Zeca Camargo

Jornalista e apresentador, autor de “A Fantástica Volta ao Mundo”.

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Zeca Camargo
Descrição de chapéu
férias

Um Omã que eu inventei

Deixei a intuição, a sensibilidade e o acaso me levarem pelos caminhos de Mascate

Nada como acordar com uma vista espetacular e o silêncio e a solitude e a solidão das montanhas.

Especialmente depois de ter passado dias intensos na companhia de uns 30 amigos queridos. Não que eles tivessem esgotado minhas forças —ou minha paciência.

Ilustração da Maíra Mendes mostra Zeca Camargo em Mascate, capital de Omã
- Maíra Mendes/Folhapress


O fato é que, depois dessa experiência forte, que dividi com você aqui na coluna anterior, eu mesmo havia programado uma viagem só. Propositalmente. Queria estar apenas com meus pensamentos, com tempo e espaço para refletir sobre a intensidade desse encontro que aconteceu em Bancoc (Tailândia) e Luang Prabang (Laos). Achei necessário.


Inevitavelmente, na primeira noite em Omã, não consegui dormir. Não que houvesse barulho em volta: o hotel que escolhi, encrustado nas montanhas de Al Hajar, é um monumento à contemplação silenciosa. O que me incomodava era justamente a falta da vibração das pessoas que viajavam até então comigo. 


Eu sabia que, pelo menos por alguns dias, eu não teria a felicidade de encontrá-las logo pelo café da manhã nem poderia compartilhar minhas aventuras do dia com ninguém. Era eu comigo mesmo. E era melhor eu me acostumar.

Poucas vezes viajei tão mal informado sobre meu destino. Preocupado que estava com a logística de circular pelo Sudeste Asiático com um grupo grande, resolvi ir para Omã em cima da hora. Era um país que estava havia tempos na minha lista —e Oriente Médio é uma região que sempre quero explorar mais.


Queria também algo no caminho entre Bancoc e Paris —e Omã foi, a princípio, uma escolha de conveniência. Quando encontrei este hotel, Alila, tive certeza então de que era para lá que eu queria ir descansar, passar o maior tempo possível olhando aqueles vales rochosos. Fiz a reserva e praticamente esqueci dela até o dia do embarque. E só ao chegar lá que me propus a dar atenção ao lugar que visitava.


Para minha sorte, o que parecia ser uma desvantagem —minha ignorância— tornou-se algo positivo: desembarquei em Mascate, a capital, sem nenhuma expectativa. E fui construindo minha ideia de Omã intuitivamente, com o meu cotidiano.


Não começou muito bem. Enquanto eu ainda me encantava com a beleza árida (apesar da proximidade da água do golfo de Omã) da capital, fui distraído por um daqueles golpes pega turista no primeiro “souq” (mercado) que visitei, o Mutrah —onde um vendedor cobrou por um chapéu típico o preço de uma coroa cravejada. Sim, até eu...


Mas antes que eu me irritasse já estava numa outra lojinha. Na verdade, numa galeria de arte, a Rozna Muscat, onde uma artesã me mostrava os mais belos trabalhos com imagens e cores locais (e por uma fração do que eu havia pago no chapéu). Lembrei-me de que era essa viagem que eu gosto de fazer, a que a gente vai não por lugares óbvios por onde você circula como que com a palavra “turista” gravada na testa, mas por caminhos que a intuição, a sensibilidade e o acaso te levam.

E foi assim que explorei um pouco mais a cidade, visitando inclusive uma suntuosa (se não estranhamente inesperada) Ópera Real de Mascate, antes de subir as montanhas e encontrar, finalmente, a paisagem onde eu sonhei descansar.


Depois dessa atribulada introdução, estava pronto então para ir construindo no meu imaginário o país que eu queria visitar. Um Omã que vai muito além dessa confusa capital —onde, entre trilhas tortas, vilas abandonadas, almoços de tâmaras com tahine e um intenso perfume de rosas, eu finalmente me encontrei.


Os detalhes dessas descobertas, vou deixar para a próxima coluna. Mas já adianto que Omã, inventado ou não, conseguiu me acolher mesmo longe das pessoas que eu amo. Não que me tenha feito esquecê-las. Talvez, em algum canto do meu ser, elas até estivessem lá comigo a olhar para aquele horizonte austero e belo.


Será que a gente consegue viajar sozinho?

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