Após sete anos de queda e em meio ao isolamento social, homicídios crescem em São Paulo em 2020

Outros indicadores de criminalidade, como roubos, furtos e latrocínios, diminuíram no estado

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São Paulo

O número de homicídios em São Paulo cresceu em 2020, mesmo com parte da população isolada por causa da pandemia, interrompendo uma sequência de sete anos de queda —índice que era usado como trunfo pelo governo de João Doria (PSDB).

Os dados foram divulgados pela Secretaria da Segurança Pública (SSP) nesta segunda-feira (25).

Os homicídios dolosos, quando há intenção de matar, subiram 4,1%, passando de 2.778 para 2.893 ocorrências, na comparação entre 2019 e o ano passado. O número total de vítima aumentou ainda mais: 4,5%. Foram 3.038 mortos em 2020, contra 2.906 no ano anterior. Isso significa que uma pessoa é assassinada em São Paulo a cada três horas.

O índice também subiu na capital paulista. Foram 659 registros de homicídio no ano passado, uma alta de 1,3% em relação aos 650 casos na cidade em 2019.

Desde o início da série histórica, em 2001, esta foi a terceira vez que o estado de São Paulo registrou um número maior de assassinatos quando comparado com o ano anterior. Os últimos aumentos foram em 2012 (de 4.193 para 4.836) e 2009 (de 4.432 para 4.564) —época em que o patamar de homicídios no estado era bem maior do que o atual.

Em contrapartida, com os novos dados, o estado passa a ter taxa de 6,48 homicídios por 100 mil habitantes —que segue sendo a menor do país. Além disso, outros indicadores de criminalidade, como estupro, latrocínio (roubo seguido de morte), assalto e mortes cometidas por policiais, diminuíram.

Os feminicídios, assassinatos cometidos contra mulheres por motivação de gênero, também recuaram de 184 para 179 ocorrências no estado, o que representa uma queda de 2,7%.

Ainda segundo os dados da SSP, os registros de estupro interromperam uma sequência de quatro anos com sucessivos aumentos para uma queda de 10,9% em 2020. Foram informados 11.023 casos de feminicídio ano passado, ante 12.374 em 2019.

Especialistas em segurança pública, no entanto, alertam que o confinamento provocado pela pandemia de coronavírus pode ter dificultado que mulheres conseguissem registrar ocorrências de crimes sexuais e de violência de gênero.

Já no caso dos crimes patrimoniais, a quarentena pode ter ajudado a frear o número de casos. Os latrocínios caíram 6,7%, passando de 192 ocorrências para 179 no estado. Já os roubos e furtos, em geral, recuaram 14,3% e 24,8%, respectivamente. Foram registrados 218.839 roubos e 392.311 furtos. Por outro lado, os roubos a bancos aumentaram de 21 para 29 casos.

LETALIDADE POLICIAL

Após bater recorde de letalidade no primeiro semestre de 2020, as polícias de São Paulo conseguiram reduzir as mortes durante suas ações e fechar o ano com número menor do que o de 2019, segundo a SSP.

Foram 814 mortes decorrentes de intervenção policial no ano passado, o que representa uma queda de 6,1% em relação ao ano anterior, quando foram registrados 867 casos.

Essas mortes em decorrência de intervenção policial contabilizam tanto as ocorrências com policiais de serviço, quanto os de folga, desde que a ação do agente tenha relação com a condição de policial —como intervir em um roubo.

Do total, 659 pessoas morreram em confrontos com policiais militares em serviço e 121 por PMs de folga. Já a morte de outros 21 suspeitos envolveram policiais civis em serviço e 13, de folga.

O primeiro semestre do ano passado foi o que a polícia mais matou no estado em duas décadas. De acordo com as estatísticas divulgadas, foi comportamento do último trimestre (outubro a dezembro) teria sido responsável por inverter o cenário. Foram 138 casos de letalidade ante 241 na mesma época de 2019 –uma queda de 42,7%.

Diante de uma sequência de denúncias de violência policial e da repercussão das cenas de abuso que contrariaram a versão oficial dos agentes e do governo, o governador Doria mudou a postura.

Quando foi eleito, em 2018, o tucano repetia que a polícia dele iria "atirar para matar” e que mandaria bandidos para o cemitério.

Doria chegou a dizer em 2019, após a morte de nove pessoas durante ação da polícia em baile funk de Paraisópolis, que reduzir a letalidade não era obrigação da polícia.

No ano passado, no entanto, o governador recuou e passou a dizer que não compactua com ações violentas e que os casos são isolados. Em junho de 2020, afirmou que o governo de São Paulo não será complacente com nenhuma violência policial "sob nenhuma justificativa".

Também anunciou um programa para submeter todos os agentes a novo treinamento e a expansão das câmeras acopladas no fardamento de policiais militares para registrar, em áudio e vídeo, as intervenções das equipes. A ampliação ocorre, porém, com cerca de um ano de atraso em relação à previsão inicial e não inclui as unidades conhecidas pela alta letalidade em suas ações.

Vídeos mostraram um policial pisando no pescoço de uma comerciante negra em Parelheiros, zona sul da capital paulista. Antes disso, o agente havia enforcado outro homem.

Dois PMs também aparecem, em outra filmagem, tentando imobilizar um motoboy negro com um "mata-leão". Ele, que havia sido abordado por ter estacionado sobre a calçada e estar com a placa encoberta teria reagido a abordagem, diz "eu não consigo respirar", apelo semelhante ao do de George Floyd, também negro, morto em maio ao ter o pescoço pressionado por nove minutos pelo joelho de um policial em Minneapolis (EUA).

Outro episódio de abuso aconteceu com a prisão de oito policiais militares, após imagens mostrarem os agentes batendo em um homem. E mais dois policiais militares são suspeitos de atuar na morte de Guilherme Silva Guedes, 15 anos, encontrado morto em Diadema (Grande SP), com um tiro na cabeça. O caso gerou protestos na região.

Todos os casos são investigados pela Corregedoria da Polícia Militar de São Paulo.

De acordo com a cúpula da PM, a redução da letalidade se deve a medidas que aumentam o rigor nos protocolos da corporação para lidar com esse tipo de ocorrência, com ações de fiscalização, como a maior presença dos oficiais nos locais de ocorrência, e, também, em meio à ampliação do uso de armas menos letais, como as de eletrochoque e espargidores de gás pimenta.

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