Ruy Castro

Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues, é membro da Academia Brasileira de Letras.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Ruy Castro

Glauber sabia de seu carisma

Quando morreu, há 40 anos, todos os seus desafetos fizeram instantaneamente as pazes com ele

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Incrível, Glauber Rocha morreu há 40 anos. O dia, 22 de agosto de 1981, aqui no Rio. Tinha 43 anos. Pouco antes, andava pela Europa com discursos desencontrados, como se carregasse, ao mesmo tempo, a cruz do beato Sebastião e a máuser de Antonio das Mortes, suas criações em “Deus e o Diabo na Terra do Sol” (1964). Mas não parecia daqueles que morriam.

Nos anos 60, sua presença era impressionante. Nas sessões de sábado à meia-noite no Paissandu, apinhadas pelo pessoal do Cinema Novo e por cinéfilos e estudantes, a aparição de Glauber no Oklahoma, o bar ao lado do cinema, era quase tão importante quanto o filme a que se ia assistir. Sabia-se que ele não tardaria pelos comentários de seus colegas nas mesas da calçada —Cacá Diegues, Leon Hirszman, Gustavo Dahl, Mauricio Gomes Leite. Dali a pouco, ouvia-se sua voz à distância, pontificando para alguém sobre Rossellini, Ford ou Buñuel, alguns de seus heróis. Glauber chegava e as mesas e cadeiras se rearrumavam por conta própria para acomodá-lo. Ele sabia de seu carisma.

Em 1968, Glauber era também assíduo à Redação da revista Diners, dirigida por Paulo Francis. Na salinha de Francis, ridiculamente apertada, juntavam-se às vezes a velha e a nova esquerda —Octavio Malta, Fernando Gasparian, Flavio Rangel— e todos paravam para escutar Glauber. O pau quebrava lá embaixo, na esquina de Ouvidor com Rio Branco, entre os estudantes e a polícia, e eles faziam tsk, tsk, já temendo o AI-5 que viria.

“Terra em Transe“ (1967) e “O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro” (1969), outros filmes de Glauber, são hoje vistos como clássicos, mas, na época, provocavam arranca-rabos até entre seus fãs. No fundo, não se discutiam os filmes, mas Glauber.

O horroroso Brasil dos anos 70 separou muitos amigos, e Glauber foi meio que desterrado por sua turma. Ao morrer, todos fizeram instantaneamente as pazes com ele.

Primeiros livros de Glauber, DVDs e artigos sobre seus filmes e LP original da trilha sonora de 'Deus e o Diabo na Terra do Sol'
Primeiros livros de Glauber, DVDs e artigos sobre seus filmes e LP original da trilha sonora de 'Deus e o Diabo na Terra do Sol' - Heloisa Seixas

LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar cinco acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul abaixo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.