Ocupação em área de proteção ambiental gera tensão em Trancoso

Movimento de Resistência Camponesa lidera ocupação de terrenos no sul da Bahia; prefeitura de Porto Seguro vê movimento orquestrado

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Salvador

A ocupação de fazendas nas proximidades de Trancoso, no litoral sul da Bahia, acirrou tensões na região, resultando em protestos e em sucessivos bloqueios de estradas – o último deles nesta quarta-feira (24).

Ao menos três grandes propriedades foram invadidas desde 2020 e ocupadas por cerca de 3.000 famílias ligadas ao Movimento de Resistência Camponesa, que ergueram no local barracos de lona e casas de taipa e de madeira.

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Ocupação de terrenos em área de proteção ambiental gera tensão em Trancoso (BA) - Divulgação

Uma das primeiras propriedades a serem ocupadas, ainda em 2020, foi a Mirante Rio Verde, fazenda de 112 hectares que fica dentro de área de preservação ambiental Caraíva-Trancoso, região com vegetação remanescente de mata atlântica.

Nos últimos quatro meses, outras áreas foram ocupadas, incluindo um terreno próximo à praia no trevo da rodovia que liga a sede de Porto Seguro a praias como Trancoso, Arraial D’Ajuda e Caraíva. No local, foram erguidas cercas e uma guarita na via de acesso à ocupação.

A ocupação dos terrenos é alvo de críticas de parte dos moradores de Trancoso, distrito com cerca de 11 mil moradores e que tem no turismo a sua principal atividade econômica.

Eles criticam a ocupação desordenada e a degradação ambiental da região, incluindo a falta de saneamento e a retirada de madeira da mata nativa para construção das moradias.

Os posseiros, por sua vez, defendem a permanência das famílias nas fazendas ocupadas e têm realizado uma série de protestos, incluindo a interrupção tráfego de vias que dão acesso às praias.

Protestos aconteceram nesta quarta e no último sábado (20), quando a estrada que dá acesso às praias de Curuípe, Itaporanga e Caraíva foi bloqueada. Na ocasião, os manifestantes queimaram pneus e fecharam a via por cerca de seis horas.

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Ocupação de terrenos em área de proteção ambiental gera tensão em Trancoso (BA) - Divulgação

Os proprietários das fazendas tentam retomar as áreas por meio de ações de reintegração de posse na Justiça da Bahia.

Representante dos proprietários da fazenda Mirante Rio Verde, o advogado Thiago Phileto Pugliese afirma que já houve uma reintegração cumprida em 2021, que depois acabou sendo suspensa pela Justiça.

"Depois da reversão, os movimentos se aproveitaram e trouxeram ainda mais pessoas para o local. O Estado precisa se fazer presente, continuamos aguardando um posicionamento do tribunal", afirma.

O caso está parado há oito meses na Justiça, após sucessivos pedidos de suspeição de desembargadores para deliberar sobre o caso. Questionado, o Tribunal de Justiça da Bahia informou que "não emite qualquer opinião sobre processos em andamento, processos pendentes de julgamento".

Vice-prefeito de Porto Seguro, Paulo Cesar Onishi (União Brasil), conhecido como Paulinho Toa Toa, alega que a ocupação das terras é um movimento orquestrado de caráter político e diz que a maioria das famílias instaladas na região é de fora de Porto Seguro.

"Existe um movimento político por trás desta ocupação e isso nos entristece. Identificamos que maioria das pessoas da ocupação são de outras cidades e até mesmo de outros estados, como Minas Gerais", afirma o vice-prefeito.

Ele ainda diz que as ocupações também impactam no turismo. "Qualquer ação que espante os turistas é acabar com o emprego e a renda de Porto Seguro".

A prefeitura diz que está atuando como uma espécie de intermediária para buscar uma solução de consenso e que vai auxiliar na execução das reintegrações de posse, caso elas sejam determinadas.

Uma parte das terras, próximas às praias do Pitinga, em Arraial D’Ajuda, e Itaquera, em Trancoso, já foram desocupadas.

Um abaixo-assinado organizado por moradores de Trancoso, que chegou a 600 assinaturas nesta terça-feira (23), defendeu a atuação dos movimentos de luta pela terra, mas criticou as ocupações em Trancoso por estruturarem bairros irregulares, sem saneamento básico e planejamento prévio.

"Isso não é um movimento social baseado em princípios progressistas, mas sim o reflexo de interesses particulares de poucos atores visando promoção política e obtenção de lucro", diz o texto.

O vereador Vinícius Parracho (União Brasil) afirma que os impactos ambientais das ocupações são o principal foco de preocupação da comunidade. E questiona a ocupação de uma área de proteção.

"Quando se fala em reforma agrária, a gente fala em terras improdutivas. Uma área de proteção ambiental não é improdutiva, ela deve ser preservada e tem sua finalidade definida em lei. Mesmo que a área seja usada para habitação social, é preciso respeitar as regras urbanísticas", diz.

Parracho também critica as autorizações e licenças para a construção de grandes empreendimentos imobiliários e condomínios no litoral sul de Porto Seguro e diz que nem sempre as regras são cumpridas.

A Folha tentou contato com representantes do Movimento de Resistência Camponesa nos últimos três dias, mas não obteve sucesso.

Em julho, uma das ocupações sediou um ato de pré-campanha do deputado estadual Júnior Muniz e da candidata da deputada federal Ivoneide Caetano, ambos do PT e ligados a Luiz Caetano (PT), que até julho era secretário estadual de Relações Institucionais.

Procurado, o deputado Júnior Muniz afirmou que foi ao acampamento somente para receber o apoio dos moradores e que não tem relação com a ocupação.

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