De varanda gourmet a igreja, Covas quer anistiar mais de 150 mil imóveis

Câmara suaviza exigências do projeto do Executivo para tornar proposta mais atraente à população

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São Paulo

A Câmara Municipal de São Paulo deve votar nesta quarta (25) projeto com previsão de anistiar mais de 150 mil imóveis irregulares. 

O projeto substitutivo, resultado da mescla de proposta da gestão Bruno Covas (PSDB) com contribuições de vereadores, inclui desde perdão a templos religiosos à regularização das chamadas varandas gourmet, tendência nos apartamentos de classe média e alta na última década. 

Às vésperas da votação, o projeto ainda sofre modificações pelos vereadores, que incluem atrativos para aumentar a adesão dos paulistanos.

Operário trabalha em varanda na região central de São Paulo; espaços ‘gourmet’ serão alvo de anistia - Flavio Florido - 15.set.17/Folhapress

A maior vantagem é que, uma vez regularizadas, as construções podem passar a ser financiadas pelo sistema bancário. Além disso, os imóveis passariam a ter uma área computada maior, valorizando-se em uma futura venda.

No entanto, os donos devem pagar a outorga onerosa devida, que é a taxa sobre construções acima do limite básico para cada local. Por outro lado, não precisarão pagar impostos retroativos como IPTU e ISS. 

O projeto regulariza automaticamente imóveis residenciais que tiveram isenção total do IPTU em 2014.
O Plano Diretor, aprovado em 2014, é o principal marco de referência temporal da lei. Paulistanos que fizeram construções em seus terrenos até 2014 e não informaram a prefeitura --e portanto estão irregulares-- são os principais alvos da lei de anistia.

"O projeto decorreu da necessidade de se regularizar inúmeras edificações da cidade que apresentam condições de higiene, estabilidade, habitabilidade, segurança de uso e acessibilidade, mas continuam em situação irregular pela ausência de alvará de aprovação e execução de edificação, além de certificado de conclusão para obras novas ou acréscimos de área", explica a prefeitura.

 

Além da automática, há mais duas modalidades de regularização.

Uma delas é declaratória, para residências e imóveis comerciais de até 1.500 m², na qual o proprietário deverá protocolar requerimento eletrônico e apresentar documentos. Os apartamentos devem ser incluídos aqui. 

Para os demais imóveis, incluindo de comércio e serviços, seria feita a regularização tradicional, com documentos assinados por profissionais habilitados e análise da prefeitura. 

Entre os itens que o Executivo pretende regularizar estão as chamadas varanda gourmet, que são sacadas maiores acopladas à área dos apartamentos. Muitas pessoas fecham esses espaços, transformando-os em mais um cômodo do apartamento. Em algumas plantas, elas chegam a ter área similar à da sala de estar.

Como oficialmente as varandas são áreas não computáveis para o cálculo da outorga devida, a mudança sem atualização pode atrapalhar o processo de venda e financiamento de imóveis. Com a anistia, será possível incorporar oficialmente esta metragem à área construída dos imóveis. 

As igrejas deverão ter total isenção de tributos e taxas na regularização, reflexo da atuação da bancada religiosa, que inclui o presidente da Câmara, Eduardo Tuma (PSDB). Evangélico, ele é o principal representante de uma bancada de 17 vereadores ligados a diferentes grupos religiosos. 

"Continuo defendendo as igrejas em função do trabalho social que elas prestam. Elas devem ter seu direito à isenção de qualquer cobrança", afirma o presidente da Câmara.

O projeto não tem gerado grande oposição na Câmara. Para o vereador Police Neto (PSD), as mudanças sucessivas feitas no texto ao longo das últimas semanas desembocaram em um resultado positivo na busca de uma fórmula que não premie quem não se regularizou no período adequado, mas também não afaste quem tem a intenção de corrigir o erro.

"Parece um bom caminho para um projeto resistente, que aguente questionamentos do Ministério Público, mas possa de fato trazer a cidade para um ambiente de regularidade e formalidade", afirma. "Não faria sentido o infrator pagar outorga com desconto em relação a quem fez o certo, como se chegou a cogitar. Chegamos a uma ideia justa."

A opinião de Police é compartilhada por parte da equipe de Covas, que apresentou um projeto mais duro do que o que deve ir à votação. 

Porém, o projeto inicial foi visto como politicamente custoso ao prefeito. Vereadores consideraram suicídio político a ideia de cobrança retroativa de IPTU, por exemplo. 

Como planeja concorrer à reeleição em 2020, o tucano tem ouvido os conselhos e afastado a hipótese de demandar impostos que ficaram para trás.

Para evitar a cobrança retroativa de ISS, a prefeitura terá como estratégia estabelecer o início da vigência da lei para janeiro de 2020. Dessa forma, o prazo de cinco anos para cobrança dos retroativos terá prescrito, segundo o determinado pelo Plano Diretor.

Para compensar os valores de impostos de que deverá abrir mão, a prefeitura cobrará um valor de outorga onerosa 20% superior ao pago por quem se regularizou no período correto.

Dessa forma, o cidadão que for regularizar sua situação pagará mais do que aquele que resolveu sua situação no período adequado, diminuindo, assim, uma possível sensação de privilégio daqueles que não respeitaram os prazos originais até 2014.

Presidente da Câmara Eduardo Tuma, que articulou o modelo da anistia
Presidente da Câmara Eduardo Tuma, que articulou o modelo da anistia - Eduardo Anizelli/ Folhapress

Além desse acréscimo dos 20%, uma taxa de R$ 10 por metro quadrado também será cobrada dos pleiteantes. 

O período para adesão ao programa terá duração de um ano a contar da sanção do prefeito, de acordo com a última versão do projeto que atualmente circula na Câmara.

Entre os vereadores de oposição, as críticas ao projeto têm sido apenas pontuais.

Alfredinho, líder do PT, por exemplo, pede a ampliação da abrangência da isenção.

"Queremos isenção de áreas que são desapropriadas pela prefeitura e que são destinadas a programas sociais como Minha Casa Minha Vida. Essas áreas foram desapropriadas, mas têm dívidas antigas de IPTU. Quando há construção, cobram ISS. Por justiça social, queremos que não haja mais essa cobrança", afirma.

Ronda a gestão Covas a lembrança da lei de anistia de 2003. Proposta durante a gestão de Marta Suplicy, então no PT, a lei anistiava os imóveis irregulares da cidade construídos até setembro de 2002.

Criticada pela cobrança de altas taxas, a medida teve baixa adesão e praticamente não reduziu o índice de imóveis irregulares. Entre 1982 e 2004, foram aprovadas no município 13 leis que concederam algum tipo de anistia para a regularização de imóveis ou loteamentos.

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