que o esforço de Edina, Neuza e das mulheres que desbravam esse universo ainda tão hostil do futebol em todas as áreas está dando resultado.

É só ver cenas como as da pequena Helena, de quatro anos, narrando um gol do Internacional simulando o lance no campinho de brinquedo. Ela joga futebol e brinca até de ser árbitra, como Edina. Se vai narrar, jogar ou apitar no futuro, ainda é cedo pra saber. Mas, vendo mulheres atuando em todas essas áreas hoje em dia, Helena já sabe que pode ser o que quiser.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.