Rômulo Saraiva

Advogado especialista em Previdência Social, é professor, autor do livro Fraude nos Fundos de Pensão e mestre em Direito Previdenciário pela PUC-SP.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Rômulo Saraiva
Descrição de chapéu inss TSE

INSS tenta se esquivar, mas Xandão garante os atrasados

Autarquia usa o artifício de 'se colar, colou'

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Inconformado por ter perdido a questão da revisão da vida toda, o Instituto Nacional do Seguro Social fez vários requerimentos ao Supremo Tribunal Federal tentando reverter a situação, sendo um deles especialmente inusitado. Embora os aposentados possam habitualmente ganhar diferenças financeiras até os últimos cinco anos ao ajuizar demanda na Justiça, nesta revisão o INSS quer se eximir. Via de regra as revisões de benefícios previdenciários garantem esse direito como algo sagrado. Não se sabe o porquê, mas neste caso o instituto inova ao querer se livrar do encargo legal.

O curioso é que no recurso usado pelo INSS, que provocou essa celeuma na Suprema Corte, a limitação dos atrasados sequer havia sido abordada anteriormente. O assunto surgiu tardiamente, quando o próprio Supremo coleciona julgados que determinam que pedidos retardados não devem ser aceitos por ser "incabível a inovação de argumentos nessa fase processual" (RE 596701 ED, Relator Edson Fachin, Tribunal Pleno, julgado em 17/02/2021). E o pior: além de atrasado, o pedido foi feito sem amparo legal.

Mesmo assim, a autarquia se faz de rogada. Usa do artifício de "se colar, colou". Pede expressamente o calote em todo o país quando sustenta não ser possível "a revisão e pagamento de parcelas de benefícios quitadas à luz e ao tempo do entendimento então vigente, vedando-se por consequência o pagamento de diferenças anteriores a 13.04.2023 (data da publicação do acórdão do Tema 1.102/STF)".

Paradoxalmente, no mesmo recurso, o INSS invoca a lei federal 8.213/91 para que "as revisões com base na tese adotada no Tema 1.102" fiquem sujeitas aos prazos de prescrição. Ocorre que o parágrafo único do art. 103 da citada lei determina o pagamento de cinco anos para toda e qualquer ação que possa "haver prestações vencidas ou quaisquer restituições ou diferenças devidas pela Previdência Social".

Diante do recurso, Alexandre de Moraes –conhecido como Xandão– foi o primeiro ministro a enfrentar o assunto. Ainda faltam os demais. Apesar de o voto de Moraes ter sido meio truncado, ele garantiu os atrasados aos aposentados, mas fez restrições apenas à correção de benefícios que já tivessem sido extintos ou julgados de forma definitiva e irrecorrível na Justiça.

Moraes defendeu a exclusão da revisão da vida toda nas seguintes hipóteses: "a) a revisão de benefícios previdenciários já extintos; b) a revisão retroativa de parcelas de benefícios já pagas e quitadas por força de decisão já transitada em julgado; aplicam-se às próximas parcelas a cláusula rebus sic stantibus, para que sejam corrigidas observando-se a tese fixada neste leading case, a partir da data do julgamento do mérito (1º/12/2022)".

O curioso é que, embora o INSS tente se esquivar de pagar aos credores parte dos retroativos, nas agências previdenciárias ele mesmo paga os atrasados sem embaraço. O próprio ministro Alexandre de Moraes havia homologado em dezembro de 2020 acordo entre o governo e o INSS estabelecendo que "os pagamentos em atraso decorrente do deferimento do benefício incidirão juros moratórios e correção monetária", sem ter feito qualquer limitação de prazo.

Pelo fato de os benefícios previdenciários serem de trato sucessivo, isto é, todo mês vence uma parcela que precisa ser paga ou corrigida, este assunto de pagar os últimos cinco anos é praticamente um assunto incontroverso e superado, por mais que o INSS queira inovar. Desde 1932, o decreto n. 20.910 não deixa dúvida ao regular que as dívidas da União devem ser pagas observando o prazo de cinco anos.

Em diversas revisões previdenciárias o STF também garantiu esse direito sem criar qualquer polêmica sobre os últimos cinco anos, a exemplo da revisão do Índice de Reajuste do Salário Mínimo-IRSM (art. 3º, § 1º, da Lei 10.999/2004), revisão do teto (RE 564.354) e a revisão do art. 29 (art. 6º, § 2º, II, Resolução 268/2013).

Portanto, a investida de o INSS em querer se eximir do pagamento retroativo de cinco anos é ilegal e vai de encontro a dezenas de julgados da própria Corte. Se perante ministros com notório saber jurídico a autarquia apresenta esse tipo de postura, defendendo algo contrário ao previsto na lei, imagina as arbitrariedades e as ilegalidades as quais o trabalhador —muitas vezes sem conhecer a área, analfabeto e vulnerável social— é submetido no atendimento das agências.

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.