Ruy Castro

Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues, é membro da Academia Brasileira de Letras.

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Descrição de chapéu
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O combo gordífero

Segundo a UFMG, o feijão está sendo derrotado por cheeseburger, Coca-Cola e batata frita

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Em "Os Reis do Ié-Ié-Ié", o filme que revelou os Beatles para o mundo em 1964, o diretor Richard Lester intercalou as louquíssimas primeiras sequências, em que o grupo foge das fãs, com takes de um homem tentando abrir uma caixinha de leite comprada numa máquina de rua. O homem é o ator Norman Rossington, veterano do cinema inglês. Na época, não entendíamos por que ele entrava e saía de cena tentando estraçalhar com os dentes uma caixinha, fazendo uma lambança com a embalagem e o líquido. Era uma crítica aos novos tempos. As pessoas agora comiam no meio da rua.

Prato de louça branca com arroz, feijão, farofa, picadinho e ovo frito
Arroz e feijão com picadinho, farofa, pastel e ovo frito - Rogério Canella/Folhapress

No Brasil não tínhamos esse hábito, exceto talvez por um sorvete ou picolé. Nem havia muita coisa pronta que se pudesse comer na rua. Mastigávamos de pé o misto quente do Bob’s, mas encostados ao balcão, assim como o prato de angu do Gomes na praça 15, ao lado da carrocinha. Não se saía pela calçada andando e enchendo o bucho. Veja bem, esta não é uma crítica, já que nós, os garotos dos anos 60, aqui no Rio, talvez tenhamos sido os primeiros a fazer isto, ao levar para comer na areia o cachorro-quente comprado no trailer do Geneal estacionado em frente à praia.

Não se troca impunemente o que se come com garfo e faca, numa mesa com toalha xadrez, por algo que escorre entre os dedos enquanto atravessamos a rua. A primeira consequência é que ficamos menos exigentes com o que comemos. A segunda é que passamos a comer errado.

Segundo pesquisa recente da UFMG, o feijão deixará de ser em 2025 o prato forte do brasileiro, derrotado pelo combo gordífero de cheeseburger, Coca-Cola e batata frita. O que nos tornará um país de obesos ---algo, aliás, já visível a céu aberto, sem necessidade de balanças ou pesquisas.

A volta do feijão exigiria uma reeducação em massa da população. Como é impossível comê-lo em movimento, no metrô, no estádio ou no show de rock, ele está sendo abandonado.

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