Rodrigo Zeidan

Professor da New York University Shanghai (China) e da Fundação Dom Cabral. É doutor em economia pela UFRJ.

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Descrição de chapéu juros indústria

BNDES tem espaço no desenvolvimento, mas não estamos nos anos 1970

Deixem a TLP como está, já vimos onde isso dá; o Brasil morre no final

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"Me engane uma vez, e a culpa é sua. Me engane a segunda, e a culpa é minha." Essa é a potencial situação do Brasil com a ideia do presidente do BNDES de propor um projeto de lei para mudar a TLP (Taxa de Longo Prazo), que norteia os empréstimos do banco.

Baixar os juros à força só faz sentido se não há demanda pelos empréstimos do banco ou o BNDES não tem capacidade de captar mais recursos, o que está longe de ser verdade. O banco continua a funcionar como sempre o fez, recebendo pedidos e aprovando-os com cuidado. Além de colocar dinheiro diretamente no bolso dos empresários nacionais, o que o crédito subsidiado faria?

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Sede do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), na região central do Rio - Lucas Tavares - 23.out.19/Folhapress

O BNDES deveria ter sido usado mais fortemente durante o auge da pandemia, para fazer a ponte entre o período de distanciamento social e a retomada da atividade econômica. O governo de então meio que jogou o BNDES para escanteio. O banco tem espaço no desenvolvimento brasileiro, mas não estamos na década de 1970. Tentar reindustrializar o Brasil, uma das economias mais fechadas do mundo, com crédito barato vai resultar somente em transferência de renda dos pobres para ricos. O papel do BNDES é aumentar o crédito de longo prazo sem tentativas megalomaníacas de criar campeãs nacionais.

O BNDES tem fontes fixas de financiamento, como o Fundo de Amparo ao Trabalhador (ao final de 2021, o saldo de recursos do FAT no Sistema BNDES era de R$ 347,3 bilhões). Antes, o banco usava essas e outras fontes baratas, inclusive com aporte do Tesouro, para emprestar muito barato, inclusive bem abaixo da Selic. Com a reforma da TJLP para TLP, o banco passa a emprestar de acordo com as taxas pagas pelos títulos públicos de longo prazo, como o Tesouro IPCA.

Recentemente, o diretor financeiro do BNDES, Alexandre Abreu, argumentou que o fato de a TLP estar maior que a Selic seria um problema. Mas isso não tem nem pé nem cabeça. Para uma empresa tomadora de empréstimo, o que importa é se ela consegue pegar dinheiro do BNDES abaixo do que ela pegaria no mercado, não se a taxa é maior ou menor que a Selic.

A taxa de juros no Brasil continua absurdamente alta (as razões para isso expliquei em artigo científico premiado pela Revista Brasileira de Finanças).A demanda por crédito do BNDES continua alta. O que acontece é simples: para o banco, é muito mais confortável emprestar com juros baixos, ainda mais se o dinheiro vier subsidiado indiretamente pelo governo. O balanço do banco fica bem, assim como as operações ficam mais fáceis: quem não quer distribuir benesses com demanda infinita? A indústria adoraria a volta dos juros absurdamente subsidiados.

Assim como nos governos anteriores do PT, é difícil frear o interesse dos empresários por dinheiro público barato combinado ao viés desenvolvimentista do partido. O problema do BNDES nunca foi corrupção. O banco é deveras criterioso juridicamente. O problema é o uso político de recursos da sociedade para setores industriais que não querem competição internacional. E o governo, com esse papo de reindustrialização, tende a mais uma vez entregar dinheiro barato sem ver resultados.

Qual o próximo passo? A volta da Lei da Informática? Mais um PND? É bem difícil que a nova gestão do BNDES saia da década de 1970, mas não é impossível. Deixem a TLP como está. Não falta demanda pelo dinheiro do BNDES. Não convém facilitar. Já vimos onde isso dá. O Brasil morre no final.

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