Quando, na semana passada, o presidente do Brasil republicou um vídeo antigo em que comparava a Comissão da Verdade a prostitutas contratadas para escrever a biografia de Dilma Rousseff, que seria a cafetina, fiquei feliz. A política pode ser difícil de entender, mas as metáforas com prostitutas são sempre eficazes para elucidar o cidadão menos atento. Quem me dera que, na escola, os professores me tivessem explicado as matérias mais difíceis com recurso a prostitutas.
Eram sempre meninos que tinham determinado número de maçãs, e era preciso subtrair outro número de maçãs, ou trens que partiam de localidades diferentes à mesma hora para ver qual chegava primeiro a outro lugar.
Eu teria feito essas contas com outro entusiasmo se soubesse que os trens transportavam prostitutas, ou que as maçãs pertenciam a uma cafetina.
Uma pesquisa rápida revelou-me que a alusão a prostitutas tem sido uma prática frequente no debate político brasileiro.
Em 2016, criticando uma reportagem da revista Exame, Bolsonaro escreveu no Twitter: “Até as prostitutas têm ética em seu local de trabalho”, observação que parece contrariar o comentário repetido agora. Se as prostitutas têm ética, em princípio farão uma biografia séria e rigorosa da cafetina.
Não deixa de ser curioso que um político profira uma frase começada por: “Até as prostitutas têm ética no seu local de trabalho”. É muito improvável que, em toda a história da língua portuguesa, uma prostituta alguma vez tenha desabafado: “Que vergonha, Soraia. Você fez um péssimo serviço. Até políticos têm ética no seu local de trabalho”.
Uma coisa é uma hipérbole, outra é absurdo infrene. Faz lembrar o célebre filme “Uma Linda Mulher”, com Richard Gere e Julia Roberts. Roberts faz uma prostituta e Gere desempenha o papel de um empresário que ganha a vida a fechar empresas e a despedir trabalhadores. Ou seja, é a história de duas pessoas —uma exerce uma atividade profissional moralmente duvidosa; a outra é uma prostituta.
A metáfora de Bolsonaro não é má, mas está mal aplicada à Comissão da Verdade e à Dilma. Promover a ministro um juiz cuja ação nos beneficiou, sim, é uma coisa parecida com o prêmio que a cafetina dá às prostitutas que lhe escrevem a biografia
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