Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Justiça tarda, falha, país aceita e guerra suja bolsonarista domina campanha

Situação está descontrolada e não sabemos quanto, mas o mal já venceu

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O inquérito das "fake news" foi instaurado pelo Supremo faz três anos e sete meses. Não chegou ao fim e nem se sabe em que meio está. Até agora, serviu para mandar recados quando o bolsonarismo extrapolava, digamos. Notem a graça sinistra dessa frase. A Justiça tardou, falhou ou inexistiu e, assim, contribuiu para a imundície desatada desta campanha.

Não foi o único caso de tolerância. Jair Bolsonaro (PL) tentou o golpe explícito (não haveria eleições; se houvesse, o resultado será apenas aceitável em caso de vitória etc.). Insultou ministros do Supremo. Patrocinou mudanças eleitoreiras na Constituição. A guerra suja da campanha eleitoral eterna de Bolsonaro é apenas parte de seu programa impune de desativação das instituições republicanas.

A campanha de Bolsonaro consiste em lançar gases venenosos e produzir névoa de guerra. É uma combinação do gás tóxico de mentiras com a poeira da alucinação coletiva.

Bolsonaro aparece no canto esquerdo da foto, de camisa cinza escuro, sem paletó, sorrindo, enquanto mãos de várias pessoas tentam cumprimentá-lo e algumas seguram celulares para fazer fotos
O presidente Jair Bolsonaro em campanha em Recife - Diogo Nigro/Reuters

A campanha de mentiras contra as urnas foi substituída pelo ataque orquestrado contra as pesquisas eleitorais, conduzido pelos ultras e negocistas da direita parlamentar bolsonarista, agora com auxílio do Cade.

Tenta-se criar um transe com ofensivas que vão desde a disseminação da ideia de que a oposição, Lula da Silva (PT) em particular, é inimigo dos cristãos, candidato de presidiários e de facções, até a promoção do pânico moral.

A esquerda seria promotora da devassidão —o banheiro multissex é a mamadeira peniana desta eleição. Na mesma linha, por exemplo, Damares Alves (Republicanos, o partido da Universal), ex-ministra, senadora eleita pelo Distrito Federal, faz discursos depravados sobre crianças pequenas traficadas por cafetões do estupro pedófilo.

Acusada de prevaricar (não tomar atitudes legais a respeito) ou de mentir, retruca que ouviu a história por aí, desconversa ou diz "me aguardem".

É nevoa tóxica de guerra, terror em transe: estaríamos à beira da dissolução moral final. Assim, é preciso aderir ao frenesi a campanha de "Deus, Pátria e Família". No Rio Grande do Sul, Onyx Lorenzoni (PL) fez troça criminosa sobre o fato Eduardo Leite (PSDB) ser homossexual —os dois disputam o governo do estado.

Mal comparando, mas não muito, são crimes de guerra. Tudo parece com operações de guerra psicológica, como já observaram pesquisadores do assunto.

A campanha de Lula se vira para inventar algo como uma "carta aos cristãos". Mas, como se nota pela divulgação de checagens de "fake news", não deve fazer grande efeito, se algum.

A comunicação política e a guerra cultural operam em esferas públicas quase separadas ("bolhas"), apoiadas de resto por "tropas em terra" (igrejas, clubes de tiro, guarnições militares, pequenas prefeituras ou também por ameaças em empresas). A mensagem não chega ou bate em ouvidos moucos.

Não há "Convenção de Genebra" (tratados que em parte tratam de crimes de guerra) para este nosso conflito político. Ao contrário, a lei eleitoral se torna um trapo.

Nesse clima de ilicitude franca, o gás tóxico se espalha. Parte da campanha lulista contra-ataca com armas bolsonaristas —é o caso da guerrilha de André Janones (Avante-MG). A fim de aumentar e disseminar o impacto, pois muita gente não tem internet, a lama jorra para TV e rádio.

A situação está descontrolada e não sabemos quanto (o esgoto corre por canos subterrâneos). Há paliativos ali e aqui, logo atropelados por novidades na fraude ou pelo crime reiterado sob disfarces. A maioria e as classes poderosas aceitaram os termos bolsonaristas. Agora, alguns engajam-se no combate pelos mesmos meios, para "evitar o mal maior". O mal já venceu.

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