Samuel Pessôa

Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e da Julius Baer Family Office (JBFO). É doutor em economia pela USP.

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Samuel Pessôa
Descrição de chapéu inflação juros

Uma semana triste para a profissão de economista

Escrevi na quinta sobre Pastore; hoje, quero lembrar Mauro Boianovsky

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Na semana passada, a profissão perdeu Affonso Celso Pastore e Mauro Boianovsky. Lembrei Pastore em texto publicado na quarta-feira (21). Em outubro de 2021, escrevi sobre seu último livro.

Hoje, quero lembrar Mauro. Professor da UnB, foi pesquisador da área de história do pensamento econômico. Teve uma produção extensa de elevadíssima qualidade. Era dos pesquisadores mais respeitados internacionalmente em sua área.

Mauro, que tratou de temas monetários em boa parte da sua carreira, mudou o foco nos últimos 15 anos para a história do pensamento econômico do desenvolvimento e subdesenvolvimento. Como que reconhecendo que, com o Plano Real, a inflação perdeu a importância e por aqui o foco passou a ser o tema do desenvolvimento.

O economista Mauro Boianovsky, morto na quarta-feira (21) aos 64 anos - Isa Lima/UnB Agência

Dois artigos de Mauro me marcaram. Seu texto "Uma visão dos trópicos: Celso Furtado e a teoria do desenvolvimento econômico na década de 1950", publicado na History of Political Economy em 2010, é das melhores leituras que conheço da obra de nosso mais importante economista.

Organiza a construção de Furtado em quatro pilares. O primeiro é a ideia de que desenvolvimento econômico é um fenômeno histórico. As condições específicas de tecnologia e escala da produção condicionam as escolhas e as possibilidades das sociedades em diferentes momentos.

O segundo pilar é o comércio internacional. Para o Brasil, há claramente dois momentos. No primeiro, até 1930, o crescimento liderado pela exportação de commodities, principalmente café, que, com o trabalho assalariado, estabeleceu o início da construção de um mercado doméstico de bens de consumo.

No segundo momento, após a Grande Depressão de 1930, há a internalização, segundo Furtado, da indústria, com a estratégia de substituição de importação.

A capacidade de importar —difícil obter divisas para financiar a importação de bens de capital— constrange o crescimento.

O terceiro pilar é a crença furtadeana no crescimento liderado pela acumulação de capital. O subemprego gerava a mão de obra necessária a ocupar os novos postos de trabalho que eram gerados pelo investimento.

A ociosidade do trabalho, o subemprego, era o quarto pilar da construção furtadeana, segundo Mauro. Ele documenta como, no fim da década de 1960, Furtado ficou bem mais pessimista com nossas possibilidades.

A máquina de crescimento movida a investimento com ocupação do subemprego engasga. Nessa visão, os elevados padrões de consumo de nossas elites, que imitam as preferências dos países ricos, reduzem a capacidade de poupança doméstica, limitando as possibilidades de crescimento do Brasil.

Em 2021, Mauro publica um estudo sobre o pensamento de Paul Anthony Samuelson e as dificuldades de crescimento da América Latina. Samuelson foi professor do MIT de 1940 até 2009, quando nos deixou, aos 94 anos. Foi o principal sintetizador do pensamento econômico da segunda metade do século 20 e escreveu o livro-texto que formou os profissionais por pelo menos cinco décadas.

O artigo de Mauro —"Samuelson sobre a democracia populista, o capitalismo fascista e as vicissitudes do desenvolvimento econômico sul-americano (1948–1997)"— elabora a interpretação de Samuelson das dificuldades da democracia em ambiente de muita desigualdade sustentar crescimento econômico. Tema lateral nos escritos de Samuelson, mas de profunda importância para nós.

Mauro, com 64 anos, nos deixou cedo demais. O consolo é que a capacidade de trabalho e seu talento nos legaram obra gigante, que muito nos ajuda a organizar o pensamento.

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