Sem estrutura, maternidade do Piauí coloca mais de um bebê no mesmo leito
Por falta de leitos na maior maternidade do Piauí, dois bebês chegam a utilizar um único berço. É o que mostram fotos obtidas pela Folha feitas pelo Ministério Público, que investiga o caso.
O próprio diretor geral da maternidade estadual Dona Evangelina Rosa, Francisco de Sousa Martins Neto, admite a prática com dois recém-nascidos num só leito, mas diz que ela é atípica e pontual.
Funcionários do hospital afirmaram à Folha, porém, que a situação é pior e frequente, pois um único berço chega a receber cinco bebês. O problema ocorre na sala RN (local onde, após os partos, os recém-nascidos aguardam transferência para enfermarias, UTI neonatal ou berçário).
Divulgação/Ministério Público | ||
Bebês dividem um único berço na maternidade Dona Evangelina Rosa, a maior do Piauí |
Colocar mais de um bebê no mesmo berço ou incubadora não só é contra qualquer indicação médica como desrespeita regras sanitárias, segundo o pediatra Henrique Carlos Gonçalves, membro da diretoria do Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo).
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) estipula regras que determinam desde o uso individualizado dos equipamentos a até mesmo uma distância mínima entre berços ou incubadoras. "O equipamento não é feito para comportar mais de um recém-nascido", disse.
O Ministério Público do Estado já apura denúncias sobre berçários superlotados na maternidade. No ano passado, as denúncias foram feitas em uma carta assinada por 32 obstetras plantonistas, que foi enviada à promotora Cláudia Seabra.
No documento, os médicos falam que a maternidade estava virando uma "bomba relógio" e que tiveram que adiar a realização de cesarianas de urgência pela falta de berço para acomodar os recém-nascidos.
Eles disseram, ainda de acordo com o Ministério Público, que a superlotação na Dona Evangelina Rosa faz com que os profissionais tenham que selecionar quem será atendido.
Coordenadora do Centro de Apoio de Defesa da Saúde, a promotora já ajuizou quatro ações judiciais contra a maternidade por descumprimento. Entre as ações, o Ministério Público pede que a direção adquira mais 74 novos berços e incubadoras.
Sobre o relato de servidores, ela disse que nunca viu cinco bebês num único berço, mas afirmou que não se surpreende.
"É uma situação plenamente injustificável e de falta de responsabilidade sanitária [na maternidade]", disse a promotora, informando que o hospital foi multado em R$ 145 mil por desobedecer os TAC (Termos de Ajuste de Conduta) firmados na Promotoria.
DE INFECÇÃO A TROCA DE BEBÊS
Para o recém-nascido, segundo Gonçalves, o maior risco é o de ele estar exposto a uma infecção cruzada. Outro perigo ao misturar bebês é de equipes de enfermagem confundirem o cateter que leva soro a um bebê com a medicação ministrada a outra criança.
E, em uma situação mais extrema, o diretor do Cremesp aponta até para o risco de troca de bebês. Ele condena a prática também do ponto de vista higiênico, pela dificuldade de manipular duas crianças em um pequeno espaço.
Mas sobrecarregar um mesmo berço não é uma situação exclusiva do Piauí, segundo Gonçalves. "É mais raro, mas mesmo aqui em São Paulo já encontramos maternidades que estavam lotadas e tinham dois bebês em um berço."
OUTRO LADO
Martins Neto admitiu que há superlotação no hospital, mas negou que cinco bebês dividam um único berço. "Vamos apurar até mesmo para saber se não existe gente mal-intencionada [entre os funcionários]."
O diretor da maternidade afirmou que, se realmente foram colocados mais de dois bebês num só leito, foi uma decisão dos funcionários, não compactuada com a direção. Por isso, a instituição abriu procedimento administrativo para apurar o caso.
Segundo ele, a maternidade atende por mês cerca de 1.200 mães. "São de 30 a 40 partos por dia". Na sala dos recém-nascidos, só existem dez berços.
"O máximo que temos quando a maternidade está superlotada são dois bebês em um só berço. Estamos trabalhando no limite. Nossa taxa de ocupação de leitos é de 95%, quando o Ministério da Saúde recomenda 85%",disse o diretor.
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